quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

“A ciência não tem que se dedicar a comprovar a existência de Deus”


A partícula de Deus. É o que os cientistas estão buscando. Na realidade, é um exagero jornalístico. O que buscam é uma partícula que dê razão definitiva à teoria da evolução. Isso pode ser comprovado pela ciência. O Pe. Ramón María Nogués é o exemplo perfeito de que ciência e religião podem andar de mãos dadas na compreensão da realidade.

A entrevista é de José Aguado e está publicada no jornal espanhol La Razón, 18-12-2011. A tradução é do Cepat.

Eis a entrevista, aqui reproduzida via IHU, com grifos nossos.


O que é a religião?

É uma tentativa de estabelecer contato com a realidade última da vida, o que chamamos Deus. É, além disso, uma criação humana que pode responder a uma inspiração ou a grandes tradições. Embora seja verdade que há grandes tradições que não se referem a Deus.

Como se diferencia a religião de outras narrações?

Não é fácil distingui-la, mas as religiões têm graus de maturidade e superam as colocações fundamentalistas e sectárias que suscitam reservas. As religiões têm uma tradição histórica que foi se polindo com o passar do tempo graças à aceitação do diálogo com a cultura ou com a ciência.

Não há conflito entre ambos?

Não, não é uma relação conflitiva. Na cultura moderna há muitas linguagens sobre a realidade. Caso forem rigorosas, ao final são compatíveis. O conflito vem quando a relação entre ambas se faz em relações de poder, sobretudo entre pessoas.

Mas a ciência foi tirando terreno da religião.

Na história da Europa muitos aspectos que eram monopolizados pela religião foram ocupados pela ciência, como a cosmologia ou a ciência da vida. Mas isso não é ruim: a religião não se pergunta pelo como, mas pelo horizonte, pelo sentido. Cada um tem que estar em seu lugar. Assim, a ciência não tem que se dedicar a comprovar a existência de Deus.

A religião está no cérebro?

A religião é um produto humano e parte da nossa experiência mental e cultural. É possível que se encontrem estruturas cerebrais que sejam significativas em experiências religiosas. É o que se denomina neurorreligião. Os místicos, por exemplo, estão na fronteira da doença: nas epilepsias leves se produz uma atividade cerebral de alta intensidade, como ocorria com Santa Teresa. Produz-se uma exaltação das possibilidades mentais, que dá estas excelências não apenas religiosas, mas também estéticas.

Deus já não dá medo.

Para as novas gerações a ideia de Deus já não está unida ao medo. Antes se utilizava o temor para falar de Deus de maneira incorreta, mas agora Deus se afastou dessa ideia. Contudo, na Europa estamos regredindo com a expressão religiosa e é preciso refletir. A perda de importância da religião, como experiência, não é uma vantagem. O sentido religioso enriquece a vida, dá resposta às últimas perguntas. Dá valor à experiência humana.

Você está em um ponto intermédio entre a ciência e a religião?

E me movimentei com comodidade. Quase sempre coincidi com colegas não religiosos, no sentido de crer em Deus. Mas são rigorosos, são prudentes e se baseiam nas comprovações. A crença em Deus não tem comprovações. O seu é um agnosticismo negativo. Estão em prudente espera.

Há ateus mais radicais.

Eu creio que os círculos dos ateus militantes estão diminuindo. Também, quando os leio, por exemplo, Richard Dawkins, e vejo a quem vão “arrebentar”, creio que não falam de mim. Criticam certos aspectos religiosos, mas não falam de mim.

É mais simples viver com fé?

A vida tem um enigma, uma pergunta. A fé é consoladora, mas não torna a vida mais fácil. O religioso bem vivido leva a assumir a insegurança, mas ela pode ser vivida de maneira mais controlada do que sem horizonte. Uma vida religiosa é vivida com a dificuldade de qualquer pessoa, mas é feita com uma consolação interior, com uma paz interior.

Há vida mais além.

Creio que na palavra de Jesus, que vem para dizer que a morte não é a última palavra. A vida é um processo aberto, mas se deve evitar imaginar o que vem depois porque se abre uma paisagem de ridicularidade: nós não podemos representar algo que está fora do espaço e do tempo. Eu creio que é uma questão de confiança.

Nem todos os cristãos fazem a mesma reflexão.

Cada um faz o que pode. Desde os que ilustram as formas imaginativas mais simples até os mais críticos. Mas a confiança de ambos é a mesma.

2 comentários:

Thiago disse...

"O religioso bem vivido leva a assumir a insegurança, mas ela pode ser vivida de maneira mais controlada do que sem horizonte"

Adorei essa parte, acho que já li essa entevista em algum lugar.

Me lembra a uma história que eu ouvi não me lembro de quem, de uma pessoa que tinha uma tia que era freira e estava para morrer, e perguntaram a ela se ela achava que havia um Deus, ao que ela respondeu: "Eu espero que sim".

Achei a história tão bonita, porque a freira demonstrou humildade.Sei que existe uma passagem que diz que onde há dúvida não à fé,mas acho a dúvida inerente ao ser humano e o questionamento necessário em todos os aspectos da vida.

E quanto a questões espirituais e religiosas, ou a filosofias de vida só podemos dizer "eu acredito", o "eu sei" soa muito arrogante, além de ser mentira, pois a verdade é que não sabemos nada.

Não há como provar a existência de Deus, a ingenuidade, tanto de cientistas quanto religiosos quanto a esse assunto me deixa perpelexo.É uma questão de acreditar ou não, ou fazer as pazes com a dúvida.

OBS: Só fico curioso com o que esse Padre pensa em relação a homossexualidade.E como você (eu encontrei o blog agora) lida com isso, sendo católico, qual a sua opinião sobre as passagens bíblicas que condenam a homossexualidade, a posição da igreja em relação a isso e etc?Vc com certeza já deve ter falado disso aqui, se pouder me fornecer os links para os posts eu agradeço!

Equipe Diversidade Católica disse...

Oi, Thiago, que bom ler o seu comentário! :-)

Já que vc está chegando agora, vale a pena vc dar uma geral no blog; mas temos alguns textos fundamentais que vale a leitura:

- Sobre o Diversidade Católica, pra você entender melhor quem nós somos.
- Ser gay e ser católico e Nosso testemunho
- Assim me diz a Bíblia e Gays não devem discutir sobre a Bíblia?, sobre o uso das Escrituras para justificar a homofobia
- Cristianismo maduro e responsável

Além da nossa série de Perguntas Frequentes.

Talvez vc goste também da nossa série de depoimentos de gays católicos, que contam um pouco da sua história, aqui.

É muita coisa... Dê uma olhada e veja o que te interessa mais, o que chama atenção. E fique inteiramente à vontade para perguntar, questionar, indagar, sugerir... Caso prefira um contato mais direto, pode entrar em contato pelo contatoblogdc@gmail.com.

Um grande beijo, e seja mto bem vindo! :-)

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