sexta-feira, 9 de setembro de 2011

“Cresceu assim, nasceu assim...” Viva Gabriela!





No dia 19 de Agosto saiu uma reportagem da Revista IstoÉ com o seguinte título:

“O novo retrato da fé no Brasil”

Confira o original na IstoÉ.

Olho com muita desconfiança para os dados frios apresentados por pesquisas, ainda que acadêmicas. Quando terminei de ler a matéria tive a pergunta, “por que as pessoas de fato migram tanto?”. Depois pensei, “ah besteira...a matéria já explica isso...”.

Sim de fato explica, àquele universo que se propõe a explicar. Pois, fico pensando naquelas pessoas que conheço e até mesmo minha historia em que a religião faz parte da minha cultura, educação e parte da formação de meus valores que dificilmente mudaria de religião. Obvio, falo por mim e pela Gabriela, aquela que “nasceu assim, cresceu assim...GABRIEEELA...!”

Minha sina é discordar do meio religioso que pratico, o que me leva a crer que o foco de resistência pessoal e no Grupo que participo é fundamental e de extrema importância pra mim e a minha Igreja. Sim, minha...oras, levando em consideração que se eu tivesse que escrever aquelas autobiografias cafonas, Ela seria parte integrante.

Embora, a opinião da gente seja uma concha de retalhos, desconfio muito dessa tal “liberdade” que confere direito ao ser de cambiar de religião e/ou crença quando bem se entende. Sei lá, me parece algo desconexo da identidade destes indivíduos, ou pelo menos me parecem que não fizeram questão de ir um pouquinho mais fundo naquilo que ele realmente precisa pra “religar-se”. Este Mult-Market de ofertas arrasadoras de Igrejas e credos, me leva a crer que o pobre do ser tá mais acorrentado à busca do que de fato, livre.

Parece que minha avó em sua imensa sabedoria tem toda razão... “esse mundo tá perdido”, ela vive repetindo.

Perdido mesmo, a religião virou o palco emotivo das sensações que a vida cotidiana não consegue mais proporcionar. O hiperestímulo sensacional é mais forte que uma busca a transcender-se ou o vinculo com a história pessoal. É preferível amputar-se e viver mutilando-se em busca de alguma razão que sempre muda e ganha nova justificativa.

Minha avó, tem mesmo toda a razão!Talvez ela que conheceu pessoas que viveu no fim do século XIX, apenas passou adiante o que lhe repetiam – “este mundo está perdido minha filha”.

Sincero era a figura do Flâneur lá da Paris do Fim de Século...ele sim transitava e buscava as novas sensações cientes de que a vida no mundo estava mudando. Deve ter sido, porque ele “nasceu assim, cresceu assim...”



Ah, mas deixa pra lá!É só uma opinião rabugenta de quem não quer mudar, porque nasceu assim e cresceu assim.


Viva a Gabriela!



Rodolfo Viana

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Lésbicas: orgulho e visibilidade

Foto: Andy Barter


Com atraso, reproduzimos aqui o texto escrito por nossa amiga Ivone Pita sobre a questão da visibilidade lésbica, a propósito do dia 29/8, que celebra justamente esse tema. Fica a reflexão sobre a violência da invisibilidade...

Somos lésbicas. Somos mulheres que vivem sem homens em um mundo machista e de mentalidade patriarcal.

Somos mulheres que subvertem a ordem do sexo frágil, da dependência e da subserviência. Somos mulheres que não seguem o “manual de boas práticas femininas”, que dita modos de vestir, de agir, de falar, de ser e estar no mundo. Somos revolucionárias na acepção própria da palavra: fazemos uma transformação radical na estrutura da sociedade.

Estamos onde supostamente mulheres não deveriam estar. É ainda espantoso para muitos, por exemplo, aceitar que duas mulheres possam viver sem um homem. Como vão resolver tarefas cotidianas tidas como masculinas? Não irá lhes faltar força? Jeito? Tino? Há ainda as tentativas de ridicularizar, diminuir e não reconhecer nossa sexualidade. Há
uma desqualificação fálica de nosso sexo. Para machistas de carteirinha - e uniforme completo! - lésbicas não trepam de verdade, apenas brincam de se esfregar. Sim, meninas, como se fosse pouco e somente o que fizéssemos. Mas a despeito das agressões e desqualificações, seguimos subvertendo a ordem, desconstruindo certezas e quebrando o que estaria estratificado.

Entretanto, sem orgulho, nada disso é possível. Sem orgulho, nos encolhemos, nos escondemos, deixamos a vida passar. Sem orgulho, não nos fazemos visíveis e sem visibilidade é como se não existíssemos. E, assim, nenhuma revolução acontece, nenhuma revolução é possível. Por outro lado, sem visibilidade não promovemos o orgulho. Somente a partir do momento em que nos tornamos visíveis por sermos nós mesmas, é que somos plenamente orgulhosas de sermos quem somos. E para isso é preciso coragem.

Vivemos em uma sociedade que insiste em dizer qual é o lugar da mulher, como deve ser sua inserção social e como deve se comportar. Sendo lésbica, melhor nem existir, pois não cabemos nos papéis destinados à mulher. E é assim que cotidianamente a sociedade nos diz que deveríamos nos envergonhar de ser quem somos e esconder nosso amor. É assim que a sociedade insiste em nossa invisibilidade, pois o que não se vê, não existe, não incomoda, não subverte.

Quando permanecemos invisíveis, contribuímos com a manutenção da discriminação e da violência, motivos pelos quais muitas mulheres optam por uma vida de anulação e silêncio. Contribuímos com a lesbofobia, pois não dizemos ao mundo que estamos em todos os lugares, em todas as profissões, em todas as famílias, em todos os cargos. Não dizemos que somos mães, filhas, avós, tias, irmãs, empregadas domésticas, médicas, advogadas, professoras e toda sorte de representação e inserção social. Não ajudamos outras mulheres a se revelarem, a se assumirem, a serem plenas. Assinalando nossa existência, derrotamos o medo do desconhecido, a discriminação e o ódio alimentado pela perversidade delirante – e nada inocente - de lésbicas destruidoras de família. Existindo publicamente, abordamos questões que nos são específicas e combatemos o sexismo.

A invisibilidade é uma grande violência contra nós lésbicas. Na mídia, por exemplo, o foco são os homossexuais masculinos. A violência homofóbica é tratada como um fenômeno que atinge somente homens.

Mas nós mulheres, se não estamos nos jornais como vítimas de violência física especificamente por nossa sexualidade, isso ocorre apenas pela violência do silenciamento: seja pela invisibilidade auto-imposta, por medo, seja pela falta de estatística específica. Aliás, não temos dados específicos de coisa alguma e raros registros de nossa história. E daí a imensa importância do coletivo. Para enfrentar os desafios que nos são apresentados e superar tanta opressão, não há como avançar individualmente, a única forma de alterarmos o ciclo perverso de invisibilidade e descaso é pela união de nossas vozes, de nossa força. A única saída possível é nos organizarmos e lutarmos. E isso depende de cada uma de nós, não de agentes externos. Nós temos direito à existência, a uma vida completa, à cidadania plena, à visibilidade. Podemos e devemos ser felizes. Plenamente felizes.

A visibilidade lésbica cotidiana é que derrubará a censura que nos é imposta e o cerceamento de nossos afetos e desejos, portanto, realize algo grandioso: torne-se visível, desafie a opressão e o autoritarismo da normatividade, pois é assim que escreveremos nossa história, uma nova história, e construiremos uma sociedade mais justa, mais solidária, democrática e plural.

- Ivone Pita

 Publicado originalmente no Gay1 (PolíticAtiva)

Missa cantada

Ilustração: Yau Hoong Tang

O autor, não-religioso, que se diz "tantas vezes revoltado com o que vejo de absurdos na doutrina católica", viu-se um dia, a convite de um amigo, assistindo a uma certa missa. Mas algo naquela igreja, que a princípio lhe parecia igual a todas as outras - principalmente, igual às suas imagens preconcebidas -, algo naquele momento o surpreende. E ele se pergunta: "Onde eu estava? Num reduto ultraconservador? Mas a retórica do padre não servia a fins sinistros"...

Uma igreja pode ser diferente da outra, mas os bancos são sempre iguais. Têm aquele apoiozinho na frente para que os fiéis se ajoelhem. Até aí, tudo certo.

Mas nem sempre é assim. Na missa, diante do altar, a pessoa pode ficar em pé, atenta àquilo que está acontecendo, e não de joelhos, numa oração interior.

Esta posição, de joelhos, na verdade, é adequada diante do sacrário: o armariozinho onde ficam guardadas as hóstias. E o ideal, para prosseguir no assunto, é que o sacrário não fique atrás do altar. Um amigo católico ia me explicando essa e outras sutilezas.

Estávamos, no último domingo, na capela do Pátio do Colégio. É uma construção arejada e branca, que reproduz, em linguagem moderna, as proporções do antigo edifício jesuíta.

Lá, o sacrário fica do lado esquerdo - e nos bancos não existe o tal do genuflexório. A pia batismal, toda de pedra, prevê que a criança seja mergulhada de corpo inteiro na água benta. A convite do amigo, fui ao Pátio do Colégio assistir à missa das 10h. Uma das "melhores missas" de São Paulo, segundo quem entende da coisa.

É cantada, com órgão e coral. A entrada do padre e de seus ajudantes (uns dez, se contei bem) se faz com incenso e pompa. À frente, um senhor magro, longas roupas, ostentava a cruz; outro veio e trazia, braços ao alto, uma Bíblia encadernada em metal e pedrarias. Será o padre, pensei. Não era: esse veio depois, numa batina verde e amarela, um bocado vistosa para sua aparência, terrível à primeira vista.

Quando digo missa cantada, não é somente porque o coro já começa a cerimônia com seus "Kyries" e "Glórias", que, aliás, não se estendem além da conta.

O próprio padre passa a maior parte do tempo vocalizando aquela reza meio cantada que ainda associamos à religião tradicional. Até mesmo o trecho do Evangelho daquele dia é "entoado" como uma oração.

Outro detalhe: o padre, para ler o Evangelho, vai até uma pequena sacada (será o famoso púlpito?) e lê o texto lá de cima. A razão, explica o amigo, é que nas igrejas, até a Idade Média, o lugar da leitura ficava sempre no meio do fiéis, para mostrar que Deus estava entre eles.

Careca, meio baixo, uma barba preta de poucos amigos, o padre pareceu, aos meus olhos ímpios, quase um sósia do Zé do Caixão. Feita a leitura cantada, ele voltou para o altar e começou a falar de improviso.

Foi um espetáculo. Hoje em dia, nem mesmo os políticos mais astutos dominam a arte da oratória. Sem abandonar certa dicção eclesial, o padre Carlos Alberto Contieri ia do grave ao agudo, acumulava nuvens escuras e deixava em seguida passar um raio de luz. Por vezes, um laivo de ironia: uma pergunta que ele largava no ar e depois colhia no exato instante em que ameaçava rolar pelo chão.

Havia, pensei, algo de assustador em tanto poder retórico - na segurança com que o padre dominava seu instrumento, como o órgão da igreja. O órgão, aliás, acaba de ser reformado e conta agora com cerca de mil tubos. "O que são mil tubos", perguntou o padre, num meandro de humildade, "perto da grandiosidade de tantos outros órgãos maiores?". Parou um pouco. "Mas o nosso órgão, pelo menos, toca."

Sim, pensei. E como toca! O incenso, a música, a barba preta, um trecho do profeta Ezequiel, o trecho correspondente de são Mateus falando de ímpios e pecadores...
Onde eu estava? Num reduto ultraconservador? Mas a retórica do padre não servia a fins sinistros. Transmitia com clareza uma ideia nova para mim. A homilia era sobre o perdão.

Sabemos, é claro, que devemos perdoar a quem nos ofendeu etc. etc. Coisa que não faço, aliás. Mesmo se fizesse, disse o padre, não seria tão simples assim. Não se trata apenas de aceitar as desculpas que nos pedem. "Ah, está desculpado, passe bem." É mais difícil. Trata-se de oferecer o perdão - a iniciativa deve vir do ofendido, não do ofensor. Outra coisa, diz o padre, não faz Deus aos pecadores.

Tantas vezes revoltado com o que vejo de absurdos na doutrina católica, olhei mansamente para as costas do meu amigo religioso, sentado mais à frente. "Ego te absolvo", bom amigo. Depois de uma missa tão bonita e inteligente, vocês estão desculpados. Até a próxima.

- Marcelo Coelho
Publicado na Folha de S. Paulo em 07/09/2011
Reproduzido via Conteúdo Livre

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

O paradoxo da homofilia


Embora não acreditemos que o fato de ser gay, lésbica, travesti, transgênero, preto, branco ou cor-de-rosa faça necessariamente com que a pessoa apresente um determinado tipo de personalidade - pelo contrário, é apenas mais uma característica em meio a um monte de outras possíveis que fazem com que cada pessoa seja quem é, um ser humano único e precioso - ficamos comovidos com o olhar do blogueiro Karl, que fala sobre o universo médico no Ecce Medicus, e achamos que valia reproduzir seu depoimento aqui.

Não errei, não. Não quis me referir à doença hematológica que faz com que seu portador necessite transfusões de hemoderivados frequentes. Vou, na verdade, falar sobre outra doença, essa talvez mais grave, mais prevalente, mais vil…

Por detrás da manchete, “apenas” mais um caso de agressão a uma “bichinha”. Chamou minha atenção, o fato de o agredido trabalhar na área da Saúde. Talvez por essa razão, minha máquina de esquecer não tenha funcionado direito e remoí esse fato alguns meses até que uma outra estória me fez lembrar do que não tinha esquecido…

Como é de conhecimento dos poucos, porém altamente seletos leitores e leitoras deste blog, gasto ainda grande parte do meu tempo em unidades de terapia intensiva pelos hospitais da grande São Paulo. Tenho notado que a área da Saúde trata seus não-heterossexuais da mesma forma que outras áreas do mercado de trabalho “teoricamente” menos esclarecidas sobre as nuanças da sexualidade humana, a saber, com preconceito e violência. Tenho convivido com médicos, médicas, enfermeiras e enfermeiros, fisioterapeutas entre tantos outros profissionais da área da Saúde, aberta ou veladamente homossexuais, e tenho uma estória para o caso específico do homossexual masculino, levemente efeminado, denominado vulgarmente de “bichinha”, por vezes com o escárnio da pronúncia dos “S” entredentes.

Um homem de 54 anos, empresário bastante bem-sucedido, em um passeio motociclístico de sábado de manhã, bastante comum atualmente na cidade de São Paulo, sofreu um acidente relativamente grave. Fraturas de costelas, traumatismo raquimedular (lesão da coluna vertebral), múltiplas escoriações. Foi para UTI. Com o famigerado colar cervical, intubado e necessitando de ventilação mecânica, logo se recuperou. Jovem, não tinha nenhuma doença crônica associada. Na célula que ficou internado na UTI, o técnico de enfermagem da manhã foi sempre o mesmo. Um pouco mais de 20 anos, bem menos que 30. Gay desses que não deixam dúvida, porém sem ser afetado ou escrachado demais. Pelo menos durante o trabalho. Pelo contrário, a forma e o carinho como cuidava do corpo inerte, por vezes malcheiroso e grande do paciente acidentado transmitia extrema competência. Transparecia a todo o momento o treinamento recebido. Costumo dizer que um profissional começa-se a avaliar pela forma como veste-se com o uniforme. Quem trabalha direito tem um relação com o traje de trabalho, acaba encontrando um jeito de arrumar a touca ou vestir o avental, de deixar os óculos de proteção (chamamos tudo de EPI – equipamento de proteção individual) de um jeito próprio. As mesmas atividades são feitas com elegância particular e tudo isso junto, faz com que admiremos o profissional no exercício de suas funções. Assim era o rapaz. Medicações, banhos, eletrocardiogramas, mudanças de decúbito, instalação das dietas, tudo feito corretamente, com zelo e segurança. O paciente melhorou, acordou, saiu do ventilador, sentou na cama, tirou a sonda nasoenteral para alimentação e começou a receber dieta oral, nos 2 ou 3 dias subsequentes. Cheguei um dia à UTI e o rapaz estava dando uma sopinha, às colheradas, ao paciente. Me postei diante da cama e fiquei observando, satisfeito. Tinha que examiná-lo e questioná-lo sobre dores, falta de ar, etc, mas como estava quase no final, resolvi esperar e apreciar aquele momento de pequena felicidade (dizem até que a vida é feita destas pequenas felicidades!). Ao perceber, o técnico de enfermagem começou a falar, com seus trejeitos característicos, de como ele estava melhor, levantando o ânimo do paciente. Ao terminar a refeição, ele saiu do quarto e eu fiquei a sós com o paciente. Tirei o estetoscópio da parede e antes de posicioná-lo nos ouvidos o paciente disparou: “Pô, Dr! Que é que essa bichona tá fazendo aqui?”

Me senti mal, mas não consegui responder nada. Limitei a dizer que ele tinha sido cuidado, durante quase toda a internação, por aquele rapaz e que ele era muito competente. Agora, com toda essa violência estampada nas páginas de sítios e jornais, me ocorre novamente essa estória de intolerância.

É esse o paradoxo da homofilia. Homossexuais masculinos costumam ter um olhar diferenciado para o cuidar. Amam a espécie humana – sem preconceito de gênero – e aprendi a ver isso no meu trabalho, que, convenhamos, não é um parque de diversões. Peço a licença deste hibridismo, mas usei o homo- do latim que significa homem, anthropos (no grego), ser humano, junto com o sufixo grego –filia, afinidade por, gostar de, amar; e não o homo- grego (igual, o mesmo) pela exata força do trocadilho e pela estranheza que a expressão gera. Estranheza que me causa o fato de não entender como pode ser possível um homossexual que sofre um preconceito diuturno, eternas gozações e piadas de malgosto, bullyings, agressões verbais ou físicas da sociedade em que está inserido, possa demonstrar um amor tão verdadeiro e engajado pela mesma espécie (Homo) que o maltrata. Paradoxo afetivo-linguístico, sem dúvida. Sem dúvida, um caso de homoafetividade.

- Karl, no blog Ecce Medicus
Reproduzido via Conteúdo Livre. Grifo nosso.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Celebração da Pastoral da Diversidade em São Paulo

Nossos amigos de São Paulo da Pastoral da Diversidade, divulgam a data do próximo encontro.

Será neste Domingo, dia 11/9 às 17h.

Tudo o que ligares na Terra, será ligado no céu


O título deste artigo é uma frase bastante conhecida de Jesus, geralmente lembrada em situações em que falamos sobre o sacramento da Penitência. E não sem motivo é assim. O texto que a precede é uma exaltação ao perdão e à reconciliação. Mais: é um verdadeiro percurso para o resgate de relações desgastadas pelo pecado.

Ensina, então, o Mestre que quando alguém peca contra nós devemos primeiro tentar a reconciliação direta com a pessoa. Se esta a aceitar, perfeito! Se não, cabe procurarmos outros que possam nos auxiliar neste processo de reconstrução: outras testemunhas e, sem sucesso com estas, uma instituição que, nas palavras do Evangelho, é representada pela Igreja. Por que envolver outros em uma situação a princípio particular? Porque tanto a relação amorosa, quanto à relação de pecado, contagiam a comunidade, perturbando a sua caminhada. Assim, todos precisam estar envolvidos no processo de perdão.

E que poder é esse que o Senhor nos dá para ligarmos coisas no céu e na terra? Creio que seja o poder dos sentimentos que carregamos em nosso coração. Se nosso coração é pleno de amor pelos nossos companheiros de caminhada terrena, assim será nosso coração na eternidade. Ligamos porque nossa capacidade de amar o próximo é diretamente proporcional à nossa capacidade de fazê-lo melhor. Ligamos porque palavras e ações amorosas constroem pontes que permitem trilhar outros caminhos. Ligamos porque atitudes de compaixão com o outro, trazem-no para perto do Pai e resgatam possibilidades que pareciam perdidas.

Da mesma forma, acontece com os maus sentimentos, que caminham em sentido contrário ao amor. Desde pequenos aprendemos: se semeamos ventos, vamos colher tempestades. O mau sentimento, o rancor, o egoísmo, o orgulho destroem as pontes que uma simples ação de amor é capaz de construir.

Por isso é muito significativo que nossa frase-título esteja ao final de uma preleção sobre o perdão e a reconciliação. Soa como uma provocação – ou advertência – para que possamos avaliar o que desejamos fazer: construir, ligar, ou destruir a possibilidade de resgatar relações.

Texto para reflexão: Mt 18, 15-20

- Gilda Carvalho
Reproduzido via Amai-vos
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