quarta-feira, 8 de maio de 2013

Os últimos desejos de Jesus



A leitura é o Evangelho de Jesus Cristo segundo João 14, 23-29 que corresponde ao Sexto Domingo de Páscoa, ciclo C do Ano Litúrgico. O comentário é do teólogo espanhol José Antonio Pagola.

Eis o texto.

Jesus despede-se dos seus discípulos. Vê-os tristes e acobardados. Todos sabem que estão vivendo as últimas horas com o seu Mestre. Que acontecerá quando não mais estiverem em sua presença? A quem acudirão? Quem os defenderá? Jesus quer infundir-lhes ânimo descobrindo-lhes os seus últimos desejos.
Que não se perca a minha mensagem. É o primeiro desejo de Jesus. Que não se esqueça a sua Boa Nova de Deus. Que os seus seguidores mantenham sempre viva a recordação do projeto humanizador do Pai: esse “reino de Deus” de que lhes falou tanto. Se o amam, isto é o primeiro que hão-de cuidar: "Se alguém me ama, guarda a minha palavra...Quem não me ama, não guarda as minhas palavras"(14,23-24)
Depois de vinte séculos, que fizemos do Evangelho de Jesus? Guardamos fielmente ou o estamos manipulando a partir dos nossos próprios interesses? Acolhemos no nosso coração ou vamos esquecendo-o? Apresentamo-lo com autenticidade ou ocultamo-lo com as nossas doutrinas?
O Pai envia-vos em Meu nome um Defensor. Jesus não quer que fiquem órfãos. Não sentirão a sua ausência. O Pai envia-lhes o Espírito Santo que os defenderá do risco de desviarem-se Dele. Este Espírito que captaram Nele, enviando-os aos pobres, impulsionará também a eles na mesma direção
O Espírito “ensinará” a compreender melhor tudo o que o ensinou. Ajudará a aprofundar cada vez mais a Boa Nova.“Lembrarem tudo o que eu lhe disse"(14,26). Educa-os no seu estilo de vida.
Depois de vinte séculos, que espírito reina entre os cristãos? Deixamo-nos guiar pelo Espírito de Jesus? Sabemos atualizar a sua Boa Nova? Vivemos atentos aos que sofrem? Para onde nos empurra hoje o seu alento renovador?
Dou-vos a minha paz. Jesus quer que vivam com a mesma paz que puderam ver nele, fruto da sua união íntima com o Pai. Oferece-lhes a sua paz. Não é como a que lhes pode oferecer o mundo. É diferente. Nascerá no seu coração se acolhem o Espírito de Jesus.
Essa é a paz que há-de contagiar sempre que cheguem a um lugar. O primeiro que difundirão ao anunciar o reino de Deus para abrir caminhos a um mundo mais são e justo. Nunca hão-de perder essa paz. Jesus insiste: “Não fiquem perturbados, nem tenham medo” (14,28).
Depois de vinte séculos, por que nos paraliza o medo em relação ao futuro? Por que tanto receio frente à sociedade moderna? Há muita gente que tem fome de Jesus. O Papa Francisco é um presente de Deus. Tudo nos está a convidar para caminhar em direção a uma Igreja mais fiel a Jesus e a seu Evangelho. Não podemos ficar passivos.

Na calada da noite



Na calada da noite ainda vamos nos surpreender muito. 
A nossa fé, assim como a própria Igreja, é dinâmica. Elas não nos foram "dadas" prontas. Elas se desenvolvem. Que graça!
Compartilhamos o texto abaixo traduzido pelo beneditino Ruberval:

O teu nome é Meia noite!

Na tradição, não somente naquela bíblica, o tempo mais propício para as passagens e manifestações divinas parece ser o coração da noite. Não por acaso que cada ano, ainda hoje, celebremos as duas festas principais do ano em vigília e oração, ao ponto de iluminar as trevas mais espessas com a oração e o amor. Na primeira leitura nos é relatado uma das desventuras de Paulo e Silas, que se conclui de modo muito preciso: «Atirou-os na parte mais interna do cárcere e prendeu-lhes os pés aos cepos» (At 16,24). Parece que agora não haja mais nada a fazer, como também parece que a resistência ao anúncio do evangelho tenha vencido e que o próprio evangelho esteja preso, de uma vez por todas, como e com os pés dos apóstolos: apertados com correntes. Mesmo assim, existe alguma coisa que é mais forte que os cepos e correntes, e é a fé de quem não deixa de crer e esperar, mesmo na parte mais interna e mais obscura da prisão, demonstrando, assim, ter um coração tão livre que não pode ser acorrentado por nada nem ninguém: «Pela meia noite, Paulo e Silas, em oração, cantavam hinos a Deus, enquanto os prisioneiros estavam escutando-os» (16,25).
Preciosíssimo versículo, que remete ao dúplice mistério da oração de louvor que é possível – poderíamos dizer, até mesmo, necessária – também no momento da desolação e do anúncio do evangelho, que passa simplesmente através deste canto dos apóstolos, canto capaz de criar, na prisão, habituada muito mais a outros clamores, uma atmosfera de paz tão profunda ao ponto de desmantelar, até às vísceras da terra, todas as feiuras: «Improvisamente aconteceu um terremoto tão forte que foram sacudidos os fundamentos da prisão; súbito se abriram todas as portas e caíram as correntes de todos» (16,26). Estamos diante de uma das mais belas parábolas capazes de dizer sobre a eficácia do evangelho de Cristo. Antes de tudo a memória que Deus intervém à «meia noite» e «imprevisivelmente», e que a sua passagem – como aquela da Páscoa – é sempre uma passagem para a libertação. À memória da Páscoa, vivida pelo povo no Egito, se acrescenta um elemento que é próprio da páscoa de Cristo e que é expressa pela palavra que Paulo dirige ao carcereiro: «Não te faças mal, estamos todos aqui» (16,28). A libertação deve ser para todos e não existe mais a lógica, segundo a qual, é necessário que alguém perça para que um outro viva, como acontece no Mar Vermelho. Para a Páscoa de Cristo, existe vida para todos, até mesmo para o carcereiro, para o qual, a estranha bondade de Paulo e Silas que, com a sua oração, criam as condições para a liberdade de todos, é um verdadeiro terremoto interior que muda a sua vida desde os fundamentos: «Depois, fez-lhes subir em casa, pôs a mesa e estava pleno de alegria, junto com os seus, por ter acreditado em Deus» (16,34). À luz de tudo isto, podemos deixar decantar no nosso coração, a palavra do Senhor, que busca levar-nos um pouco mais longe: «Mas eu vos digo a verdade: é bom para vós que eu vá, porque, se não vou, não virá para vós o Paráclito; se ao contrário, vou, eu o mandarei a vós» (Jo 16,7). Um verdadeiro terremoto, que preludia a uma nova meia noite!
Semeraro, M., Messa Quotidiana, Bologna, maggio 2013, 77-79.
Ruberval Monteiro da Silva OSB

Fonte

Felizes são os que nunca se afastaram



"Pois vê: hão-de viver e multiplicar-se em festa
e não serão submetidos à temporalidade
e hão-de crescer como as bagas da floresta
e abrigar o solo com suavidade.
Pois felizes são os que nunca se afastaram
e silenciosos à chuva e sem tecto ficaram;
até eles chegarão todas as colheitas
e o seu fruto será pleno multiplicando receitas.
A todos os finais hão-de sobreviver
e aos reinos cujo sentido vai desaparecer,
e como mãos descansadas se hão-de erguer
quando as mãos de todas as classes da sociedade
e de todos os povos cansadas estiverem de verdade."

O Livro de Horas

Autor Rainer Maria Rilke


segunda-feira, 6 de maio de 2013

Uma nova paróquia



A CNBB lançou o esboço de um documento sobre as paróquias: “Comunidade de comunidades: uma nova paróquia”. Ele vai ser distribuído às 1.200 paróquias brasileiras para receber sugestões, até se tornar um texto oficial no ano que vem. Há um trecho que fala sobre novas situações familiares:
 
"De nossas paróquias participam pessoas unidas sem o vínculo sacramental, outras estão numa segunda união, e há aquelas que vivem sozinhas sustentando os filhos (...). Crianças são adotadas por pessoas solteiras ou por pessoas do mesmo sexo que vivem em união estável. A Igreja, família de Cristo, precisa acolher com amor todos os seus filhos".

Íntegra do documento

Sem-tetos espirituais



Li este depoimento hoje com lágrimas nos olhos, mas o coração cheio de alegria. As lágrimas foram de tristeza por essa igreja que ainda fecha as portas a tantos, mas a alegria foi por reconhecer nos manifestantes a igreja de Cristo à qual pertenço e que tanto amo. Foi nesse espírito que traduzi o texto e agora o compartilho, na esperança de que esse relato possa inspirar os cristãos a seguirmos afirmando nosso lugar na casa do Pai, com nossas mãos "sujas" e nossos corações limpos. :-) (via@Christians Tired of Being Misrepresented)



"Pedie se vos dará. Buscai e achareis. Batei e vos será aberto. Porque todoaquele que pede, recebe. Quem busca, acha. A quem bate, abrir-se-á."(Mateus 7:7-8).

Hoje, eu e outros batemos à porta da Catedral de St. Patrick [Nova York], mas a porta não foi aberta — pelo contrário, foi fechada na nossa cara. Ao começar a redigir este artigo, estou ciente da intensidade das emoções que se agitam no fundo do meu coração. É um sentimento que não me é familiar, pois até hoje nunca me havia sido negado um lugar à mesa de Cristo. Com efeito, hoje foi o primeiro dia em que me senti destituído,abandonado e perdido.

Mais cedo, um grupo de católicos, eu incluído,nos reunimos na esquina da rua East 46th com Fifth Avenue, em Manhattan. Nosso encontro tinha um único objetivo:sujar nossas mãos para, em seguida, irmos assistir à missa na Catedral de St. Patrick. Estávamos sujando as mãos em resposta silenciosa à coluna do Cardeal Dolan de semana passada, na qual ele afirmou que as pessoas LGBT eram bem-vindas na igreja desde que lavassem as mãos. Ao esfregarmos nossas mãos com cinzas,elas assumiram a aparência e a sensação do empenho que vem definindo nosso trabalho para recebermos um lugar igualitário à mesa de Cristo na Igreja Católica. Os participantes eram não só católicos LGBT, mas também aliados e,talvez mais importante, pais de filhos LGBT. Reunimo-nos não em protesto, mas para dar nosso testemunho silencioso.

Foi o que se passou após termos sujado as mãos que por exemplo difícil para mim entender e situar no contexto da experiência cristã. Por volta de 9h30 da manhã,nosso grupo de dez pessoas foi abordado por quatro viaturas policiais, oito policiais uniformizados, um capitão de polícia e um detetive da unidade especial para LGBTs. O detetive nos informou que a Catedral proibiria a nossa entrada porque nossas mãos estavam sujas. Foi nesse momento que me dei conta do poder que o medo tem. A Arquidiocese de Nova York estava respondendo a partir do seu medo a uma presença pacífica e silenciosa na missa.Mesmo diante disso,resolvemos caminhar solenemente de nosso ponto de encontro até a Catedral, na esperança de sermos acolhidos.

Ao chegarmos à Catedral de St. Patrick, fomos abordados por Kevin Donohue, que se identificou como encarregado das operações da catedral. Infelizmente, o tom do Sr. Donohue era frio e reprovador. O que me deixou mais perplexo foi ele dizer que poderíamos entrar na catedral desde que lavássemos as mãos antes. Até agora,quando escrevo estas palavras, tenho dificuldade para compreender seu significado, tentando entender seu caráter de exclusão.

Foi nesse momento que o Sr. Donohue nos advertiu de que, caso entrássemos na Catedral de St. Patrick com as mãos sujas,seríamos presos e acusados de invasão criminosa. Ao ouvir essas palavras,lembro que pensei "Como posso ser acusado de invasão criminosa da minha própria casa?". Foi aí que percebi oque significa ser um sem-teto espiritual. Foi um entendimento particularmente difícil para mim à luz do encontro privado que eu tivera com o Cardeal Dolan em 27 de novembro de 2012, em seu escritório em Manhattan. Durante esse nosso encontro, ele expressou tamanho amor e acolhimento que me pareceu muito difícil compreender essa “acolhida condicional” subsequente.

Em resposta à ameaça de prisão por parte da Arquidiocese,optamos por ficar do lado de fora, onde permanecemos em vigília silenciosa, comas palmas das mãos estendidas na direção das portas principais da Catedral. À medida que se aproximava o horário do início da missa, as portas temporárias de aço que se encontram na fachada da Catedral enquanto as originais estão sendo restauradas pareciam simbolicamente apropriadas. O aço frio e as portas cerradas diante de nós parecem-me, agora, capturar bem a frieza que sentimos departe tanto dos funcionários da Catedral quanto do próprio cardeal. Nossa presença pacífica teve como resposta um sonoro "vocês não são bem-vindos".

Tendo sido criado como católico romano desde o nascimento, minha experiência da Igreja e de sua comunidade de crentes sempre foi de um lugar de acolhimento e afirmação. Quando me assumi homossexual, o padre que me acompanhava desde a infância e as lideranças da paróquia da minha cidade natal ficaram ao meu lado e me apoiaram. Hoje, essa experiência infantil de “igreja” entrou em agudo contraste com a resposta fria e implacável da Arquidiocese de Nova York e do Cardeal Dolan à nossa presença na Catedral pela manhã.

Outro dia, postei no meu mural no Facebook que, após a falsa acolhida do Cardeal, eu me encontrava em uma encruzilhada na minha jornada de fé; entretanto, percebo agora que não sou eu que me encontro nessa encruzilhada, e sim o próprio Cardeal. Ele se encontra num ponto em que pode escolher enxergar a dignidade intrínseca a todas as pessoas ou seguir por um caminho de julgamento e acusação.

Hoje, encontro-me não em uma encruzilhada, mas sim no limiar de uma porta. Eis que eu e outros estamos à porta da Igreja e batemos, buscamos, rogamos. Espero que nosso ato de hoje leve as portas da Catedral a se abrirem para nós não em termos condicionais, mas com o entendimento de que somos todos criados à imagem e semelhança de Deus.

A vigília desta manhã não foi uma questão demãos sujas, mas, como disse Brendan Fay, de "corações limpos". Com nossos corações limpos e nossas mãos sujas, continuaremos batendo às portas da Catedral, com a esperança de que, um dia, o Cardeal Dolan por fim se dê conta de que também nós somos dignos de entrar na igreja, como filhos de Deus.

Fonte e imagens da manifestação

Tradução e comentário: Cristiana Serra
Imagem: Adriana Varejão

O verdadeiro amor



O autor do texto a seguir, José Lisboa Moreira de Oliveira, foi assessor do Setor Vocações e Ministérios/CNBB e Presidente do Inst. de Past. Vocacional; é gestor e professor do Centro de Reflexão sobre Ética e Antropologia da Religião (CREAR) da Universidade Católica de Brasília. Publico aqui alguns fragmentos, mas vale muito a leitura do texto na íntegra. :-)

[A presença de Feliciano na CDHM] expressa um tipo de cristianismo arrogante e prepotente que, sob certos aspectos, nos faz voltar à Idade Média e ao período da Santa Inquisição. Desta vez os protagonistas da arrogância e da prepotência não são os católicos, mas grupos ou pessoas do seguimento evangélico. Embora não faltem no atual catolicismo ultraconservador de direita, pessoas e grupos imbuídos da mesma arrogância e da mesma prepotência.

Trata-se de arrogância e de prepotência porque, como nos lembrou décadas atrás Paul Ricoeur, tais pessoas ou grupos cristãos pretendem ocupar o lugar reservado exclusivamente para Deus. Essas pessoas e esses grupos não só pretendem dizer a Deus como ele deve se comportar em relação aos que são diferentes delas e deles, mas se colocam como juízes para condenar quem pensa diferente ou quem quer ser diferente. (...)

Sentam-se solenemente em suas "cátedras” e, revestidos com as togas de acusadores, com ares de soberania de deuses tiranos, apontam o dedo contra aqueles que ousam pensar diferentemente ou viver diferentemente. "Amarram pesados fardos e os colocam no ombro dos outros, mas eles mesmos não estão dispostos a movê-los, nem sequer com um dedo” (Mt 23,4). Assim, por exemplo, pretendem ditar para todas as pessoas de uma sociedade pluralista, como é o caso do Brasil, normas que dizem respeito apenas ao seu próprio credo. Querem que todos, sem exceção, sejam submetidos aos dogmas por eles inventados e falsamente atribuídos a Deus (Mc 7,9). Não admitem que pessoas possam viver diferentemente, segundo suas convicções e crenças. Não querem permitir que tais pessoas expressem o que sentem e vivam publicamente segundo suas convicções, sob a alegação de que isso é ofensivo e imoral. Transformam o próprio credo e a própria moral em moralidade universal que, segundo eles, deveria ser imposta a todas as pessoas.

Na raiz do racismo, da homofobia, da discriminação e do preconceito praticados por estas pessoas ou seguimentos cristãos está um ato profundamente diabólico: acusar os outros diante de Deus (Ap 12,10). Ao usarem de intransigência e ao apontarem arrogantemente o dedo contra quem não lê pela cartilha deles, tais pessoas ou grupos deixam de ser discípulos e discípulas de Jesus para serem seguidores do Diabo, o acusador dos irmãos diante do trono da divindade. (...)

O resultado deste tipo de comportamento é o fato de que tais lideranças costumam se esquecer de que suas falhas e seus pecados são muito mais graves do que os pecados daqueles e daquelas que acusam. Costumam se esquecer de que, quase sempre, elas são responsáveis por tantas outras mazelas e por tantos outros pecados imperdoáveis e que ofendem muito mais a Deus do que as fragilidades dos que são por elas acusados (Jo 8,7). (...)

Nota-se tanta obsessão e tanta histeria ao atacar a homossexualidade e atos sexuais considerados inadmissíveis, mas não vejo o mesmo empenho e o mesmo compromisso na luta contra a corrupção, contra o desvio de verbas públicas, especialmente da saúde, que terminam por matar tantas pessoas pobres e inocentes. Não vejo nenhum deputado evangélico, e nenhum padre e bispo católico obcecado por pecados sexuais, tendo a mesma postura de profetas como Amós que denunciava as "vacas de Basã” que moravam em palácios de luxo, oprimiam os fracos, maltratavam os necessitados e, com seus maridos, realizavam banquetes às custas dos mais pobres (4,1-3). Não vejo nenhum deles denunciando as maquinações de políticos, de latifundiários, do agronegócio etc. e que visam "comprar o fraco por dinheiro, o necessitado por um par de sandálias, e vender o refugo do trigo” (Am 8,6).

Não custa lembrar o risco da hipocrisia nessas atitudes prepotentes e arrogantes, especialmente quando se concentra todos os pecados do mundo na questão da sexualidade. Carlos González Vallés no seu livroQuerida Igreja (Paulus, 1998) já nos lembrava anos atrás que toda essa obsessão pelos pecados sexuais esconde um desejo de dominação e de manipulação por parte dos chefes cristãos. Como a sexualidade é algo inerente a toda pessoa humana, fica mais fácil dominá-las e controlá-las através da condenação obsessiva dos pecados do sexo. Tal condenação funciona como uma espécie de "quebra-molas”, freando todo e qualquer desejo de autonomia e de liberdade. (...)

Por fim, não custa lembrar que o amor é a essência do cristianismo. Quem ama é de Deus, permanece em Deus (1Jo 4,7-8) e quando há amor verdadeiro não existe lugar para o medo e para o temor (1Jo 4,18). E os evangelhos nos mostram que não são as lideranças religiosas as pessoas que mais amam. São as pessoas tidas pelo sistema religioso como as mais pecadoras, aquelas que mais amam no sentido pleno e mais evangélico da palavra (Lc 7,36-50). Então porque não aceitar a possibilidade de que entre duas pessoas do mesmo sexo possa existir um amor autêntico? Um amor profundamente humano que pode ser comparado ao amor existente entre um homem e uma mulher (2Sm 1,23-27)? Um amor como o de Jesus que não escondia sua predileção, a sua afeição e a sua ternura por um discípulo, permitindo-se certa intimidade que era exclusiva da relação de um homem com sua esposa (Jo 13,23-25)? Ou será que tais pessoas já admitem a possibilidade de que o "discípulo amado” (Jo 21,7) possa, na verdade, ser uma "discípula amada”? Mas, neste caso, a história já seria outra e provocaria verdadeira revolução no cristianismo.

Fonte
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