sábado, 11 de junho de 2011

Porque o Espírito sopra onde quer...


Trailer do filme "Taking A Chance On God" ("Dando uma chance a Deus"), lançado na Itália, sobre um pioneiro do movimento Dignity nos Estados Unidos, o padre John McNeill. Infelizmente, não conseguimos uma versão legendada, desculpem.

Nestes tempos de Pentecostes, como é alentador saber que o Espírito continua a soprar - e, como sempre, sopra onde quer... ;-)

Gays cristãos europeus buscam diálogo com o Magistério


Gays cristãos escrevem ao Papa: "Santo Padre, apelamos ao senhor para pedir uma condenação dos atos de violência contra Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros e pedimos a colaboração de Vossa Santidade para a descriminalização dos atos homossexuais em nível mundial". Para os grupos cristãos homossexuais, que participam da Europride, é importante que a Santa Sé apoie o apelo da ONU aos Estados do mundo para reconhecer que a orientação sexual não pode ser motivo de condenações penais, prisões e execuções.

A reportagem é de Marco Politi, publicada no jornal Il Fatto Quotidiano, 09-06-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto, aqui reproduzida via IHU, com grifos nossos.

É uma carta escrita com tom pacato. "Episódios de violência, torturas e assassinatos contra as pessoas LGBT são verificados frequentemente em diversas partes do mundo, e quem as põe em prática está muitas vezes convicto de sua conformidade à vontade da Igreja Católica. [...] Apelamos à Vossa Santidade para que sejam fornecidas a todos os cristãos informações claras a respeito das passagens da Bíblia que são usadas para justificar esses atos aberrantes. [...] Os versículos que apoiam o assassinato de pessoas que praticam atividades sexuais com pessoas do mesmo sexo não devem ser interpretadas literalmente".

No dia 10 de junho, uma delegação do Fórum Europeu de Grupos Cristãos LGBT se dirigiu ao Vaticano para entregar a carta endereçada a Bento XVI, na representação de 44 associações homossexuais cristãs. As associações de católicos, protestantes, anglicanos e de outras confissões cristãs vêm de 22 países. Da Armênia à Grã-Bretanha, da Espanha à Rússia, da Suécia à Malta. É interessante a formação de grupos cristãos LGBT nos países da ex-União Soviética, com uma forte presença ortodoxa.

A carta ao papa contém também o pedido de que a Igreja Católica abandone todo tipo de pressão em favor das chamadas "terapias", que deveriam curar a homossexualidade. São experiências às quais certos pais são induzidos e que têm causado graves danos psicológicos em jovens que a elas se submeteram.

O próprio jornal dos bispos italianos, Avvenire, afirmava claramente, em um recente fascículo sobre o tema, que a homossexualidade não deve ser considerada como uma doença a ser tratada. "Como a ciência demonstrou que a homossexualidade é uma variante da sexualidade, apelamos para que essa evidência científica seja incluída nos ensinamentos da Igreja".

O fórum exige, por fim, que Bento XVI "reconsidere a posição da Igreja sobre as relações entre pessoas tanto do mesmo sexo, quanto transexuais, apoiando também a aceitação e a bênção dessas relações no interior da Igreja". Na Itália, o problema é particularmente grave por causa do veto eclesiástico a uma lei sobre as uniões de fato.

A Fare Italia Mag, a associação que está relacionada a Adolfo Urso, julga como "vergonhoso" que o parlamento não aborde um problema que "diz respeito a alguns milhões de pessoas". A esperança é que se deem passos para a frente.

Para a Europride está em curso uma mobilização em massa. Entre militantes e simpatizantes de todas as orientações culturais, prevê-se uma participação maciça. Neste sábado, a marcha da EuroPride vai da Piazza dei Cinquecento ao Circo Máximo, e à noite, às 21h, ocorrerá o show de Lady Gaga. No Europride Village, da Praça Vittorio Emanuele, também será realizado um debate sobre "Judaísmo e homofobia".

Nesta sexta-feira, os católicos do fórum organizaram uma conferência sobre a relação entre as Igrejas e os gays na Europa. Participarão o teólogo John McNeil, fundador da célebre associação Dignity, nos Estados Unidos, junto com Franco Barbero. Durante o debate, serão dados testemunhos de como se configura, nas comunidades eclesiais de diversos países, a aceitação da realidade homossexual.

Entre as diversas experiências de um processo de aceitação da realidade gay por parte da hierarquia eclesiástica, será mostrada a história das "missas de Soho", organizadas pelo Catholic Caucus of the Lesbian & Gay Christian Movement e celebradas desde 2007 – com o pleno consentimento do arcebispado católico – na Igreja da Assunção, em Warwick Street, Nova York. Não é uma "missa gay"; é um ritual aberto a todos, celebrado no primeiro e no terceiro domingos do mês. [Em Londres acontece experiência semelhante.]

O novo arcebispo católico de Londres, Dom Vincent Nichols – relata Martin Pendergast, que participará da conferência nesta sexta-feira – tem resistido às pressões dos católicos conservadores para acabar com a experiência.

Além disso, em uma ocasião pública, ele declarou: "É claro que existe uma relação entre procriação e sexualidade humana. Agora, como partir desse princípio, sem perdê-lo, e ter um diálogo aberto e contínuo com aqueles que dizem 'essa não é a minha experiência'? Como unir os princípios escritos no amplo livro da natureza com as experiências individuais? É essa a área (o problema) ao qual devemos ser sensíveis e abertos, e que é preciso querer explorar sinceramente".

Se essa fosse também a linguagem da hierarquia eclesiástica em Roma, os fiéis gays italianos talvez organizassem uma novena.

Ânimo, vocês não estão sozinhos!


Era festa de Pentecostes. Cinqüenta dias haviam se passado desde todos aqueles acontecimentos que cercaram a morte e a ressurreição de Jesus. O Mestre já havia aparecido a eles e, na sua frente, havia ascendido aos céus. Porém, os discípulos ainda encontravam-se fechados e com medo do que poderia lhes acontecer. Ainda que tivessem visto e trouxessem em seus corações a certeza de que o Senhor havia ressuscitado, não sabiam como agir ou que caminhos seguir para levar adiante os ensinamentos do Senhor, já que não viam como enfrentar o resto do povo que não possuía a mesma experiência que a deles. Então, o Espírito Santo veio sobre eles e se manifestou na forma de línguas de fogo sobre suas cabeças (cf At 2,1-11).

Imediatamente, tudo clareou. Não havia mais espaço para o medo, para o limite, para as fronteiras. Era urgente que a mensagem de Jesus Cristo fosse levada a todos os homens e mulheres!

O Espírito prometido por Jesus em diversas ocasiões veio animar aqueles homens que se encontravam fechados, abrindo-lhes as portas do entendimento, enchendo-lhes o peito de coragem, e os impulsionando a ir além e além. E, o que se sucede a partir daquele dia começado no silêncio e na escuridão do Cenáculo, é conhecido: a mensagem de Jesus se espalha pelo mundo, a Igreja se constitui e a humanidade é invadida por uma nova esperança. Onze homens medrosos transformariam a história da humanidade, que nunca mais seria a mesma após receber a mensagem de Cristo.

O Espírito que veio sob a forma de vento e de fogo e permanece a soprar e a aquecer nossos corações com o entendimento e a coragem necessários para que possamos continuar o trabalho dos Onze. Se também temos medo, Ele nos acalma; se os caminhos são tortuosos, Ele os aplaina; se só vemos trevas, Ele faz brilhar as luzes. É ele que nos anima e que nos enche de desejos e sonhos, fazendo com que nossos atos nos ultrapassem. É esse mesmo Espírito que forma o corpo místico de Cristo ao que nos une de forma indelével e eterna, e através do qual formamos uma só família e uma só Igreja.

O Espírito de Deus é o sopro criador, o transformador de realidades, o acalentador de corações. Encher-se desse Espírito é deixar-se invadir pelo próprio amor de Deus, é deixar-se mover pelas cordas impulsionadoras do Pai que nos quer irmãos e irmãs em todo o mundo. É, por fim, abandonar-se à graça e deixar que Deus viva em nós, suplantando-nos de tal modo que sejamos imagem e semelhança Dele e O testemunhemos concretamente.

Que o Espírito que anima a vida da Igreja, garantindo-lhe a alma e o ardor vibrantes, possa também acender essa mesma chama em nossos corações e suscitar-nos o desejo de melhor amar e servir sempre, em qualquer lugar, a qualquer pessoa.

Textos para sua reflexão: At 2, 1-11, 1Cor 12, 3-7.12.13 e Jo 20, 19-23

- Gilda Carvalho
Reproduzido via Amai-vos, com grifos nossos.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

O colecionador de lágrimas

Arte: Helen Sear

É interessante a coleção de lágrimas do professor de antropologia. Tem onze exemplares, colhidos de cinco anos para cá. As lágrimas são expostas em concavidades feitas numa mesa de granito e cada uma é coberta por uma redoma de cristal da Boêmia, todas conservando a forma e brilho peculiares. Ele iniciou a coleção por brincadeira, colhendo lágrimas da birra de um filho, tomou gosto e agora é um colecionador apaixonado. Aproveitando o lacrimejamento que a fumaça do cigarro me provocou, fez uma demonstração do seu trabalho. Colhe a lágrima com uma pinça de pontas côncavas embebidas em muco de caracol e a deposita numa salva de prata contendo o mesmo muco, rola a lágrima em todos os sentidos com delicadíssimos movimentos até transformá-la numa lágrima à milanesa e a coloca na concavidade do granito. Passado algum tempo o muco escorre para o fundo da concavidade e forma um berço para a lágrima, que ali fica boiando, tal como brotou do olho. De todas as coleções que tenho visto essa foi a mais estranha e uma das mais bonitas. A peça mais valiosa é uma lágrima recente de dor antiga, que ele surpreendeu junto à base do nariz de um solteirão sarcástico e com rara felicidade conseguiu colher intacta (foi a única que pinçou já rolada). É do tamanho médio e tem um brilho discreto, diferente do brilho mais ou menos comum a todas as outras da mostra e que transmite uma sensação de distancia se olhada fixamente com óculos de lentes escuras. O professor faz questão de que todos saibam que não há morbidez em seu hobby e eu notei essa preocupação pelas explicações que me deu sobre uma lágrima proveniente de gargalhadas sadias. Ele fica irritado se alguém fala em comprar a coleção. Quando um milionário lhe pediu que pusesse preço à sua vontade, chegou a perder a cabeça e respondeu com palavrões. A recusa fez o milionário chorar de frustração e uma de suas lágrimas está na segunda fileira, brilhante como uma moeda nova. Notei a falta de uma lágrima do dono da coleção e o felicitei. Recusou os parabéns. Poderia ter ali uma lágrima própria, escolhida e pinçada dentre as que chorou de emoção naquela tarde de vinte e sete de março em que um famoso filósofo o beijou em ambas as faces, sem uma palavra, depois de também silenciosamente haver apreciado peça por peça e copiado todas as legendas. Quando se lembrou de colher a lágrima era tarde, tinha enxugado todas na manga do paletó. Ao me despedir pegou-me pelo braço, ficou imóvel parecendo hesitar, mas desembuchou e me confidenciou que ultimamente vem sendo atormentado por um sentimento de culpa. É que há lágrimas terríveis ali, cuja causa nunca revelou a ninguém, como por exemplo a nona e a terceira, que o fazem duvidar do seu direito de conservá-las vivas e com toda a sua força de dor. Já chegou a sonhar com elas desesperadas, bracejando no muco em que bóiam e cintilam. Esteve quase destruindo a coleção e jogando tudo no rio. Não o fez mas perdeu o entusiasmo e no mês passado deixou de substituir o muco das concavidades, que está mofando e tirando o brilho das lágrimas. Tem-se negando a receber visitantes – nem sabe por que me recebeu – e vem tomando medo de olhar para certas peças que parecem acusá-lo. Há pouco tempo não conseguiu colher uma lágrima fácil de pinçar e acabou rebentando-a por causa do tremor da mão. Não sabe como vai acabar tudo aquilo e está apreensivo.

- Ildeu Brandão
Reproduzido via Centro Loyola.

Para refletir:
1. Qual a lágrima que você guarda na memória?
2. Você já chorou por amor?
3. Como Deus se manifestou a você neste momento?

Carta aberta do Fórum Europeu LGBT ao Papa Bento XVI


Publicamos aqui a Carta Aberta do Fórum Europeu de Grupos Cristãos de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros, com sede em Berlim, a Bento XVI para que preste atenção aos direitos humanos dos LGBTs.

Conforme postamos no início da semana, o texto da carta foi aprovado em Berlim, no dia 7 de maio de 2011, na conferência anual dos delegados do Fórum, e foi entregue no Palácio Apostólico, no Vaticano, no dia 10 de junho.

Eis o texto, reproduzido via IHU com grifos nossos.

Santo Padre, apelamos ao senhor para pedir uma condenação dos atos de violência contra Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros (LGBT) e pedimos a colaboração de Vossa Santidade para a descriminalização dos atos homossexuais em nível mundial.

O silêncio de Vossa Santidade é muitas vezes interpretado pelas pessoas que cometem atos de violência, tortura e assassinato como um parecer favorável às suas ações.

Por exemplo, em janeiro deste ano, David Kato, um ativista na luta pelos direitos das pessoas LGBT, foi brutalmente assassinado na Uganda.

Episódios de violência, torturas e assassinatos contra as pessoas LGBT são verificados frequentemente em diversas partes do mundo, e quem as põe em prática está muitas vezes convicto de sua conformidade à vontade da Igreja Católica.

Esse convencimento é reforçado pelo fato de que, em dezembro de 2008, a Santa Sé ter se recusado a apoiar a Declaração das Nações Unidas sobre a orientação sexual e a identidade de gênero.

A declaração contém um parágrafo que exorta a todos os Estados a assegurar que a orientação sexual ou a identidade de gênero não possam ser, em nenhuma circunstância, a base para a aplicação de penas criminais, particularmente de execuções, prisões ou detenções.

Além disso, apelamos à Vossa Santidade para que sejam fornecidas a todos os cristãos informações claras a respeito das passagens da Bíblia que são usadas para justificar esses atos aberrantes.

Assim como as passagens em favor da escravidão, os versículos que apoiam o assassinato de pessoas que praticam atividades sexuais com pessoas do mesmo sexo não devem ser interpretadas literalmente.

Existe ainda uma forma de pressão por parte de alguns expoentes do clero da Igreja Católica Romana sobre os cristãos LGBT para se submetam a "terapias reparadoras" para modificar sua própria orientação sexual. Essa estratégia da Igreja e o pedido às pessoas LGBT que vivam a condição da castidade são causa de muitas tragédias, incluindo suicídios e graves estados de depressão, entre aqueles que tentam observar e seguir heroicamente os ensinamentos da Igreja.

Por outro lado, segundo estudos mais recentes de psiquiatria e de psicologia, a orientação sexual não pode ser modificada, e essas tentativas, por isso, muitas vezes têm como consequência graves danos psicológicos. Além disso, uma vida de castidade não pode ser exigida a quem não sente dentro de si essa vocação.

Aos cristãos LGBT, não pode ser negado o direito fundamental a uma relação afetiva, independentemente do gênero da pessoa amada. Como a ciência demonstrou que a homossexualidade é uma variante da sexualidade, apelamos para que essa evidência científica seja incluída nos ensinamentos da Igreja.

Em consequência, pedimos a Vossa Santidade que não se dê mais como indicação que as pessoas homossexuais devam se submeter a terapias, mas que, ao contrário, tenham direito a uma vida que preveja também uma relação afetiva no sinal da fidelidade.

Os benefícios sociais e pessoais disso são: uma vida feliz, saúde mental, capacidade de dar o melhor de si no trabalho e no apoio aos outros.

De outra forma, a vida muitas vezes se transforma em uma triste existência com uma série de inúteis terapias psicológicas e psiquiátricas, perda da fé em Deus, de humanidade e amor, como bem testemunham as frequentes cartas e testemunhos de cristãos LGBT.

Em todo o mundo, muitas lésbicas, gays e transgêneros vivem relações baseadas no amor, na fidelidade e na assistência recíproca. Assim como nas relações heterossexuais maduras, o amor é sobretudo uma experiência espiritual e depois também física. Infelizmente, por causa do preconceito e da desinformação, muitas pessoas associam o conceito de homossexualidade só ao amor físico.

Com referência à declaração de Vossa Santidade de dezembro de 2008 sobre a necessidade de proteger a humanidade como o ecossistema de uma floresta tropical, seguindo a mesma metáfora, podemos dizer que as pessoas LGBT representam uma espécie menos numerosa, mas que se encontra constantemente no ecossistema e, como sabemos, toda espécie é importante e necessária para garantir o equilíbrio criado por Deus.

Apelamos ao senhor para que reconsidere a posição da Igreja sobre as relações entre pessoas tanto do mesmo sexo, quanto transexuais, apoiando também a aceitação e a bênção dessas relações no interior da Igreja.

Apelamos a Vossa Santidade para que se cesse de pressionar os católicos a votarem contra leis que autorizem relações entre pessoas do mesmo sexo.

As relações tanto entre pessoas tanto do mesmo sexo, quanto transexuais, não constituem um perigo para a existência da família tradicional, mas, na realidade, sustentam e elevam os valores da família e do matrimônio. As pessoas LGBT representam só um pequeno percentual de toda a população, percentual que permanece constante.

A experiência de não aceitação dos jovens homossexuais e transgêneros, por parte de suas famílias e da Igreja, quase sempre gera problemas no desenvolvimento das suas personalidades. As consequências são muitas vezes dramáticas e podem se concretizar, por exemplo, em tentativas desesperadas de contrair matrimônios heterossexuais, em mascarar sua própria orientação sexual ou em escolher a vida religiosa, mesmo na ausência de vocação.

Das motivações que expusemos, deduz-se como o fato de criar uma atmosfera segura e acolhedora, que permita que as pessoas LGBT sejam elas mesmas, é importante para toda sociedade.

O Catecismo da Igreja Católica afirma que as pessoas homossexuais devem ser tratadas com respeito, compaixão e sensibilidade. Respeito e sensibilidade deveriam ser concedidos a todos, independentemente da orientação sexual ou da identidade de gênero. Se fosse verdadeiramente assim, a compaixão não seria necessária.

Os comportamentos e as opiniões homofóbicas são particularmente dolorosos quando feitos por quem se declara cristão, seja leigo ou religioso, e não são certamente uma forma de respeito.

Deus abençoe Vossa Santidade.

Berlim, 7 de maio de 2011

Diane Xuereb (Holanda/Malta)
Dr. Michael Brinkschröder (Alemanha)
(Copresidentes do Fórum Europeu dos Grupos de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros Cristãos, em nome dos grupos membros)

Grupos membros do Fórum Europeu dos Grupos Cristãos LGBT (em junho de 2011):
Armênia - We For Civil Equality NGO
Áustria - Homosexuelle und Glaube (HUG)
Bélgica - La Communauté du Christ Libérateur
Estônia - Geikristlaste Kogu (Associação de Gays Cristãos)
Finlândia - Arcus
França - Davi & Jônatas
Alemanha - AG (Arbeitsgemeinschaft) Schwule Theologie e.V. / Labrystheia, Netzwerk Lesbischen Theologinnen in und nach der Ausbildung / Lesben und Kirche (LuK) / Maria und Martha Netzwerk / Netzwerk Katholischer Lesben / Projekt Schwul und Katholisch in der Gemeinde Maria Hilf (PSK Maria Hilf Frankfurt) / Ökumenische Arbeitsgruppe Homosexuelle und Kirche (HuK)
Itália - Gruppo del Guado / Gionata / Gruppo Varco / Nuova Proposta
Letônia - Adverta Evangeliska Draudze/Congregação Evangélica Aberta
Malta - Drachma
Moldávia - HomoDiversus
Holanda - Landelijk KoördinatiePunt groepen kerk en homoseksualiteit (LKP) / Netwerk Mirre / Werkverband van Homotheologen (WHT) / Werkverband van Katholieke Homo-Pastores (WKHP) / Åpen Kirkegruppe / Wiara i Tęcza (Faith and Rainbow) / MCC Bucharest (Igreja Comunitária Metropolitana, Região 5)
Rússia - Light of the World (Moscou)
Eslováquia - Ganymedes
Espanha - Associació Cristiana de Gais i Lesbianes (ACGIL) / Federación Estatal de Lesbianas, Gays, Transexuales y Bisexuales - FELGBT)
Suécia - EKHO Sweden
Suíça - 'C+H' (The Lesbian and Gay Christian Group of Geneva) / CooL (Christliche Organisation von Lesben)
Lesbische und Schwule Basiskirche / Basel
Ucrânia - Church of St Cornelius
Reino Unido - Changing Attitude / Evangelical Fellowship for Lesbian and Gay Christians / Lesbian and Gay Clergy Consultation / Lesbian and Gay Christian Movement / Quest / Roman Catholic Caucus in the LGCM / Courage

A crise cristã

Instalação: Ryota Kuwakubo

...Para que nos espitualizemos, precisamos aprender a deixar para trás nossa própria identidade religiosa oficial, ou seja, deixar para trás o fariseu que se esconde em todos nós, porque, como Jesus nos disse, temos que deixar para trás toda a nossa identidade. Para que possamos nos tornar um com nós mesmos, com Deus, precisamos renunciar e transcender a todas as imagens de nós mesmos, todas elas originadas na mente febril do ego, para que nos tornemos verdadeiramente humanos, verdadeiramente reais, verdadeiramente humildes.

Nossas imagens de Deus, da mesma forma, deverão cair. Não podemos ser idólatras. Curiosamente, o que descobrimos é que elas caem, assim como caem as imagens de nossa identidade, o que sugere aquilo que nós já havíamos adivinhado, que nossas imagens de Deus são na verdade imagens de nós mesmos. Neste maravilhoso processo de entrada para toda a luz da Realidade, de afastamento da ilusão, um enorme silêncio emerge a partir do centro. Nos sentimos engolfados pelo eterno silêncio de Deus. Não estamos mais falando com Deus, ou pior, falando com nós mesmos. Estamos aprendendo a ser, a ser com Deus, a ser em Deus.

Na jornada espiritual, aquietar-se consome mais energia do que correr... A maioria das pessoas gasta tantas das suas horas de vigília correndo de uma coisa para outra, que acaba por temer a quietude e o silêncio. Podemos ser acometidos por um certo pânico existencial, quando encaramos a quietude pela primeira vez, quando pela primeira vez entramos nesse estado de puro ser. Todavia, uma vez que possamos reunir a coragem para encarar este silêncio, adentramos a paz que está além de toda compreensão.

Sem dúvida, será mais fácil aprender isso em uma sociedade equilibrada e estável. Em um mundo turbulento e confuso, há muito mais vozes mais enganadoras, tantos apelos à nossa atenção. No entanto, a visão cristã é intransigente em sua sanidade, sua rejeição ao extremismo, no convite que faz a cada um de nós no sentido de termos a coragem para nos tornarmos nós mesmos, e não apenas reagirmos a alguma imagem de nós mesmos que nos seja imposta de fora.

Em nossa experiência da meditação, o que cada um de nós deve aprender é que a energia para a peregrinação, de fato, está presente de modo inexaurível. Precisamos apenas de um passo de fé, para que possamos aprender isso a partir de nossa própria experiência. Aquilo que é importante lembrar é que um passo real, ainda que vacilante, tem mais valor do que qualquer número de viagens vividas na imaginação.

- John Main, OSB
Reproduzido via site da Comunidade Mundial de Meditação Cristã no Brasil, com grifos nossos.

Fonte: The present Christ (New York: Crossroad, 1991, pgs. 74-76).
Tradução de Roldano Giuntoli.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Jesus comigo

Ilustração: Grant Haffner

Se de Deus me despedi,
Jesus foi quem me ficou.
Escondido, mas ficou.
Não é sempre que se esconde:
comigo está no que sou.

Faz de conta que não me vê
quando resvalo em desvãos,
mas sinto que ele se alegra
quando amanheço cantando.
Jesus finge que se esconde.
A verdade é que ele vem
comigo desde que venho.
Demora muito sem dar
sinal de vida. Demoro
tanto a mostrar precisão
que ele me seja.
                      Aparece
inesperado no jeito
invisível que ele tem,
meio de anjo, de ser homem
como ele gosta de ser.

Sempre que chega, me chama
(prescindimos de palavras),
derrama estrelas no chão,
sai comigo pela mão,
vai me levando, para onde?
para onde vai me levando?,
não sei, só sei que com ele
me encontro comigo em paz,
no coração a esperança
de amar crescendo e, cantando,
sei que sou de novo criança.

- Thiago de Mello
In Num Campo de Margaridas, 1986

Via Mister MM

Igreja, com que mundo convives?


Das altas cátedras, os papas falam de casais e da convivência, e o mundo verdadeiro se encontra em um outro lugar.

A reportagem é de Marco Politi, publicada no jornal Il Fatto Quotidiano, 07-06-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto, aqui reproduzida via IHU, com grifos nossos.

Há uma distância sideral entre a Igreja doutrinária e a vida real de homens e mulheres, jovens e maduros, ao longo deste século XXI, a tal ponto de desencorajar até mesmo o debate.

Na Croácia, Bento XVI mais uma vez – assim como, antes dele, o Papa Wojtyla – condenou as convivências, associando-as à leveza inconsciente de quem "reduz o amor a emoção sentimental e a satisfação de pulsões instintivas, sem se comprometer a construir laços duradouros de pertença recíproca e sem abertura à vida". Paola Concia tem razão ao responder com uma piada: "Certo, deixemos que os casais gays se casem".

Porque a família que é descrita dos púlpitos não tem nenhum contato com o que acontece na sociedade. Deixemos estar as atitudes subjetivas e as embriaguezes passageiras. O nó de fundo é que desapareceu a velha instalação da família – da forma como se ergueu ainda até o final da Segunda Guerra Mundial – dos camponeses, dos operários, dos burgueses grandes e pequenos que se casavam entre os 20 e os 30 anos. Que tinham diante de si os trilhos de perspectivas substancialmente estáveis, comuns, sem grandes choques culturais.

Essa família não existe mais. O que a Igreja-instituição é capaz de dizer aos jovens homens e mulheres que conseguem criar uma vida economicamente mais ou menos "sistematizada" (e muitas vezes menos do que mais) no final dos 30 anos senão em torno aos 40 anos? O que eles deveriam fazer nas duas décadas de intervalo entre a puberdade e o matrimônio ou a convivência? "Pecar" solitariamente ou em dois, correndo depois para o confessionário... esperar o príncipe encantado e a rainha dos sonhos?

Há um falar abstrato dos púlpitos que fecha os olhos diante da realidade, em nada composta na sua grande maioria por "pecadores" ou hedonistas, mas sim por homens e mulheres que buscam o seu próprio caminho. E consideram positivas as relações pré-matrimoniais, pôr-se à prova, experimentar a proximidade dos corpos e dos temperamentos, porque não faz sentido embarcar em naufrágios.

O velho modelo já não se mantinha em pé nas almas mais virtuosas, mas no mero fato da subordinação da mulher, que, tendo uma vez entrado na estrutura do matrimônio, "ali ficava", enquanto o homem continuava sentindo que sua própria liberdade estava garantida.

Não é mais assim. O divórcio foi assumido por centenas de milhões de pessoas – totalmente pacatas, equilibradas, não consumistas – como um dado de valor. E justamente. O desvalor é o fracasso de um laço, o fim de um projeto, a deterioração de uma vida juntos. Não a responsabilização pelo fim. Dissolver uma relação quando não há mais "comunhão" e comunicação é positivo, libertador, vivificador.

Vive-se juntos de muitos modos hoje. Formam-se casais heterossexuais ou gays fortemente solidários, que aceitam também a perspectiva de que, um dia, os caminhos podem se separar. Porque cresceram com ritmos diferentes, porque não se compartilha mais o mesmo projeto.

Casa-se, separa-se, convive-se, vive-se sozinho, casa-se novamente, vive-se em casas separadas. O antigo modelo não existe mais. Há muito tempo. Não é o sinal de um arbítrio desenfreado. É o produto de uma sociedade que torna todos mais mononucleares. Uma sociedade marcada fortemente também pela incerteza econômica. Uma sociedade mais móvel, mais líquida.

Quando o cardeal Bagnasco descreve a juventude italiana como "geração não ouvida", sem futuro – captando a angústia decorrente da perene precariedade –, é preciso depois entender (como fazem os párocos há décadas) que ruiu o contexto em que casais esperançosos se aproximavam do altar ou iam ao cartórios assim que completavam 20 anos.

Isso quer dizer que a Igreja não tem mais espaço para transmitir valores evangélicos nas relações entre homem e mulher, entre pessoa e pessoa, entre pais e filhos? Não, absolutamente. Ela tem muito a dizer a respeito: a ternura, o amor, o perdão, o carinho, a paciência, o esforço, a solidariedade, o sacrifício, a partilha, a responsabilidade. Tudo isso que concerne ao núcleo daquele mandamento atemporal que diz: "Ama o teu próximo como a ti mesmo". Porque, como explicam os exegetas, somente reconhecendo o Outro semelhante a mim, eu e nós podemos viver em paz, em serenidade.

E muito, naturalmente, pode vir de uma mensagem religiosa para a dimensão educativa, aquele mundo complicado, fascinante, sempre a ser explorado, em que os pais fazem com que os filhos cresçam de modo que sejam maduros e independentes.

Mas, para reencontrar a escuta das novas (e nem tão novas) gerações, a Igreja deveria abandonar a obsessão de controlar o território da sexualidade e das relações interpessoais, como ocorreu nos séculos passados. Essa época não voltará mais. Os jovens que louvavam Wojtyla no jubileu de Tor Vergata, depois, debaixo das barracas, felizes, faziam amor.

Se, depois, o uso das palavras papais deve servir para perpetuar o veto a uma legislação sobre os casais de fato, é hora de dizer basta àqueles políticos que, legitimamente, vivem suas próprias vidas e depois pretendem – entre um sinal da cruz e outro – enjaular com vetos as existências alheias.

O ponto rosa


O Pink Dot é um movimento de conscientização contra a homofobia que rola em Cingapura, com uma edição programada para o dia 18 de junho. Em tempos em que a homofobia está quase que diariamente no noticiário aqui no Brasil, especialmente por conta da inabilidade de muitos para tratar do tema, eles produziram um vídeo que serve de exemplo de como é possível tratar do assunto sem sensacionalismo e preconceito.

- Linda dica do Juliano Acioly, via Facebook

Ele é o único Mestre


A situação que se vive hoje nas nossas comunidades cristãs não é nada fácil. No nosso coração de seguidores de Jesus surge não poucas perguntas: onde reafirmar a nossa fé nestes tempos de crise religiosa? O que é o importante nestes momentos? Que temos de fazer nas comunidades de Jesus? Para onde temos de orientar os nossos esforços?

Mateus conclui o seu relato evangélico com um episódio de importância excepcional. Jesus convoca pela última vez os Seus discípulos para confiar-lhes a sua missão. São as últimas palavras que escutarão de Jesus: as que hão de orientar a sua tarefa e sustentar a sua fé ao longo dos séculos.

Seguindo as indicações das mulheres, os discípulos reúnem-se na Galileia. Ali tinha-se iniciado a sua amizade com Jesus. Ali se tinha comprometido a segui-Lo colaborando no seu projecto do reino de Deus. Agora vêm sem saber o que poderão encontrar. Voltarão a encontrar-se com Jesus depois da Sua execução?

O encontro com o Ressuscitado não é fácil. Ao ve-Lo chegar, os discípulos «prostram-se» ante Ele; reconhecem em Jesus algo novo; querem acreditar, mas «alguns vacilam». O grupo move-se entre a confiança e a tristeza. Adoram-no mas não estão livres de dúvidas e insegurança. Os cristãos de hoje entendem-nos. A nós sucede-nos o mesmo.

O admirável é que Jesus não lhes reprova nada. Conhece-os desde que os chamou a seguirem-No. A sua fé continua a ser pequena, mas apesar das suas dúvidas e vacilações, confia neles. Desde essa fé pequena e frágil anunciaram a sua mensagem ao mundo inteiro. Assim saberão acolher e compreender a quem ao longo dos séculos viverão uma fé vacilante. Jesus os sustentará a todos.

A tarefa fundamental que lhes confia é clara: «fazei discípulos» vossos em todos os povos. Não os envia propriamente a expor doutrina, mas a trabalhar para que no mundo haja homens e mulheres que vivam como discípulos e discípulas de Jesus. Seguidores que aprendam a viver como Ele. Que O acolham como Mestre e não deixem nunca de aprender a ser livres, justos, solidários, construtores de um mundo mais humano.

Mateus entende a comunidade cristã como uma "escola de Jesus". Seremos muitos ou poucos. Entre nós haverá crentes convencidos e crentes vacilantes. Cada vez será mais difícil atender a tudo como quisermos. O importante será que entre nós se possa aprender a viver com o estilo de Jesus. Ele é o nosso único Mestre. Os outros são todos irmãos que se ajudam e animam-se mutuamente a ser Seus discípulos.

- Jose Antonio Pagola
Reproduzido via Amai-vos, com grifos nossos.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Elogio de uma Igreja imperfeita


Pequena confidência recebida de um padre com muitos anos de ministério nas costas: "Estou cansado de ir ao encontro das pessoas com tantas respostas já prontas. Quero dedicar mais tempo à escuta".

A nota é do teólogo italiano Christian Albini, publicada em seu blog Sperare per Tutti, 16-04-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto, publicada aqui via IHU, com grifos nossos.

Não é a Igreja dos documentos e das estratégias pastorais. Não é a dos "vocês devem" e a dos "vocês podem". É uma Igreja empastada de humanidade, que amadurece uma sabedoria humilde na escuta da vida e da Palavra de Deus.

Não faz proclamações, mas se faz sinal. Simplesmente depondo-se como presença discreta no limiar do outro, sem invadi-lo. Uma presença gratuita, porque não pede nada em troca; disponível, porque se deixa encontrar quando o outro tem necessidade; respeitosa, porque se propõe sem se impôr.

Conheci padres e leigos imóveis, fechados na couraça das suas certezas. Sou contra o clericalismo que eleva em pedestais as pessoas que vestem paramentos sagrados. Tenho outros conhecidos que se deixaram mudar a partir da imersão na humanidade, dia após dia, aprendendo a ler o evangelho dentro da vida.

Prefiro as pessoas imperfeitas, que erram, que são conscientes disso e admitem seus próprios limites. Concordo com o que o Pe. Luigi Pozzoli escreveu ao cardeal Tettamanzi, no seu ingresso em Milão, ele que havia sido seu companheiro de seminário. É um padre que tem esse estilo, e me parece que o arcebispo de Milão, em seus anos de episcopado, foi capaz de ir nessa direção:


Imaginando-me sempre como bispo (conceda-me essa fantasia, ingênua, como o senhor quiser, mas sem qualquer presunção), me preocuparia em transmitir uma palavra que restitua a confiança a tantas almas cansadas e desiludidas, porque não encontram nas nossas igrejas a oportunidade de cultivar uma fé livre, alegre, humanizadora, capaz de descerrar horizontes de grande, invencível esperança. [...]

É importante hoje apresentar a imagem de uma Igreja que tenha finalmente se libertado de tantos fardos do passado (ritualismos, juridicismos, medos, diplomacias excessivas, preocupações de tipo mundano...) e tenha se libertado, ao contrário, o espaço onde se possa entrar em uma comunhão amorosa com o universo, com a existência, com o mistério de Deus. Como 'epìskopos' (na Igreja primitiva, aquele que cuida da comunidade), não me preocuparei em buscar uma resposta para todos os problemas de ordem moral (o cristianismo não é primariamente uma moral), mas sim em ser testemunha de uma fé que tem uma conotação mística, isto é, que se alimenta do indizível estupor ao sentir-se amada por Deus, por pura graça, com uma ternura que precede qualquer mérito possível.

É um Deus, o de Jesus, que sempre se coloca do lado do homem, sobretudo do homem fraco que anseia por um possível resgate.

Falarei, por isso, frequentemente, da maravilhosa liberdade que se respira no Evangelho, do valor da pessoa que vem antes de todo princípio e de toda norma moral ("o sábado é para o homem, não o homem para o sábado"), da consciência madura como critério último de juízo no agir. Falarei sobretudo do amor fraterno como resposta generosa e alegre ao amor de Deus, amor que deve privilegiar os pequenos do Evangelho (os grandes, aqueles que contam, obtêm os privilégios sozinhos).

terça-feira, 7 de junho de 2011

''Caro Santo Padre, diga algo contra a homofobia''

Foto via IHU

"Santo Padre, o silêncio de Vossa Santidade é muitas vezes interpretado pelas pessoas que cometem atos de violência, tortura e assassinato como um parecer favorável às suas ações... Assim como as passagens em favor da escravidão, os versículos da Bíblia que apoiam o assassinato de pessoas que praticam atividades sexuais com pessoas do mesmo sexo não devem ser interpretadas literalmente".

A reportagem é de Delia Vaccarello, publicada no jornal L'Unità, 06-06-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto, aqui reproduzida via IHU com grifos nossos.

O Fórum Europeu dos grupos cristãos de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros (que conta com 44 entidades dos 23 países) vai enviar, no dia 10 de junho, uma carta ao papa (atualização em 11/6: publicamos a carta na íntegra aqui). A mensagem de fundo é clara, libertadora, daquelas sobre as quais se pode construir uma mudança. Os fiéis cristãos se recusam a serem considerados contra a natureza, merecedores de tratamento e indignos de compaixão. São pessoas que têm o direito à felicidade e sabem "dar o melhor de si no trabalho e no apoio aos outros".

Com a carta, pede-se um posicionamento claro contra a homofobia, uma condenação dos atos de violência (como o assassinato do ugandense Kato), a colaboração para a descriminalização dos atos homossexuais em nível mundial.

Novo ar dentro da Igreja Católica, como testemunha o próprio Fórum, que aprovou o texto da carta no final de maio para enviá-lo no dia 10 de junho, em Roma, por ocasião da conferência organizada pela Nuova Proposta [associação de leigos/as cristãos/ãs homossexuais] dentro do EuroPride, intitulada: "As pessoas homossexuais e transexuais e as Igrejas cristãs na Europa". Entre os relatores da manifestação estarão John McNeil, um dos padres fundadores da teologia gay, excluído da ordem dos jesuítas por sua defesa da homossexualidade.

Com essa carta ao papa, os cristãos passam de vítimas de medo e de desespero – por serem excluídas e muitas vezes condenadas – a pessoas que têm a coragem de romper o silêncio. Entre os pontos fundamentais, indicam com clareza a Bento XVI os danos provocados pelas terapias reparativas: "Ainda existe uma forma de pressão por parte de alguns expoentes do clero da Igreja Católica Romana sobre os cristãos LGBT para que se submetam a 'terapias reparativas' para modificar o sua própria orientação sexual. Essa estratégia da Igreja e o pedido às pessoas LGBT para viverem a condição da castidade são causa de muitas tragédias, incluindo suicídios e graves estados de depressão, entre quem tenta observar e seguir heroicamente os ensinamentos da Igreja".

O pedido é claro: "Vossa Santidade, que não se dê mais como indicação que as pessoas homossexuais devem se submeter a terapias, mas sim que tenham direito a uma vida que preveja também uma relação afetiva sob o signo da fidelidade".

Como o papa irá responder? O texto não é daqueles que possam cair no vazio. O papa sabe que algumas dioceses começaram uma pastoral de acolhida para os grupos gays? Não chegou do alto nenhuma de ordem para parar: isso significa que está sendo dada autonomia aos bispos sobre o assunto? Se o povo católico vir, nas Igrejas, lésbicas e gays ativos como todos os outros, o efeito será a dissolução de parte dos preconceitos.

São muitas as novidades a respeito de homossexualidade e fé em cena na EuroPride: no Pride Park da Piazza Vittorio, a mostra fotográfica "My spirituality, volti e anime di persone glbt cristiane", com fotos de Luca Lo Iacono e textos de Andrea Rubera. Na parada, participarão pela primeira vez, reunidos por trás da mesma bandeira, mais de 40 grupos e associações de cristãos homossexuais, católicos e evangélicos, provenientes da Itália, Alemanha, Espanha, Noruega, França, Inglaterra e do resto da Europa. O papa não poderá ignorar seus rostos e suas palavras.

Por que ficais aqui, parados, a olhar para o céu?


Após ressuscitar dos mortos e aparecer para seus discípulos, Jesus elevou-se aos céus em um monte na Galiléia sob a vista deles. A priori, os relatos da Ascensão do Senhor podem nos parecer tristes pois nos remetem à despedida de alguém querido que parte para um local distante. Ainda que Ele tivesse deixado a promessa da chegada do Espírito Santo, é possível que a tristeza tenha tomado os corações dos seus discípulos diante da perspectiva de não verem mais o Mestre, muito provavelmente por não conseguirem compreender muito bem o que significaria o que significava o envio do Espírito.

Gostaria, porém, de destacar dois pontos específicos dos relatos evangélicos da Ascensão do Senhor.

Um primeiro ponto é o envio. Na narrativa de Mateus e Marcos, Jesus envia seus discípulos a trabalhar pelo reino: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai o evangelho a toda criatura!” (Mt 28, 19 e Mc 16, 15). Este envio é o sinal de que é chegado o tempo daqueles que receberam a palavra de Deus concretizarem o Evangelho através de suas ações e obras. O outro ponto está no relato extraído do livro dos Atos dos Apóstolos. Dois homens de branco interpelam aquele grupo que estava a olhar para o céu, como que os desinstalando de uma apatia motivada pela maravilha de ver um homem ascender aos céus por suas próprias forças. A pergunta que lhes é feita deve também nos questionar hoje: “Homens da Galiléia, por que ficais aqui, parados, a olhar para o céu?” (At 1, 11). Quisera que todas as vezes em que o comodismo nos paralisar possamos ter alguém ou algo que nos pergunte: por que estás parado? Por que não vais adiante? Não vês que agora é chegada a tua hora de fazer algo pelo Reino de Deus, pelo próximo, por teu irmão? Ambos se completam: Jesus exorta os discípulos a irem anunciar, enquanto que a fala dos homens pode nos soar bastante próxima: o que fazem vocês ainda hoje, olhando para o céu? Vão, e anunciem também!

Jesus nos dá que permanecerá conosco até os fins dos tempos. Ele não diz que ficará conosco até amanhã ou até um outro determinado dia ou ano, mas até o fim dos tempos, que para Deus é eterno. Ele não nos abandonará nunca, seja em nesta vida ou já na vida gloriosa junto ao Pai. Posteriormente, esta certeza será solidificada pela vinda do Espírito Santo em Pentecostes, que fortalecerá a fé daqueles primeiros apóstolos e cuja presença perdurará ao longo da vida da Igreja até chegar aos nossos dias. É esta certeza que o cristão deve guardar em seu coração: Jesus está conosco hoje, amanhã e para sempre. Não importa a situação: ele vibra com nossas conquistas e chora nossos sofrimentos! É a Sua mão que nos estende em cada momento de nossas vidas, o Seu manto que nos cobre, a Sua misericórdia que nos acolhe sempre.

Portanto, a Ascensão não é sinal de tristeza porque o Ressuscitado se vai de nossa presença, mas antes, sinal de celebração da certeza de Sua presença junto a cada um de nós e da força da missão pessoal a qual Ele nos remete. Não fiquemos, pois, parados, a olhar para o céu: sejamos, sim, cristãos de forte testemunho, de olhar no futuro e naquilo que podemos transformar para fazer florescer entre nós a justiça e a paz.

Textos para sua reflexão:
- Gilda Carvalho
Reproduzido via Amai-vos, com grifos nossos.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

O encontro da realidade da fé e da razão permite que o ser humano encontre a si mesmo


O diálogo entre crentes e não crentes, promovido pelo Pontifício Conselho para a Cultura, é uma iniciativa que parte da idéia de que o Deus conhecido na fé é sempre um Deus misterioso, e seus adoradores não se sentem de fato longe daqueles que procuram realmente um Deus desconhecido. www.atriumgentium.org é o endereço web que se encontra em construção, tal como o projeto ao qual serve. O papa Bento XVI sugeriu em 21 de dezembro de 2009 a necessidade de “criar um espaço de diálogo com aqueles para quem a religião é algo estranho, para quem Deus é desconhecido e que, apesar disso, não gostariam de estar simplesmente sem ele, mas sentindo-o pelo menos como desconhecido”.

A EXPERIÊNCIA DE TAIZÉ
Desconhecendo a convocação, minha esposa Virgínia, minha filha Ana e eu aproveitamos a passagem por Paris para participar de um encontro de Taizé, anunciado em Notre-Dame, esperando uma experiência de diálogo entre membros de diferentes Igrejas cristãs na oração.

Caminhar a Notre-Dame de Paris para um argentino é uma mistura de turismo e devoção (...). À minha direita, um homem que cruza a porta, ajoelha-se e beija o chão, não deixa lugar a dúvidas sobre o sentido de nossa visita. No entanto, deve-se evitar o movimento de turistas no circuito perfeitamente estabelecido pelas galerias laterais, para consolidar a opção.

Uma vez na nave principal, sua altura, a multiforme luminosidade de seus vitrais e uma estrutura sustentada por colunas que se elevam, parecendo grupos de mãos que se unem em oração, suaviza os sentidos, aquieta as paixões e, no princípio, alerta a razão. Um coro perfeitamente colocado depois do altar, presente (identificável até no vestir) mas não protagonista, indica-nos que a missa vai começar. Na procissão em primeiro lugar vai a Palavra, as luzes, o turíbulo, os celebrantes e acólitos. Um grupo de monges, jovens em sua maioria, cujo hábito se assemelha ao dos cistercienses, se coloca à direita do altar. Irmão Alois, prior de Taizé, os acompanha, sucessor do venerado fundador, tristemente assassinado como tantos atores da paz, Irmão Roger. O Evangelho é lido em francês e inglês e depois uns versículos escolhidos são reiterados uma e outra vez em diferentes idiomas, o espanhol entre eles. O sermão a cargo do cardeal italiano Gianfranco Ravasi é em francês, a consagração e a comunhão vão acompanhadas pela linguagem universal dos gestos cuidadosamente cumpridos. No momento da bênção, é como se o tempo tivesse parado, não foi muito nem pouco, simplesmente estivemos dentro de nós mesmos, fora do tempo.

O PRESENTE ESPERADO
Depois da bênção, retira-se a maioria, nós e poucos curiosos ficamos no fundo, porque parece que poderia acontecer algo… um grupo de jovens de camiseta e jeans retira todas as cadeiras da nave principal, estende tapetes, coloca em ambos os lados do altar um ícone do Crucificado e outro de Pedro e Paulo. Sobre o altar uma tela suspensa, de onde este segundo ícone presidirá a celebração.

Pequenas velas acesas no altar, nas grades laterais e no chão. Os monges se ajoelham num retângulo diante do altar, sob o cruzeiro. Há uns “banquinhos” para facilitar os tempos prolongados ajoelhados (...).

Alguém nos convida a ir para frente, em três oportunidades, até que ficamos na primeira fila junto a eles; abrem-se as portas e um bom número de jovens ocupa toda a nave central e outros as laterais. Há entre eles religiosas católicas e clérigos de diferentes confissões cristãs, dois cardeais, quatro bispos e vários monsenhores.

De algum modo fica em nossas mãos uma xerocópia prolixa com os cantos e leituras do dia e uma vela fina. O cardeal Gianfranco Ravasi nos dá formalmente as boas-vindas.

Vão-se acendendo as luzes e começamos a cantar breves antífonas em diferentes idiomas que se repetem uma e outra vez num clima de recolhimento (“The Kingdom of God”, “Laudate omnes gentes”, “Psaume 130”). Proclama-se lenta e claramente a Palavra (Mt 5, 1-10), fazemo-nos eco dela com cantos breves, muitas vezes reiterados, entre a leitura em diferentes idiomas do versículo: “Bem aventurados os que procuram a paz, pois eles serão chamados filhos de Deus”. Canta-se “Nada te perturbe”, e novamente há um silêncio para a viagem interior.

O PRESENTE INESPERADO
Logo vem: a oração de petição e de intercessão, os cantos, a meditação de Irmão Alois, o canto do Magnificat e a surpresa de ver na tela gigante o papa Bento XVI. Transmite seu convite para abrir na Igreja vários pátios dos gentios, uma imagem que evoca o espaço aberto na esplanada junto ao templo de Jerusalém, que permitia a todos os que não compartilhavam a fé de Israel aproximar-se do templo e interrogar-se sobre a religião.

Bento XVI destaca que um motivo fundamental deste átrio é promover a fraternidade, além das convicções, sem negar as diferenças. Ao terminar, os irmãos giram sobre suas costas e o ícone do Crucificado é reclinado no centro, e enquanto os cantos acompanham, cada um pode aproximar-se e beijá-lo; muitos fazem isso de joelhos. Quando saímos já é de noite, passaram quase duas horas sem que nos déssemos conta (...).

Já é de noite e a brisa nos refresca, enquanto nossos olhos se assombram com o que vêem… lá fora há tantos como dentro, ou talvez mais. Embora tudo esteja conectado: na praça diante da catedral duas telas gigantes apresentam, com a dinâmica de um show televisivo, diferentes pessoas que explicam suas crenças e convidam os grupos de diálogo que estiveram celebrando entre crentes e não crentes em pequenas carpas laterais, enquanto nós rezávamos por eles. Alguém nos oferece um sorriso e um chá quente. Com o calor de nossa Igreja no coração e no estômago, fomos para casa.

O pátio dos gentios começou a caminhar na direção do Reino. Houve uma apresentação prévia em Bolonha. Mas a primeira sessão propriamente dita, a inaugural, foi celebrada em Paris. Foi escolhida pelo cardeal Ravasi, devido ao simbolismo da Cidade das Luzes. A Ilustração, a laicidade positiva, a liberdade, a independência entre Igreja e Estado. As diferentes sessões foram realizadas em lugares significativos; a sede da UNESCO, a Universidade de Sorbonne, a catedral de Notre-Dame.

As palavras do Papa continuam repercutindo. “No coração da Cidade das Luzes, diante desta magnífica obra-prima da cultura religiosa francesa, Notre-Dame de Paris, abre-se um grande átrio para dar um novo impulso ao encontro respeitoso e amistoso entre pessoas de convicções diferentes. Vocês, jovens, crentes e não crentes, tal como na vida cotidiana, nesta noite querem estar juntos para reunirem-se e falarem das grandes interrogações da existência humana (…) Estou profundamente convencido de que o encontro entre a realidade da fé e da razão permite que o ser humano encontre a si mesmo”.

- Reproduzido via Amai-vos. Grifos nossos.

A Ascensão e o nascimento para a eternidade aqui e agora

Ilustração: Albulena Panduri

Em tempos de celebração da Ascensão do Senhor, nosso amigo Teleny mais uma vez vem em nosso auxílio com suas palavras lúcidas e precisas:

Todos sabem que uma das principais características do parto normal bem-sucedido é a posição correta do bebê no útero materno. Na linguagem dos médicos fala-se de apresentação cefálica, ou seja, quando a criança nasce de cabeça. Quem deu à luz ou, ao menos, assistiu uma cena dessas, lembra-se daquela voz animada do médico que, em algum momento disse: “Já estou vendo a cabeça! Daqui a pouco vem o resto!”.

Hoje, na liturgia da Ascensão do Senhor, ouvimos a conhecida expressão sobre Cristo que é a Cabeça da Igreja: "[Deus] pôs tudo sob seus pés e fez dele, que está acima de tudo, a Cabeça da Igreja" (Ef 1, 22); "Ele, nossa cabeça e princípio, subiu aos céus, não para afastar-se de nossa humanidade, mas para dar-nos a certeza de que nos conduzirá à glória da imortalidade" (Prefácio da Ascensão do Senhor I). É nos textos de Paulo Apóstolo que encontramos essa simbologia, por exemplo: "vivendo segundo a verdade, no amor, cresceremos sob todos os aspectos em relação a Cristo, que é a cabeça" (Ef 4, 15); "Ele é a Cabeça do corpo, que é a Igreja" (Col 1, 18). Na I Carta aos Coríntios encontramos a alegoria da Igreja, revelada na imagem de um corpo: "Como o corpo é um, embora tenha muitos membros, e como todos os membros do corpo, embora sejam muitos, formam um só corpo, assim também acontece com Cristo" (1Cor 12, 12). Lembrando, ainda, outra frase de Paulo: "sabemos que toda a criação, até o presente, está gemendo como que em dores de parto" (Rm 8,22), o mistério da Ascensão do Senhor ganha um novo sentido. Podemos dizer assim: a nossa existência no mundo é como a gestação, na qual preparamo-nos para uma vida plena na eternidade. [Que, como vimos por exemplo aqui, não é uma eternidade para depois, no "final dos tempos", mas presente na nossa própria história, aqui e agora.]

Quando (um dia que só Deus sabe) saímos daqui, somos como um bebê que sai do ventre materno. No contexto da fé cristã, isso se refere, em primeiro lugar, às pessoas unidas pelo batismo e pela fé, mas também à humanidade inteira. Neste contexto podemos recorrer à doutrina do Concílio Vaticano II que fala sobre a Igreja que, de diversas maneiras, engloba todos os seres humanos: "Todos os homens são chamados a esta unidade católica do Povo de Deus, a qual anuncia e promove a paz universal; a ela pertencem, de vários modos, ou a ela se ordenam, quer os católicos quer os outros que acreditam em Cristo quer, finalmente, todos os homens em geral, pela graça de Deus chamados à salvação". (Lumen gentium, n° 13 [leia aqui esta Constituição dogmática, especialmente o capítulo II]).

Com muita simplicidade (talvez exagerada!), imagino o Pai do céu que, na hora da ascensão de Jesus, disse: “Já estou vendo a cabeça! Daqui a pouco vem o resto!”

Quero dizer que uma ideia dessas não é o assunto apenas para teólogos, mas implica consequências bastante concretas e práticas, importantes para o nosso dia-a-dia. Em primeiro lugar, abre diante dos nossos olhos a perspectiva da eternidade, revela o verdadeiro sentido da vida. Com ela aprendemos a amar, não desmoronamos no sofrimento e não desanimamos na hora de lutar. O outro nome dessa perspectiva da eternidade é a esperança. Pois bem, vou dizer mais, sobretudo para quem enxerga a eternidade como algo vago e distante e para quem considera o assunto uma bobagem. A visão da Igreja, enquanto o corpo de Cristo, compromete-nos seriamente já aqui e agora. Como? Vejamos, então, como o Apóstolo Paulo desenvolve o tema:

O corpo não é feito de um membro apenas, mas de muitos membros. Se o pé disser: “Eu não sou mão, portanto não pertenço ao corpo”, nem por isso deixa de pertencer ao corpo. E se o ouvido disser: “Eu não sou olho, portanto não pertenço ao corpo”, nem por isso deixará de pertencer ao corpo. Se o corpo todo fosse olho, onde estaria o ouvido? Se o corpo todo fosse ouvido, onde estaria o olfato? De fato, Deus dispôs os membros, e cada um deles, no corpo, conforme quis. (...) O olho não pode dizer à mão: “Não preciso de ti”, nem a cabeça dizer aos pés: “Não preciso de vós”. Se um membro sofre, todos os membros sofrem com ele; se um membro é honrado, todos os membros se regozijam com ele. (1Cor 12, 14-18. 21. 26)

Deu para perceber? Somos membros do mesmo corpo e é uma loucura desprezar a quem quer que seja só porque é diferente. A diversidade das partes do corpo é a sua riqueza. E, ainda que isso nem sempre fique tão claro, ou não tenha uma explicação suficiente, a verdade é que um membro precisa do outro. E isso vale especialmente para aqueles que assumem a fé cristã.

Nesta semana, aqui no Brasil, somos convidados a orar e trabalhar pela unidade dos cristãos. E quando tivermos superado mágoas, atipatias e animosidades mútuas, vamos pedir a Deus por todos os cristãos católicos, cristãos protestantes, cristãos ortodoxos e tantos outros mais. Por que não incluir aqui a prece pela aproximação entre cristãos heterossexuais e cristãos homossexuais? Vamos tentar dar este primeiro passo dentro do âmbito cristão para, depois, sair em direção à sociedade inteira e dizer: somos membros do mesmo corpo e eu preciso de você, assim como você precisa de mim...

- Teleny, em seu blog Retorno (G-A-Y)

domingo, 5 de junho de 2011

De hóspede a irmão


Hóspedes somos todos os seres humanos que cruzam e recruzam a face da terra. Neste "vale de lágrimas” ou neste deserto, seguimos dia a dia, mês a mês, ano a ano, procurando abrigo. Do berço ao túmulo, percorremos todos os caminhos na condição de forasteiros, irremediavelmente estrangeiros. Mas hóspede é de maneira particular aquele que bate à porta. Dependendo de quem está do lado de dentro, ele pode tornar-se um irmão ou um estranho. No primeiro caso, a casa se converte em uma tenda. Permanece aberta ao forasteiro. Ali, ele encontra um abrigo onde repousar, alimentar-se e recuperar suas forças, antes de retomar o caminho. Em sua viagem solitária, o hóspede transformou-se em irmão. Poderá retornar quando quiser: seu rosto, antes desconhecido, passou a ser familiar.

Quando a casa se fecha, porém, revelam-se bem nítidos e estreitos os limites entre os de dentro e os de fora. Uns e outros seguirão sendo estranhos, não raro destilando indiferença, para não falar de hostilidade e agressão. Os territórios estão definitiva e taxativamente estabelecidos. A porta, em lugar de comunicação, passa a ser vista como fronteira intransponível. Não há qualquer possibilidade de ultrapassar essa barreira, seja ela visível ou invisível. Muros altos, grades com lanças pontiagudas, vigias armados ou não, olhos eletrônicos, cães raivosos e todos os demais sistemas de segurança, hoje cada vez mais sofisticados e caros, defendem os "nossos” da ameaça que vem do exterior, do estrangeiro, do diferente, do outro. Resulta que toda casa ou se converte em tenda aberta ao viajante, ou está condenada a ser uma verdadeira fortaleza. E esta, ao longo da história, tem sido o túmulo de quem a habita.

O universo urbano, diferentemente do mundo rural, é cada vez mais marcado por essa atmosfera ambígua. Dinâmico e imprevisível, em contraposição à vida estática e hierarquizada do campo, a cidade abre as mais diversas perspectivas. Distintos idiomas, bandeiras, costumes, moedas, culturas e expressões lingüísticas aí se mesclam e se entrelaçam. O oxigênio que se respira no universo urbano tanto pode levar à liberdade quanto a outra forma de escravidão. Portas amplas e caminhos largos muitas vezes conduzem aos becos sem saída da droga, da violência, do crime, da prostituição, da exploração... E, inversamente, a porta estreita, ou o caminho pavimentado pelo código da ética, pode alargar-se a uma experiência inusitada de encontro e comunhão, a uma felicidade inesperada. No mundo rural, normalmente nascemos revestidos por uma série de convenções e relações que nos protegem contra as ameaças e as surpresas do novo. Já no mundo urbano, somos movidos, justamente, pela ânsia de novidades. A cada dia podemos desfrutar de experiências renovadas. Do nascimento à morte, trazemos a nudez exposta a todo tipo de variedade.

De fato, em toda cidade, seja ela de porte pequeno, médio ou grande, tropeçamos a todo o momento com forasteiros, com culturas, hábitos e rostos desconhecidos. Com maior razão ainda nas metrópoles ou megalópoles, marcadas por um cosmopolitismo crescente. Os fluxos migratórios, sempre mais intensos, diversificados e complexos, abrem o contexto histórico a novas formas de pluralismo cultural e religioso. Nesse território ambíguo, movediço e sempre minado, cada indivíduo constitui um átomo, cujas partículas giram em torno de si mesmo. É a chamada sociedade atomizada, onde os esforços e energias de cada um centram-se sobre os próprios interesses. As ligações de parentesco, de compadrio e de amizade, tão respeitadas e tradicionais na concepção do camponês, se "desmancham no ar” ao atingir as ondas do mar urbano, para usar a expressão de K. Marx no Manifesto comunista. O que nos remete à "modernidade líquida” de Z. Bauman.

Dessa atitude de estranheza frente a tudo e a todos, resulta com frequência o isolamento e a solidão. Se as multidões urbanas são formadas por seres desconhecidos, estes são igualmente ameaçadores. Com razão Sartre diz que "o outro é o inferno”. Facilmente nos tornamos caramujos, encerrados num casulo de revestimento impenetrável. Nesses imensos formigueiros humanos, corremos e nos estressamos o dia inteiro, de cá para lá e de lá para cá, com a pressa de quem foge de um perigo, ao mesmo tempo real e vago. Assim, diferentemente das formigas, permanecemos incomunicáveis. A nudez só poder expor-se diante do olhar que ama.

Nos ônibus, trens e metrôs; nas filas dos pronto-socorros ou hospitais; nos supermercados, restaurantes e serviços em geral, nas ruas, becos e praças... Instala-se uma disputa surda e muda por espaço e atenção. Solo propício para a formação de guetos, de grupos racistas, preconceituosos e discriminatórios, ou para as "tribos urbanas”, como lhes costumam chamar alguns estudiosos, em evidente desconsideração para com a vida e cultura indígena. Veneno e hostilidade fazem parte do cotidiano dessas "multidões solitárias”, diria David Riesman. Nos lugares públicos, defendemo-nos de toda sorte de comunicação. Até mesmo um olhar, inadvertidamente cruzado na rua ou no transporte público, pode significar uma ameaça ao direito de privacidade. O medo da invasão nos faz desviar imediatamente os olhos, como se eletrocutados por um choque. Cerramos todas as portas e janelas à curiosidade estranha.

Mas, em sua ambivalência costumeira, o ambiente urbano também engendra infinitas possibilidades de intercâmbio, de troca de experiências de confronto de valores e saberes. Se a casa é uma tenda, como no episódio dos discípulos de Emaús, abre-se sempre ao encontro (Lc 24, 23-35). Em semelhante caso, o convite – "fica conosco, Senhor, pois já é tarde e a noite vem chegando” – torna o forasteiro não apenas um hóspede, mas um anfitrião que, à mesa da partilha e da eucaristia, oferece pão e salvação. A cidade e cada um de seus cidadãos se revelam então terreno fértil à semente da evangelização. Da mesma forma que a terra ressequida anseia pela chuva, essas formigas humanas que habitam a cidade, verdadeiros desertos modernos, estão sedentas de água viva. Nesse solo hostil e estéril, a mensagem de Jesus Cristo tende a tornar-se semente fecunda em terreno novamente fértil.

É então que o outro – o hóspede – em lugar de "inferno” e de "problema”, se converte em oportunidade de encontro e reencontro. Se as autoridades políticas muitas vezes empreendem a "operação limpeza” para se verem livres dos imigrantes, para a Igreja não deve haver estrangeiros; somos todos irmãos, filhos do mesmo Pai. É o que mostra enfaticamente a vida e obra de J.B. Scalabrini, considerado "pai e apóstolo dos migrantes”. Segundo ele, "a migração amplia para o homem o conceito de pátria”. Ou ainda, "para o migrante a pátria é a terra que lhe dá o pão”. Na passagem do século XIX para o século XX, o bispo de Piacenza personificava um muito marcado por rápidas e profundas mudanças. Uma "agitação febril e uma sede de novidades”, como lembra a cara encíclica Rerum Novarum, do Papa Leão XIII, contemporâneo de Scalabrini, leva este a dar-se conta que o mundo andava depressa "e nós não podemos ficar para trás”. Daí a necessidade de adaptar-se à sociedade em constante movimento: "para tempos novos, novos organismos” de evangelização, conclui o bispo.

O fenômeno das migrações, mais abrangente hoje do que um século atrás, faz cruzar e recruzar povos e nações. No confronto dinâmico e aberto entre culturas diferentes, a identidade se faz, desfaz e refaz, numa circularidade recíproca e dialética. O outro, como alerta Levinás, "é o caminho para chegar a mim mesmo”, o cristal onde se espelha minha alma. Tem muito a comunicar "não apenas sobre si, mas também sobre mim”, complementa Gadamer. Por outro lado, a revolução dos transportes, das comunicações e da informática põe, a cada hora e a cada dia, numerosos hóspedes às nossas portas. Hóspedes que interpelam e exigem novas formas de convívio e relação.

Relação tanto mais forte, quando a transplantamos para o encontro com o totalmente Outro. "Já estou chegando e batendo à porta; quem ouvir minha voz e abrir, eu entro em sua casa e janto com ele, e ele comigo” (Ap 3,20). Novamente aqui, como no episódio bíblico do Carvalho de Mambré (Gn 18, 1-6), o outro/estranho/diferente procura romper fronteiras para tornar-se familiar. Se a porta se abre, o hóspede se converte em irmão e senta-se à mesa. Através do encontro pessoal com Deus, o Hóspede com letra maiúscula, vem habitar nossa tenda, oferecendo no altar da vida pão e salvação.

Nesse caminho místico de um povo hóspede e permanentemente a caminho, a espiritualidade ganha novo sabor. Se é verdade que aumenta o número de hóspedes ao nosso redor, não é menos certo que todos seguimos como hóspedes na vida terrestre, com o coração ansioso pela pátria definitiva. Nessa perspectiva espiritual, o encontro com o diferente abre a possibilidade do encontro com o Transcendente; ou ainda, o encontro com o outro pavimenta a estrada que leva à casa do totalmente Outro. Melhor ainda, "o verbo se faz carne”; isto é, o grande Hóspede desce ao encontro de minha casa e, nela, vem comer e morar comigo. Humaniza-se para que possamos divinizar a humanidade.

- Pe. Alfredo J. Gonçalves
Fonte: Amai-vos. Grifos nossos.

Jesus cura o amante do centurião

Foto: Paula

Nos tempos de Jesus, havia na Palestina dois tipos de soldados oficiais (deixando de lado os possíveis zelotas ou soldados-guerrilheiros ao serviço da libertação judia). Uns eram do exército romano propriamente dito, que dependiam do Procurador ou Prefeito (Pôncio Pilatos), que governava de um modo direto sobre a Judéia e a Samaria. Outros eram do rei-tetrarca Herodes Antipas, que governava sob a tutela romana na Galileia (e os do seu irmão Filipe, tetrarca de Itureia e Tracontide, do outro extremo da fronteira da Galileia).

O Prefeito romano contava com cerca de três mil soldados de infantaria e algumas centenas de cavalaria, aquartelados basicamente em Cesareia, que costumavam ser originários do ambiente pagão da Palestina e funcionavam como exército de ocupação. De qualquer maneira, não era frequente vê-los na rua o nas povoações, nem mesmo em Jerusalém, onde governava o Sumo Sacerdote e o seu conselho, com a ajuda de alguns milhares de «servos» ou soldados da guarda paramilitar do Templo. De qualquer modo, nos tempos de crise ou nas festividades, o Prefeito romano subia a Jerusalém e instalava-se na Fortaleza Antónia, junto ao templo, a partir de onde controlava o conjunto da cidade.

Provavelmente residia ali uma pequena coorte, ou destacamento militar, mas não se misturava na vida civil e religiosa da cidade.

O Rei (=Tetrarca) Herodes Antipas governava na Galileia, sob o controle de Roma, mas com uma grande autonomia. Tinha que proteger as fronteiras e manter a ordem dentro do seu território, pagando um tributo a Roma. Possuía os seus próprios soldados, organizados como os de Roma.

Em caso de necessidade, os soldados romanos tinham que ajudar os de Herodes e os de Herodes que ajudar os romanos. De acordo com este princípio, na Galiléia não existia um «exército de ocupação», nem mesmo um domínio directo de Roma, ainda que muitos «nacionalistas galileus», partidários de um estado israelita, considerassem Herodes como um usurpador e os seus soldados como um exército opressor. Por outro lado, é normal que os soldados de Herodes fossem também de origem pagã, como os de Pôncio Pilatos, ainda que pudessem também ser judeus.

A partir deste cenário há que entender algumas passagens do evangelho que falam da relação de Jesus e dos seus seguidores com soldados. O texto mais significativo é aquele onde se diz aos crentes que ultrapassem a atitude do «olho por olho e dente por dente», própria dos exércitos do mundo, para acrescentar: «Não resistam a quem lhes fizer mal. Se alguém te bater na face direita, apresenta-lhe também a outra… Se alguém te obrigar a levar alguma coisa até a um quilômetro de distância, acompanha-o dois quilómetros.» (Mt
5, 39-40).

Estas últimas palavras referem-se ao serviço obrigatório que as forças do exército (de Herodes ou de Pilatos) podiam impor sobre os súditos judeus: obrigá-los a levar certo peso ou carregamento ao longo de um quilômetro. Pois bem, em vez de pregar a insurreição ou o protesto violento, Jesus pede aos ouvintes que respondam de modo amistoso à possível violência dos soldados. Jesus não condena os soldados imperiais: quer enfrentá-los perante o dom do reino, enriquecê-los com a graça do Pai que é bom para todos (cf. Mt 5, 45).

Com este pano de fundo, situa-se a sua relação com centurião que tem um amante doente e que pede a Jesus que o cure (Mt 8, 5-13). A cena foi elaborada pela tradição no contexto de abertura eclesial aos pagãos, mas no seu âmago há um relato antigo (cf. Lc 7,1-10; Jo 4, 46b-54). Jesus não satanizou os soldados, nem pretendeu combate -los com as armas, mas descobriu neles um tipo de fé que não se exprime através da vitória militar, mas na cura do amigo doente:

Quando Jesus entrava em Cafarnaum, acercou-se dele um centurião, que lhe rogava dizendo: «Senhor, o meu amante (pais) está prostrado em casa, paralítico, gravemente doente». Jesus disse-lhe: «Eu irei e curá-lo-ei». Mas o centurião disse-lhe: «Senhor, não sou digno que entreis em minha morada, mas dizei uma palavra e o meu servo sarará, pois também eu sou homem com autoridade e tenho soldados sob o meu comando e digo a este «vai» e ele vai e àquele «vem» e ele vem; e ao meu servo «faz isto» e ele fá-lo». Ao ouvi-lo, Jesus maravilhou-se e disse aos que o seguiam: «Em verdade vos digo, que nem mesmo em Israel encontrei tamanha fé. Digo-vos que virão muitos do oriente e do ocidente e sentar-se-ão com Abraão, Isaac e Jacob no reino dos céus; mas os filhos do reino serão deixados de fora, nas trevas; ali haverá choro e ranger de dentes». Então Jesus disse ao centurião: «Vai-te e que se faça segundo a tua fé». E o seu amante ficou curado naquele preciso momento (Mt 8, 5 -12).

Este era um soldado com problemas. É um profissional da ordem e obediência, no plano civil e militar, um homem acostumado a mandar e a ser obedecido. É capaz de, na batalha, dirigir os soldados, decidindo, deste modo, sobre a vida e sobre a morte dos homens. Mas, a outro nível, é muito vulnerável: sofre muito com a doença de um servo amante. Antes de prosseguirmos será preciso que nos detenhamos e perguntemos sobre a identidade deste pais do centurião, que traduzimos por «amante». A palavra «pais» pode ter três significados: servo, filho e amante (quase sempre jovem) e pode resultar escandalosa. O texto paralelo de Jo 4,46b evita o escândalo e coloca «huios» (filho), em vez de «pais»; mas com isto temos de mudar toda a cena, pois os soldados não costumavam viver com a família nem cuidar dos filhos até depois de se formarem. Por isso, o centurião aparece aqui como um membro da corte real de Herodes (um «basilikós»). Também Lc 7,2 pretende evitar as complicações e apresenta esse «pais» como «doulos», isto é, como um simples criado ao serviço do centurião. Com isto resolveu um problema, mas criou outro: é verosímil que um soldado queira tanto ao seu criado?

Por isso preferimos manter a tradução mais óbvia de «pais» dentro do seu contexto militar. Em princípio, o centurião poderia ser judeu, pois está ao serviço de Herodes, no posto fronteiriço do seu reino ou tetrarquia (Cafarnaum). Mas o conjunto do texto apresenta-o como um pagão que acredita no poder curador de Jesus, sem a necessidade de converter-se ao judaísmo (ou cristianismo). Pois bem, como era costume nos quartéis (onde os soldados não podiam conviver com uma esposa, nem ter família própria), este oficial tinha um criado-amante, presumivelmente mais jovem, que lhe servia de assistente e parceiro sexual. Este é o sentido mais verosímil da palavra «pais» de Mt 8, 6 no contexto militar. Certamente, em teoria, poderia ser um filho ou também um simples criado (como supõem os textos paralelos de João e Lucas). Mas o mais simples e normal é que tenha sido um amante homossexual, alguém a quem outros livros da Bíblia (talvez Rom 1,24-27) teriam condenado. Por isso, preferimos manter a tradução mais óbvia de «pais» dentro do seu contexto militar. Em princípio, graças a Deus, como sabemos pelo texto seguinte («Levou as nossas doenças…!: Mt 6,17), Jesus não era um moralista, mas um messias capaz de compreender o amor e debilidade dos homens (no caso do amor homossexual assim ser entendido). Jesus sabe escutar o soldado que lhe pede pelo seu amante e dispõe-se a ir até à sua casa-quartel para partilhar a sua dor e ajudá-lo. Teria ido, mas o oficial não quer que se arrisque, pois isso poderia causar-lhe problemas: não era bem visto ir ao quartel de um exército odiado para tratar com dois homossexuais. Por isso suplica-lhe que não vá: basta-lhe que acredite na sua dor e diga uma palavra, pois ele sabe o que vale a palavra. Jesus respeita as razões do oficial, aceita a sua fé e dá-lhe a sua palavra. O resto da história já se sabe: Jesus cura o servo-amigo homossexual e apresenta o seu amigo centurião como sinal de fé e de salvação, sem lhes dizer o que deveriam fazer na manhã seguinte. É evidente que não exige, nem quer, que rompam o seu amor, mas que o vivam na fé e no amor do Reino.

- Xavier Pikaza
Fonte: Ecos (Rumos Novos), set.2009, p. 2-3

Cada um proceda segundo sua convicção


1 Acolhei aquele que é fraco na fé, com bondade, sem discutir as suas opiniões.
2 Um crê poder comer de tudo; outro, que é fraco, só come legumes.
3 Quem come de tudo não despreze aquele que não come. Quem não come não julgue aquele que come, porque Deus o acolhe do mesmo modo.
4 Quem és tu, para julgares o servo de outros? Que esteja firme, ou caia, isto é lá com o seu senhor. Mas ele estará firme, porque poderoso é Deus para o sustentar.
5 Um faz distinção entre dia e dia; outro, porém, considera iguais todos os dias. Cada um proceda segundo sua convicção.
(...)
10 Por que julgas, então, o teu irmão? Ou por que desprezas o teu irmão? Todos temos que comparecer perante o tribunal de Deus.
11 Porque está escrito: Por minha vida, diz o Senhor, diante de mim se dobrará todo joelho, e toda língua dará glória a Deus (Is 45,23).
12 Assim, pois, cada um de nós dará conta de si mesmo a Deus.
13 Deixemos, pois, de nos julgar uns aos outros; antes, cuidai em não pôr um tropeço diante do vosso irmão ou dar-lhe ocasião de queda.
14 Sei, estou convencido no Senhor Jesus de que nenhuma coisa é impura em si mesma; somente o é para quem a considera impura.
15 Ora, se por uma questão de comida entristeces o teu irmão, já não vives segundo a caridade. Pela comida não causes a perdição daquele por quem Cristo morreu!
16 Não venha a tornar-se objeto de calúnia a tua vantagem.
17 O Reino de Deus não é comida nem bebida, mas justiça, paz e gozo no Espírito Santo.
18 Quem deste modo serve a Cristo, agrada a Deus e goza de estima dos homens.
19 Portanto, apliquemo-nos ao que contribui para a paz e para a mútua edificação.
20 Não destruas a obra de Deus por questão de comida. Todas as coisas, em verdade, são puras, mas o que é mau para um homem é o fato de comer provocando um escândalo.
21 Bom é não comer carne, nem beber vinho, nem outra coisa que para teu irmão possa ser uma ocasião de queda.
22 Tens uma convicção; guarda-a para ti mesmo, diante de Deus. Feliz é aquele que não se condena a si mesmo no ato a que se decide.
23 Mas, aquele que come apesar de suas dúvidas, condena-se, por não se guiar pela convicção. Tudo o que não procede da convicção é pecado.


- Romanos, 14.

(Precisa dizer mais alguma coisa?)
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