sábado, 24 de agosto de 2013

Líder cristão utiliza Grindr para recrutar jovens religiosos


Recentemente, o Scruff, aplicativo de celular que utiliza GPS para facilitar a pegação, adicionou uma nova categoria, a transexual, entre as identificações dos usuários. Porém, um novo comportamento pode mostrar uma tendência de subgrupo, os gays cristãos. Isso porque, nos Estados Unidos, um líder religioso tem usado o Grindr para encorajar outros religiosos homossexuais a saírem de vez do armário.
Michael James Alexander Szalapski comanda a igreja Metodista de Clarksville, Tennessee, e não curte pegação via smartphone. Ele disse, em entrevista ao documentário “South of Ohio”, que as únicas razões para usar o aplicativo são trazer mais religiosos para frequentarem a sua igreja e convencer outros gays de que “é possível ser homossexual e cristão”, contrariando aqueles que acreditam que Deus odeie os gays.
Durante a Jornada Mundial da Juventude, em julho de 2013, o Papa Francisco declarouque não tinha motivos para julgar os homossexuais. No mesmo período, algumas boates do Rio de Janeiro revelaram um aumento no número de frequentadores. Será que os jovens gays cristãos estão se sentindo mais confortáveis e saindo aos poucos do armário?

Peregrinos da Jornada Mundial da Juventude buscam refúgio no Brasil


RIO DE JANEIRO, Brasil, 22 de agosto de 2013 (ACNUR) – Peregrinos de diferentes países que vieram ao Brasil para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) estão solicitando refúgio às autoridades brasileiras. Entre as razões alegadas pelos solicitantes de refúgio estão perseguições sofridas por questões religiosas ou relacionadas a conflitos armados em seus países de origem. A JMJ aconteceu entre os dias 23 e 28 de julho e reuniu cerca de 03 milhões de pessoas no Rio de Janeiro.
Segundo dados coletados pelo Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR) junto à Caritas Arquidiocesana do Rio de Janeiro (CARJ), cerca de 40 solicitações de refúgio já foram feitas por peregrinos da JMJ. A Caritas Arquidiocesana de São Paulo (CASP) também tem recebido pedidos de refúgio por parte de peregrinos que participaram da JMJ. Até agora foram cinco casos. Entre os solicitantes estão nacionais do Paquistão, Serra Leoa e República Democrática do Congo.
Assim como todos os solicitantes de refúgio que chegam ao Brasil, os peregrinos da JMJ terão seus pedidos analisados pelo Comitê Nacional para Refugiados (CONARE), que funciona no âmbito do Ministério da Justiça. Para isso, terão de se apresentar à Polícia Federal e serão entrevistados por oficiais de elegibilidade do CONARE. Como de praxe, após avaliação individual o CONARE decidirá quais casos devem ser reconhecidos como refugiados.
No Rio de Janeiro, pelo menos 12 solicitantes relataram perseguições relacionadas a questões religiosas. “Meu pai foi morto por ser cristão, e sempre disse a minha mãe que isso poderia acontecer com nossa família. Sendo também cristão, a JMJ foi a única oportunidade que tive para conseguir um visto e sair do meu país”, disse ao ACNUR o jovem Peter Atuma (*), católico de 24 anos que vivia em Serra Leoa, no oeste da África. Seu corpo tem cicatrizes de ferimentos causados por grupos religiosos hostis aos cristãos da comunidade onde vivia. 
Ele já declarou à CARJ sua intenção de solicitar refúgio e tem agendada uma entrevista com a Polícia Federal no Rio de Janeiro para formalizar seu pedido. “Onde há paz, é possível viver tranquilamente”, completa Atuma, que deixou para trás sua mãe e oito irmãos vivendo em uma comunidade no norte de Serra Leoa. “Não tenho como voltar. Quero reconstruir minha vida aqui no Brasil”, diz Atuma, que tem formação na área de contabilidade.
Outro peregrino com entrevista já agendada na Polícia Federal para solicitar refúgio é o paquistanês cristão Imran Masih (*), que vivia ao sul de Islamabad com seus pais e quatro irmãos. Por causa da sua religião, teve problemas com as autoridades do país, foi discriminado na busca por um emprego e testemunhou perseguições e violência contra outros católicos de sua comunidade.
“Quando cheguei à JMJ, vi muitos católicos expressando sua fé sem problemas e convivendo com pessoas de outras religiões em paz. Todos nós somos criaturas de Deus e não podemos ser discriminados por causa do que acreditamos”, afirma Masih, que não se sente seguro para retornar ao seu país. Interessado em filosofia e teologia, ele quer iniciar estudos no Brasil para ser ordenado padre.
Os peregrinos solicitantes de refúgio no Rio já estão sendo assistidos pela CARJ, por voluntários ligados à Igreja Católica que participaram da JMJ e por autoridades municipais. Um grupo de cinco homens solteiros que alega perseguição religiosa foi acomodado em uma casa de passagem administrada pela CARJ e está se mantendo com doações da Igreja local e de fiéis, além de alimentos comprados pela Caritas. Outros seguem hospedados por voluntários da JMJ, devendo ser transferidos para uma residência provisória cedida por uma paróquia da cidade. Os demais solicitantes que alegam perseguições devido a conflitos armados, como é o caso dos cidadãos originários da República Democrática do Congo, estão sendo acolhidos tanto por voluntários da JMJ como pela própria comunidade de refugiados congoleses que vive no Rio de Janeiro.
A assistente social Aline Thuller, uma das coordenadoras do projeto de assistência e proteção a refugiados implementado pela CARJ, com apoio do ACNUR e do governo brasileiro, explica que a assistência financeira direta só poderá ser prestada quando os pedidos de refúgio forem formalizados. “Outros apoios, como aulas regulares de português e cursos profissionalizantes, também só poderão ser dados quando os peregrinos tiverem o protocolo da Polícia Federal confirmando seu pedido de refúgio”, afirma Thuller.
Os pedidos de refúgio feitos por peregrinos que participaram da Jornada Mundial da Juventude e alegam perseguição religiosa representam, de certa forma, um novo desafio para as autoridades brasileiras. “Não temos dados específicos sobre este tema, pois muitas vezes as questões religiosas se misturam com perseguições associadas a motivos políticos. Faremos um acompanhamento detalhado destes casos, pois o pedido de refúgio devido a questões religiosas é uma questão complexa de ser decidida, afirma o Representante do ACNUR no Brasil, Andrés Ramirez.
Ramirez ressalta que a Constituição do Brasil garante a livre expressão religiosa e determina a separação entre o Estado e as religiões. “Este é um componente de proteção importante para quem sofre perseguições religiosas”, afirma Ramirez.
Entre os peregrinos entrevistados pelo site do ACNUR, alguns comparam sua saga à de santos da Igreja Católica, que sofreram perseguições por causa da sua fé. “Muitos desses santos sofreram por anunciar as boas novas de Deus. Mas permaneceram firmes em sua fé” diz Asham Daniel (*), paquistanês de 24 anos. “Outros foram humilhados por reis e pessoas poderosas, mas reconstruíram suas vidas em outros países e puderam acolher suas famílias no exílio”, disse Atuma, de Serra Leoa.
O Brasil possui cerca de 4.200 refugiados reconhecidos pelo governo federal, originários de mais de 70 nacionalidades diferentes. Em 2013, cerca de 300 novos pedidos foram aceitos pelo Comitê Nacional para Refugiados (CONARE), sendo a maioria composta por refugiados originários da Síria, Colômbia e República Democrática do Congo.
(*) Nomes trocados a pedido dos entrevistados, por questões de segurança.
Por Luiz Fernando Godinho, do Rio de Janeiro. 
Por: ACNUR

Ele saiu do armário, eu entrei


Por muitas vezes a ficção imita a realidade. Em outros casos, ela ajuda os telespectadores a lidar com assuntos delicados que podem causar grandes traumas no seio de uma família. É o caso da novela Amor à Vida que está trazendo à tona a discussão sobre a homofobia dentro dos lares. Na trama, o César, personagem de Antonio Fagundes não recebeu bem a notícia que seu filho Félix, vivido por Mateus Solano, é gay. Ana Maria levanta a questão: o que um pai e uma mãe devem fazer quando um filho ou uma filha diz: “Eu sou gay”?
Para se ter uma ideia, só em 2012, a Secretaria Nacional de Direitos Humanos registrou quase 10 mil casos de violência homofóbica. Isso representa um crescimento de 166% em relação a 2011. Além da violência física, muitos homossexuais sofrem violência psicológica onde eles deveriam poder contar com maior apoio: dentro de casa.
Mais Você conversou com a dona Neusa Dutra, funcionária pública aposentada. Ela contou que desabou quando o filho de 19 anos assumiu que era gay.  “Eu quase bati o carro. Caiu como um raio. Fiquei trêmula, ainda bem que estávamos perto de casa. Catei uma garrafa de vodka, fui bebendo e ligando para todo mundo. Ligava para xingar algumas pessoas que andavam com ele. Achava que ele era um grande conquistador, tinha um monte de amigas, não enxergava que aquilo era um sinal”, relembra.
Após o desabafo, Neusa diz que fez o caminho inverso do filho. “Tomei um porre, chorei e aí, o que eu fiz? Entrei no armário. Ele saiu, eu entrei. Não falava uma palavra para ninguém, não falava mais dele. Eu pensava: droga você cura, interna. Gay não tem jeito. Então percebi que quem precisava de ajuda era eu”, conta.

Jovem expulso de casa quando se assumiu: ‘O filho dela não poderia ser gay’
A vida de dona Neusa mudou quando ela descobriu um grupo de apoio a pais de homossexuais que a ajudou a entender melhor a orientação sexual do filho. Esse grupo ajudou também o jovem Felipe, de 21 anos, que chegou a ser expulso de casa quando decidiu abrir o jogo com a família.  A mãe insistiu que aquilo iria passar. Algum tempo depois voltou ao tema com outro discurso. “Ela disse: ‘você para mim morreu no dia que você contou. Você foi um Judas.’ O filho dela não poderia ser gay, isso iria contaminar as filhas dela”.
Felipe fez a mochila e embarcou num período difícil. O refúgio foi na casa de amigos. Ele só podia aparecer em casa de vez em quando para ver as irmãs. Mas em uma dessas visitas, seis meses depois, ele e a mãe começaram a se reaproximar. O jovem já frequentava um grupo de jovens homossexuais e soube que havia outro, que reunia pais de adolescentes gays. Foi fundado por Edith Modesto, em 1997, uma época em que o assunto era ainda mais delicado. “Antigamente, nem o filho do vizinho podia ser gay. O gay tinha que estar bem longe. Hoje, o filho do vizinho já pode ser gay. O próprio, ainda não. Mas houve uma mudança positiva no sentido de aceitação das diferenças”, analisa Edith.
Com o apoio do grupo, tanto dona Neusa quanto Felipe conseguiram resgatar a harmonia familiar. “Ela já conheceu um companheiro que eu tive. Agiu de forma muito positiva”, contou o rapaz. Já Neusa, fez uma viagem em família. Ela, o filho e o companheiro dele com a mãe. Sem preconceito e com o amor revigorado. “Voltei a ser aquela mãe que exibe o filho para as amigas”.

FAZE DE MIM UM ARCO-ÍRIS


FAZE DE MIM UM ARCO-ÍRIS

que acolha todas as cores
em que se fragmenta
a Tua luz! 
Faze de mim, sempre mais, 
um arco-íris
que anuncie a bonança
depois das tempestades...

Dom Helder Câmara

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Carta aos Bispos do Brasil


CARTA AOS BISPOS DO BRASIL
15 de agosto de 2013, Festa da Assunção de Nossa Senhora.
Queridos irmãos no episcopado,
Somos três bispos eméritos que, de acordo com o ensinamento do Concílio Vaticano II, apesar de não sermos mais pastores de uma Igreja local, somos sempre participantes do Colégio episcopal, e junto com o Papa, nos sentimos responsáveis pela comunhão universal da Igreja Católica.
Alegrou-nos muito a eleição do Papa Francisco no pastoreio da Igreja, pelas suas mensagens de renovação e conversão, com seus seguidos apelos a uma maior simplicidade evangélica e maior zelo de amor pastoral por toda a Igreja. Tocou-nos também a sua recente visita ao Brasil, particularmente suas palavras aos jovens e aos bispos. Isso até nos trouxe a memória do histórico Pacto das Catacumbas.
Será que nós bispos nos damos conta do que, teologicamente, significa esse novo horizonte eclesial? No Brasil, em uma entrevista, o Papa recordou a famosa máxima medieval: “Ecclesia semper renovanda”.
Por pensar nessa nossa responsabilidade como bispos da Igreja Católica, nos permitimos esse gesto de confiança de lhes escrever essas reflexões, com um pedido fraterno para que desenvolvamos um maior diálogo a respeito.
1. A Teologia do Vaticano II sobre o ministério episcopal
O Decreto Christus Dominus dedica o 2º capítulo à relação entre bispo e Igreja Particular. Cada Diocese é apresentada como “porção do Povo de Deus” (não é mais apenas um território) e afirma que, “em cada Igreja local está e opera verdadeiramente a Igreja de Cristo, una, santa, católica e apostólica” (CD 11), pois toda Igreja local não é apenas um pedaço de Igreja ou filial do Vaticano, mas é verdadeiramente Igreja de Cristo e, assim a designa o Novo Testamento (LG 22). “Cada Igreja local é congregada pelo Espírito Santo, por meio do Evangelho, tem sua consistência própria no serviço da caridade, isto é, na missão de transformar o mundo e testemunhar o Reino de Deus. Essa missão é expressa na Eucaristia e nos sacramentos. Isso é vivido na comunhão com seu pastor, o bispo”.
Essa teologia situa o bispo não acima ou fora de sua Igreja, mas como cristão inserido no rebanho e com um ministério de serviço a seus irmãos. É a partir dessa inserção que cada bispo, local ou emérito, assim como os auxiliares e os que trabalham em funções pastorais sem dioceses,todos, enquanto portadores do dom recebido de Deus na ordenação são membros do Colégio Episcopal e responsáveis pela catolicidade da Igreja.
2. A sinodalidade necessária no século XXI
A organização do papado como estrutura monárquica centralizada foi instituída a partir do pontificado de Gregório VII, em 1078. Durante o 1º milênio do Cristianismo, o primado do bispo de Roma estava organizado de forma mais colegial e a Igreja toda era mais sinodal.
Concílio Vaticano II orientou a Igreja para a compreensão do episcopado como um ministério colegial. Essa inovação encontrou, durante o Concílio, a oposição de uma minoria inconformada. O assunto, na verdade, não foi suficientemente amarrado. Além disso, o Código de Direito Canônico, de 1983 e os documentos emanados pelo Vaticano, a partir de então, não priorizaram a colegialidade, mas restringiram a sua compreensão e criaram barreiras ao seu exercício. Isso foi em prol da centralização e crescente poder da Cúria romana, em detrimento das Conferências nacionais e continentais e do próprio Sínodo dos bispos, este de caráter apenas consultivo e não deliberativo, sendo que tais organismos detêm, junto com o Bispo de Roma, o supremo e pleno poder em relação à Igreja inteira.
Agora, o Papa Francisco parece desejar restituir às estruturas da Igreja Católica e a cada uma de nossas dioceses uma organização mais sinodal e de comunhão colegiada. Nessa orientação, ele constituiu uma comissão de cardeais de todos os continentes para estudar uma possível reforma da Cúria Romana. Entretanto, para dar passos concretos e eficientes nesse caminho – e que já está acontecendo – ele precisa da nossa participação ativa e consciente. Devemos fazer isso como forma de compreender a própria função de bispos, não como meros conselheiros e auxiliares do papa, que o ajudam à medida que ele pede ou deseja e sim como pastores, encarregados com o papa de zelar pela comunhão universal e o cuidado de todas as Igrejas.
3. O cinquentenário do Concílio
Nesse momento histórico, que coincide também com o cinqüentenário do Concílio Vaticano II, a primeira contribuição que podemos dar à Igreja é assumir nossa missão de pastores que exercem o sacerdócio do Novo Testamento, não como sacerdotes da antiga lei e sim, como profetas. Isso nos obriga colaborar efetivamente com o bispo de Roma, expressando com mais liberdade e autonomia nossa opinião sobre os assuntos que pedem uma revisão pastoral e teológica. Se os bispos de todo o mundo exercessem com mais liberdade e responsabilidade fraternas o dever do diálogo e dessem sua opinião mais livre sobre vários assuntos, certamente, se quebrariam certos tabus e a Igreja conseguiria retomar o diálogo com a humanidade, que o Papa João XXIII iniciou e o Papa Francisco está acenando.
A ocasião, pois, é de assumir o Concílio Vaticano II atualizado, superar de uma vez por todas a tentação de Cristandade, viver dentro de uma Igreja plural e pobre, de opção pelos pobres, uma eclesiologia de participação, de libertação, de diaconia, de profecia, de martírio... Uma Igreja explicitamente ecumênica, de fé e política, de integração da Nossa América, reivindicando os plenos direitos da mulher, superando a respeito os fechamentos advindos de uma eclesiologia equivocada.
Concluído o Concílio, alguns bispos – sendo muitos do Brasil – celebraram o Pacto das Catacumbas de Santa Domitila. Eles foram seguidos por aproximadamente 500 bispos nesse compromisso de radical e profunda conversão pessoal. Foi assim que se inaugurou a recepção corajosa e profética do Concílio.
Hoje, várias pessoas, em diversas partes do mundo, estão pensando num novo Pacto das Catacumbas. Por isso, desejando contribuir com a reflexão eclesial de vocês, enviamos anexo o texto original do Primeiro Pacto.
O clericalismo denunciado pelo Papa Francisco está sequestrando a centralidade do Povo de Deus na compreensão de uma Igreja, cujos membros, pelo batismo, são alçados à dignidade de “sacerdotes, profetas e reis”. O mesmo clericalismo vem excluindo o protagonismo eclesial dos leigos e leigas, fazendo o sacramento da ordem se sobrepor ao sacramento do batismo e à radical igualdade em Cristo de todos os batizados e batizadas.
Além disso, em um contexto de mundo no qual a maioria dos católicos está nos países do sul (América Latina e África), se torna importante dar à Igreja outros rostos além do costumeiro expresso na cultura ocidental. Nos nossos países, é preciso ter a liberdade de desocidentalizar a linguagem da fé e da liturgia latina, não para criarmos uma Igreja diferente, mas para enriquecermos a catolicidade eclesial.
Finalmente, está em jogo o nosso diálogo com o mundo. Está em questão qual a imagem de Deus que damos ao mundo e o testemunhamos pelo nosso modo de ser, pela linguagem de nossas celebrações e pela forma que toma nossa pastoral. Esse ponto é o que deve mais nos preocupar e exigir nossa atenção. Na Bíblia, para o Povo de Israel, “voltar ao primeiro amor”, significava retomar a mística e a espiritualidade do Êxodo.
Para as nossas Igrejas da América Latina, “voltar ao primeiro amor” é retomar a mística do Reino de Deus na caminhada junto com os pobres e a serviço de sua libertação. Em nossas dioceses, as pastorais sociais não podem ser meros apêndices da organização eclesial ou expressões menores do nosso cuidado pastoral. Ao contrário, é o que nos constitui como Igreja, assembleia reunida pelo Espírito para testemunhar que o Reino está vindo e que de fato oramos e desejamos: venha o teu Reino!
Esta hora é, sem dúvida, sobretudo para nós bispos, com urgência, a hora da ação. O Papa Francisco ao dirigir-se aos jovens na Jornada Mundial e ao dar-lhes apoio nas suas mobilizações, assim se expressou: “Quero que a Igreja saia às ruas”. Isso faz eco à entusiástica palavra do apóstolo Paulo aos Romanos: “É hora de despertar, é hora e de vestir as armas da luz” (13,11). Seja essa a nossa mística e nosso mais profundo amor.
Abraços, com fraterna amizade.

Dom José Maria Pires, arcebispo emérito da Paraíba.
Dom Tomás Balduino, bispo emérito de Goiás.
Dom Pedro Casaldáliga, bispo emérito de São Félix do Araguaia.
Quinta-feira, 15 de agosto de 2013
Imagem: Nossa Senhora dos Remédios

Cardeal Martini e seu legado: Um ano depois


A última entrevista de Martini

Como o senhor vê a situação da Igreja?

A Igreja está cansada na Europa do bem-estar e na América. A nossa cultura envelheceu, as nossas igrejas são grandes, as nossas casas religiosas estão vazias, e o aparato burocrático da Igreja aumenta, os nossos ritos e os nossos hábitos são pomposos. Essas coisas expressam o que nós somos hoje? (...)
O bem-estar pesa. Nós nos encontramos como o jovem rico que, triste, foi embora quando Jesus o chamou para fazer com que ele se tornasse seu discípulo. Eu sei que não podemos deixar tudo com facilidade. Menos ainda, porém, poderemos buscar pessoas que sejam livres e mais próximas do próximo, como foram o bispo Romero e os mártires jesuítas de El Salvador. Onde estão entre nós os nossos heróis para nos inspirar? Por nenhuma razão devemos limitá-los com os vínculos da instituição.

Quem pode ajudar a Igreja hoje?

O padre Karl Rahner usava de bom grado a imagem das brasas que se escondem sob as cinzas. Eu vejo na Igreja de hoje tantas cinzas sobre as brasas que muitas vezes me assola uma sensação de impotência. Como se pode livrar as brasas das cinzas de modo a revigorar a chama do amor? Em primeiro lugar, devemos procurar essas brasas. Onde estão as pessoas individuais cheias de generosidade como o bom samaritano? Que têm fé como o centurião romano? Que são entusiastas como João Batista? Que ousam o novo como Paulo? Que são fiéis como Maria de Mágdala? Eu aconselho o papa e os bispos a procurar 12 pessoas fora da linha para os postos de direção. Pessoas que estejam perto dos pobres e que estejam cercadas por jovens e que experimentam coisas novas. Precisamos do confronto com pessoas que ardem, de modo que o espírito pode se difundir por toda parte.

Que instrumentos o senhor aconselha contra o cansaço da Igreja?

Eu aconselho três instrumentos muito fortes. O primeiro é a conversão: a Igreja deve reconhecer os próprios erros e deve percorrer um caminho radical de mudança, começando pelo papa e pelos bispos. Os escândalos da pedofilia nos levam a tomar um caminho de conversão. As questões sobre a sexualidade e sobre todos os temas que envolvem o corpo são um exemplo disso. Estes são importantes para todos e, às vezes, talvez, são até importantes demais. Devemos nos perguntar se as pessoas ainda ouvem os conselhos da Igreja em matéria sexual. A Igreja ainda é uma autoridade de referência nesse campo ou somente uma caricatura na mídia?

O segundo é a Palavra de Deus. O Concílio Vaticano II restituiu a Bíblia aos católicos. (...) Somente quem percebe no seu coração essa Palavra pode fazer parte daqueles que ajudarão a renovação da Igreja e saberão responder às perguntas pessoais com uma escolha justa. A Palavra de Deus é simples e busca como companheiro um coração que escute (...). Nem o clero nem o Direito eclesial podem substituir a interioridade do ser humano. Todas as regras externas, as leis, os dogmas nos foram dados para esclarecer a voz interior e para o discernimento dos espíritos.

Para quem são os sacramentos? Estes são o terceiro instrumento de cura. Os sacramentos não são uma ferramenta para a disciplina, mas sim uma ajuda para as pessoas nos momentos do caminho e nas fraquezas da vida. Levamos os sacramentos às pessoas que precisam de uma nova força? Eu penso em todos os divorciados e nos casais em segunda união, nas famílias ampliadas. Eles precisam de uma proteção especial. A Igreja sustenta a indissolubilidade do matrimônio. É uma graça quando um casamento e uma família conseguem isso (...).

A atitude que temos com relação às famílias ampliadas irá determinar a aproximação à Igreja da geração dos filhos. Uma mulher foi abandonada pelo marido e encontra um novo companheiro que cuida dela e dos seus três filhos. O segundo amor prospera. Se essa família for discriminada, não só a mãe é cortada fora, mas também os seus filhos. Se os pais se sentem fora da Igreja, ou não sentem o seu apoio, a Igreja perderá a geração futura. Antes da Comunhão, nós rezamos: "Senhor, eu não sou digno...". Nós sabemos que não somos dignos (...). O amor é graça. O amor é um dom. A questão sobre se os divorciados podem comungar deve ser invertida. Como a Igreja pode ajudar com a força dos sacramentos aqueles que têm situações familiares complexas?

O que o senhor faz pessoalmente?

A Igreja ficou 200 anos para trás. Como é possível que ela não se sacuda? Temos medo? Medo ao invés de coragem? No entanto, a fé é o fundamento da Igreja. A fé, a confiança, a coragem. Eu sou velho e doente e dependo da ajuda dos outros. As pessoas boas ao meu redor me fazem sentir o amor. Esse amor é mais forte do que o sentimento de desconfiança que às vezes eu percebo com relação à Igreja na Europa. Só o amor vence o cansaço. Deus é Amor. Eu ainda tenho uma pergunta para você: o que você pode fazer pela Igreja?

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Encontrar Deus no "outro"



"Peço a Deus que me livre de Deus". Isto é o que pedia a Deus o Mestre Eckhart, um dos maiores místicos que Igreja já teve ao longo de sua história. Este homem, que nasceu em 1260 (Hochheim - Alemanha) e morreu em 1327 (Avignon - França), foi um dominicano que ocupou cargos de governo e ensino em sua Ordem Religiosa e na Universidade de Paris. Em 1326, o arcebispo de Colônia iniciou um processo contra os ensinamentos de Eckhart em seus sermões. O assunto chegou ao Papa João XXII que residia em Avignon. Mas o místico dominicano se submeteu, de antemão à decisão que pudesse tomar o Pontífice. Eckhart viajou para Avignon para se defender diante do papa, mas antes de poder apresentar a sua defesa, morreu inesperadamente.
Não pretendo expor aqui a doutrina do Mestre Eckhart, ensinamento complexo e nem sempre fácil de interpretar que se fundamenta no mais fundo radicalismo evangélico, em idéias filosóficas que tem sua origem em Plotino, e no "Guia dos Perplexos", deMaimônides. Como é lógico, tudo isto não cabe em um post de um blog tão simples como este. Dito isto, o que eu quero dizer é que o tema de Deus, que deveria servir para unir os humanos, com frequência serve ao contrário. Porque é um fato que a Deus em si mesmo ninguém o viu e nem pode ver (Jo 1, 18). Por isso cada povo, cada cultura, cada religião, cada grupo humano e cada indivíduo "representa-o" como pode. Ou quem sabe como convém ou interessa a cada um.
O problema não está em que aquele que acredita invente o "seu próprio Deus", de acordo com suas particulares conveniências. Não se trata disso. O problema radica no fato de que as pessoas que acreditam em Deus - por isso mesmo - têm a tendência (inconsciente) a relacionar determinados aspectos de usa vida e sua conduta, não com Deus em si, mas sim com a "representação de Deus" que cada qual faz. Ou quem sabe com a "representação de Deus" que lhe impuseram no ambiente religioso em que cresceu, em que vive e ao qual acaba se submetendo. Sobretudo, quando o crente de uma determinada religião está persuadido de que essa religião foi "revelada" por Deus mesmo. Inclusive – o que é ainda mais complicado – quando o crente pensa e aceita. Com isso, o que acontece é que a "representação" que fazemos de Deus acaba por identificar-se com  "Deus em si mesmo". Ou seja, identificamos nossa representação "imanente" com o Deus "transcendente".
E aqui, no processo íntimo (que se vive na intimidade do espírito) que acabo de destacar, aí é onde começa o perigo. O enorme e assombroso perigo que, sem dúvida, intuiu o Mestre Eckhard. É verdade que o pensamento do grande místico alemão ia muito mais longe, até a idéia de Deus mesmo. Mas eu não estou falando disso agora. Estou falando de nossos comportamentos. E bem sabemos que há aspectos de nossa conduta – de nossas idéias até nossos hábitos de vida – que, explicamos a partir de uma suposta vontade absoluta de Deus e por isso mesmo o fazemos de forma tão absoluta, intocável, indiscutível. Acaba que por detrás de posturas tão férreas, tão intransigentes, tão agressivas e até tão violentas, posturas (tão absolutamente intolerantes), tem-se um "deus intolerante", quem sabe um "deus violento". Por isso, às vezes, acontece que as posturas mais profundamente irracionais são, no fundo, posturas profundamente religiosas.
Muitas vezes, ao ver como se comportam ou falam algumas pessoas, me pergunto: "Em que deus acredita esse homem, ou que deus tem em sua cabeça esta mulher"? Eu me coloco muitas vezes essa pergunta por que não me cabe na cabeça que Deus, que é o Deus-Pai de todos os mortais, possa estar legitimando, justificando, impelindo ou promovendo o insulto, a palavra humilhante, a falta de respeito, a intolerância, a dureza de coração… Para não falar da ofensa descarada, do abuso e de tantas outras situações que causam dor, mal-estar, divisão e outras coisas que dá até vergonha em falar.
Quando penso nessas coisas e nesse tipo de situações, não posso deixar de lembrar de numerosos textos dos quatro evangelhos, nos quais Jesus afirma e insiste que quem "recebe", "acolhe", "escuta" ou "rejeita" a um ser humano, ainda que seja o ser humano mais frágil, uma criança, é a Jesus e a Deus a quem "recebe", "acolhe", "escuta" ou "rejeita" (Mt 10, 40; Mc 9, 37; Mt 18, 5; Lc 10, 16; 9, 48; Jo 13, 20). Mais ainda, no juízo definitivo que Cristo, o Senhor, fará de todas as nações da terra, o critério determinante é o que cada um fez ou deixou de fazer com qualquer ser humano (Mt 25, 31-45). Porque a dignidade de todo ser humano é tanta que se identifica com a dignidade do próprio Deus.
O Mestre Eckhart soube extrair dos ensinamentos de Jesus, o mais profundo que seguramente há nesses ensinamentos: a Deus o encontramos no "outro", O encontramos ou o depreciamos nos "outros". O perigo e o horror das religiões consiste em que podemos chegar a "divinizar" nossos sentimentos mais turvos e nossos ressentimentos mais baixos. Quando, em nome da defesa da fé em Deus privamos alguém de sua dignidade, de sua liberdade ou de seus direitos, incorremos em uma autêntica idolatria de blasfêmia. Até o extremo de que, por defender a "deus", desprestigiamos ou ofendemos ao verdadeiro Deus, o Deus que está em cada ser humano.
O problema está em que, para viver isto, não baste tê-lo na cabeça. O absolutamente necessário é o que o mesmo Eckhartdenominava de "despojamento de todo interesse, de todo desejo de possessão, de todo apego", que nos afaste ou nos coloque frente ao outro, seja quem seja. Nesse caso, a "espiritualidade" se converte em "identidade" do espírito humano como a divindade. Assim, e apenas assim, superamos a religião e a metafísica, a divisão do divino e do humano, o sagrado e o profano, e centramos nossa vida na honradez, no respeito, na bondade sem limites e na sinceridade sem fronteiras.

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Oração de São Francisco de Assis



Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz.
Onde houver ódio, que eu leve o amor;
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão;
Onde houver discórdia, que eu leve a união;
Onde houver dúvida, que eu leve a fé;
Onde houver erro, que eu leve a verdade;
Onde houver desespero, que eu leve a esperança;
Onde houver tristeza, que eu leve a alegria;
Onde houver trevas, que eu leve a luz.
Ó Mestre, Fazei que eu procure mais
Consolar, que ser consolado;
compreender, que ser compreendido;
amar, que ser amado.
Pois, é dando que se recebe,
é perdoando que se é perdoado,
e é morrendo que se vive para a vida eterna.

Imagem: Nossa Senhora Auxiliadora

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

O Bicho


“Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem”

Manuel Bandeira

domingo, 18 de agosto de 2013

O fogo da Palavra


Algumas formas de divisão são intoleráveis. Mas algumas pazes também, quando se trata de um silêncio cúmplice que evita decisões dolorosas que se impõem. O verbo latino que deu origem à nossa palavra decisão, significa cortar, dividir. Jesus não traz a paz no sentido de que a sua palavra, se nós a ouvimos verdadeiramente, nos obriga a decidir, a cortar a favor ou contra o que ela exige de nós.

A reflexão é de Raymond Gravel, padre da Diocese de Joliette, Canadá, e publicada no sítio Réflexions de Raymond Gravel, comentando as leituras do 20º Domingo do Tempo Comum – Ciclo C do Ano Litúrgico (18 de agosto de 2013). A tradução é de André Langer.

Referências bíblicas:

Primeira leitura: Jr 38,4-6.8-10
Segunda leitura: Hb 12,1-4
Evangelho: Lc 12,49-53

Eis o texto.


Hoje, mais uma vez, somos convidados a seguir Cristo, como discípulos, mensageiros, portadores e portadoras da sua Palavra. Desde o 13º domingo, nós nos encontramos no caminho para Jerusalém, e, a cada semana, o Evangelho de Lucas nos ensina o que quer dizer seguir Cristo. Nas últimas semanas, aprendemos que para seguir Cristo é preciso estar livre, desfazer-se de tudo o que nos impede de prosseguir no caminho da vida, de olhar para frente, que a missão não nos pertence; estamos a serviço da missão, que é preciso nos tornar próximos dos outros, sem nenhuma discriminação, que em nossas celebrações a Palavra é primeira, que a oração nos torna responsáveis pelo que dizemos e pedimos, que devemos ser ricos de coração e não em celeiros, e que somos servos responsáveis. Essas são as exigências para sermos cristãos, e ainda não acabou... Hoje, as exigências nos levam ainda mais longe...

1. O fogo

“Eu vim trazer fogo à terra, e como desejaria que já estivesse aceso!” (Lc 12,49). O que isto quer dizer? Eu li comentários de exegetas que veem nesse fogo uma espécie de purificação, uma distinção entre o bem e o mal. Pessoalmente, não concordo com esta interpretação. Prefiro a interpretação da Bíblia TOB que explica, em uma nota de rodapé, que se trata do batismo do Espírito e do fogo inaugurado no Pentecostes. Lembrem-se desse relato de Lucas, no livro dos Atos dos Apóstolos, em que no dia do Pentecostes, línguas de fogo descem sobre todos os presentes... E o que esse fogo provocou neles? Tornou-os capazes de sair a público e falar uma linguagem que todos podiam compreender. É, portanto, a linguagem do Amor, porque é a única linguagem que podemos compreender em todas as línguas.

E este Amor se expressa, em primeiro lugar, na Palavra com “P” maiúsculo, e se torna um gesto, uma ação, na sequência. Não existe o ditado que diz que é preciso dar mãos à Palavra? Todo o Evangelho fala do Amor: um Amor incondicional e total da parte de um Deus que é reconhecido através do homem e da mulher e que se serviu de Jesus de Nazaré, que se tornou o Cristo e Senhor Ressuscitado. Recordemos as mensagens relatadas pelos evangelistas e que provêm do Cristo ressuscitado: a acolhida do outro, sobretudo dos mais fracos, o perdão em toda a sua gratuidade, a partilha com os mais pobres, trabalhar por mais justiça, mais igualdade, mais dignidade... Como discípulos, temos que espalhar esse Amor, esse fogo, e nós somos capazes disso, porque somos habitados pelo Espírito de Cristo desde o Pentecostes, e diria mesmo que desde a noite da Páscoa e mesmo desde a cruz da Sexta-feira Santa.

A própria Palavra é um fogo! Recordemo-nos do profeta Jeremias, não no trecho de hoje, mas no capítulo 20, versículos 7 a 9, onde Jeremias diz, em relação à Palavra que devia proclamar: “Quando eu pensava: ‘Não me lembrarei dele, já não falarei em seu Nome’, então isto era em meu coração como um fogo devorador... Estou cansado de suportar, não posso mais!”. Isso era mais forte que ele, o profeta devia proclamar a Palavra imperiosamente.

2. O batismo

“Devo receber um batismo, e como me angustio até que esteja consumado!” (Lc 12,50). O que também isso quer dizer? De que batismo o Jesus de Lucas , que é o Cristo da Páscoa, está falando? Do batismo que é um mergulho, mergulho na morte, não para ficar aí, mas para ressuscitar. É o mistério pascal que é evocado por Lucas, num momento da história em que as perseguições aos cristãos são moeda corrente.

É evidente que isso faz referência à morte e ressurreição de Jesus, porque é o mesmo sentido do batismo cristão. Não é apenas um batismo na água que purifica, mas também um batismo que é um mergulho na morte de Cristo para ressuscitar com ele. É esse batismo que nós recebemos como cristãos e é por esse batismo que nós devemos viver como discípulos de Cristo, como ressuscitados, como Cristos da Páscoa. Quer sejamos homens ou mulheres, brancos, amarelos ou negros, heterossexuais ou homossexuais ou transgêneros, pequenos ou grandes, somos todos e todas chamados a viver como Cristo, porque fomos mergulhados em sua morte e ressurreição com ele. São Paulo, na carta aos Gálatas, diz: “Pois todos vós, que fostes batizados em Cristo, vos vestistes de Cristo. Não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher; pois todos vós sois um só em Cristo Jesus” (Gl 3,27-28).

E esse batismo dá todo o sentido ao resto do Evangelho de hoje.

3. A divisão e a decisão

“Pensais que vim para estabelecer a paz sobre a terra? Não, eu vos digo, mas a divisão” (Lc 12,51). Eu li um exegeta que dizia que esta Palavra o chocava muito. Como pode Jesus, que nos fala de paz e de amor, ao mesmo tempo dizer que veio semear a cizânia em nosso mundo? Mas não é isto que esta Palavra quer dizer. Gérard Sindt escreve: “Algumas formas de divisão são intoleráveis. Mas algumas pazes também, quando se trata de um silêncio cúmplice que evita decisões dolorosas que se impõem. O verbo latino que deu origem à nossa palavra decisão, significa cortar, dividir. Jesus não traz a paz no sentido de que a sua palavra, se nós a ouvimos verdadeiramente, nos obriga a decidir, a cortar a favor ou contra o que ela exige de nós”.

Na época em que Lucas escreve o seu evangelho, a decisão de ser cristão, de seguir Cristo, semeava a divisão, a controvérsia, a perseguição, inclusive nas famílias. Mais ainda hoje, na nossa Igreja, não há divisão no seio mesmo daqueles que dizem seguir Cristo? Há, certamente, divisões que persistem entre cristãos de diferentes denominações, mas esse não é meu objetivo; eu falo das divisões dentro da nossa Igreja católica romana. Há mais que diversidade; há ruptura entre a hierarquia e os fiéis. O que fazer para decidir e para cortar? Impor os dogmas contra vento e maré? Excluir todos aqueles e todas aquelas que não pensam como as autoridades romanas? Aplicar as regras com o rigor exigido?

É desta maneira que se agia antes da chegada do novo Papa, o Papa Francisco, e vemos no que isso dá: uma Igreja que se esvazia cada vez mais, uma Igreja a ponto de morrer, uma Igreja em fase terminal. Isso ocorreu por que não se tomou as decisões corretas? O que fazer então? Talvez retomando os evangelhos e aprendendo as mensagens de Cristo que os evangelhos nos ensinam, possamos reencontrar um sopro novo, uma lufada de ar fresco, uma brisa de esperança. É o que o Papa Francisco está fazendo: uma grande limpeza não apenas na Cúria romana, mas também na própria estrutura da nossa Igreja. Pela primeira vez, ele nos fala de pastoral. Ele não recorda a todo momento a doutrina; essa nós conhecemos... Ele nos diz como fazer pastoral, ali onde estamos com os dois pés. Pessoalmente, isso me faz muito bem, e não estou sozinho. Eu ouvi muitas pessoas que se afastaram da Igreja há um bom tempo e que me disseram que esse Papa os interpela profundamente. Faz bem ouvir isso.

Recordemos que nesse domingo em que se celebra o Orgulho Gay, não é normal, nem evangélico que se exclua esta parcela da população, simplesmente porque eles têm uma orientação sexual diferente da maioria, mas uma orientação que eles não escolheram e que eles procuram assumir da melhor maneira possível, sempre guardando a fé e a esperança cristã. “Quem sou eu para julgar os homossexuais?”, disse o Papa Francisco, no avião que o levava de volta para Roma após a Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro. É evidente que os homossexuais, assim como os heterossexuais não são perfeitos... Mas uns e outros são convidados a amar na fidelidade e no respeito da dignidade de uns e outros. O que está acontecendo na Rússia e em muitos países, e mesmo aqui em Quebec e no Canadá, onde se dá provas de discriminação, violência, desprezo e exclusão em relação aos homossexuais, é inaceitável e isso deve ser denunciado por toda a população, inclusive pelos cristãos. Temos de dizer não à homofobia. Para mim é uma decisão que vai semear a divisão, escusado será dizer, mas é uma decisão que o evangelho me inspira. Será também uma prova de fidelidade aos ensinamentos de Jesus.

Papa agradece a Dom Orani pelo carinho durante a JMJ


Em carta enviada ao arcebispo Dom Orani João Tempesta, o Papa Francisco agradece o acolhimento que lhe foi concedido por ocasião da Jornada Mundial da Juventude, realizada no Rio de Janeiro. Leia na íntegra:
Querido irmão,
Regressado a Roma, não posso deixar de alegrar-me com a recordação dos inesquecíveis dias de minha permanência no Rio de janeiro, que me brindaram com um caloroso acolhimento da parte da população carioca a mim e aos jovens peregrinos vindos do mundo inteiro para a Jornada Mundial da Juventude, para além do testemunho de que a fé é muito mais forte que o frio e a chuva que marcaram grande parte destes dias. Queira Deus, na sua grande generosidade, lhe recompensar, meu querido irmão no Episcopado, juntamente com seus Bispos Auxiliares, bem como todos os membros do Comitê Organizador Local, voluntários e benfeitores que generosamente se empenharam para que a Jornada Mundial da Juventude fosse um acontecimento marcante na História da Cidade Maravilhosa e para Igreja que está no Brasil.
Peço-lhe que também transmita o meu agradecimento para todos os envolvidos com a Rede de Tratamento da Dependência Química, geradora de esperança e superação para todos os chagados por esta mazela, como pude comprovar no Hospital São Francisco de Assis. Queria ainda agradecer aos moradores da Comunidade de Varginha, juntamente com o seu pároco, pela recepção calorosa e alegre, que me ofereceram, bem como os moradores de Copacabana, que tão generosamente, e não sem sacrifício, acolheram no seu bairro os milhões de fiéis que participaram das celebrações da Jornada Mundial da Juventude. Finalmente, desejo dirigir uma palavra especial aos moradores de Guaratiba, que tanto sonharam com as celebrações no Campus Fidei, mas que, por um misterioso desígnio da Providência de Deus, não foi possível realizar-se: queria que eles soubessem que o Papa está muito próximo deles e que reza por cada família daquela vizinhança.
Com estes sentimentos e votos, que confio a Nossa Senhora Aparecida, imploro do Espírito Santo renovada efusão dos seus dons sobre o ministério de Dom Orani e de seus sacerdotes para levarem o seu povo a repousar e saciar-se em Deus, ao conceder a todos os filhos e filhas da queridíssima Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, com menção especial dos idosos e doentes, dos jovens e crianças, a minha Bênção Apostólica e peço que, por favor, não deixem de rezar por mim.
Vaticano, 2 de agosto de 2013.

Francisco

Link para o Hospital São Francisco

Sem fogo não é possível


A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas 12, 49-53 que corresponde ao 20º Domingo do Tempo Comum, ciclo C do Ano Litúrgico. O teólogo espanhol José Antonio Pagola comenta o texto. No Brasil, as leituras correspondem à Solenidade Assunção de Nossa Senhora, transferida do dia 15 para o dia 18 de agosto.

Eis o texto:


Num estilo claramente profético, Jesus resume sua vida toda com umas palavras extraordinárias: Eu vim para lançar fogo sobre a terra: e como gostaria que já estivesse aceso! De que fala Jesus? O caráter enigmático de sua linguagem leva os exegetas a procurarem respostas em várias direções. De qualquer forma, a imagem do “fogo” convida-nos a aproximar-nos de seu mistério de forma mais ardente e apaixonada.

O fogo que arde no seu interior é a paixão por Deus e a compaixão pelos que sofrem. Jamais poderá ser desvelado esse amor insondável que anima toda a sua vida. Seu mistério nunca ficará fechado em fórmulas dogmáticas nem nos livros dos sábios. Ninguém escreverá um livro definitivo sobre ele. Jesus atrai e queima, incomoda e purifica. Ninguém conseguirá segui-lo com o coração fraco ou com uma piedade apática.

Sua palavra faz arder os corações. Ele se oferece amistosamente aos mais excluídos e anima a esperança das prostitutas e a confiança nos pecadores mais desprezados. Luta contra tudo o que machuca o ser humano. Combate os formalismos religiosos, os rigorismos inumanos e as estreitas interpretações da lei. Para fazer o bem, nada nem ninguém pode encadear sua liberdade. Não é possível segui-lo na rotina religiosa ou segundo um protocolo do que “é correto”.

Jesus não apaga os conflitos senão acende-os. Ele não veio para trazer tranquilidade, senão tensões, enfrentamentos e divisões. Jesus introduz o conflito no nosso interior. Não é possível se proteger de seu chamado, escondendo-se atrás do escudo de rituais religiosos ou práticas sociais. Nenhuma religião nos protege de seu olhar. Nenhum agnosticismo livra-nos do desafio da sua proposta. Ele chama-nos a viver na verdade e amar sem egoísmos.

Seu fogo não ficou apagado quando ele se submergiu nas águas profundas da morte. Ressuscitado para uma vida nova, seu Espírito continua ardendo ao longo da história. Os primeiros seguidores sentem arder seus corações na escuta de suas palavras enquanto caminham com ele.

Onde é possível sentir hoje esse fogo de Jesus? Onde poderemos experimentar a força de sua liberdade criadora? Nossos corações ardem na acolhida do Evangelho? Onde há pessoas que vivam seguindo seus passos? Ainda a fé cristã parece que se extingue hoje ao nosso redor. O fogo que Jesus trouxe ao mundo segue ardendo debaixo das cinzas. Não podemos deixar que se apague. Sem fogo no coração não é possível seguir Jesus.

Fonte

Vocês são da Igreja Católica


Querid@s Amig@s,

É difícil descrever e resumir a emoção e alegria que foi o primeiro dia da campanha de doação de cobertores, agasalhos, meias, biscoitos, água, escovas-de-dente do Diversidade Católica.

Inspirados em Francisco e suas belas palavras na Videomensagem pela festa de São Caetano na Argentina, 7 de agosto de 2013, partimos para o encontro com os mais necessitados, "encontro com as pessoas que têm mais necessidade, daqueles que têm necessidade que nós demos uma mão a eles, que os olhemos com amor, que partilhemos a sua dor e as suas ansiedades, os seus problemas. Porém, a coisa importante não é olhá-los de longe ou ajudá-los de longe. Não, não! É ir ao encontro deles. Isto é cristão! Isto é aquilo que Jesus ensina: ir ao encontro dos mais necessitados. Como Jesus que ia sempre ao encontro do povo. Ele ia para encontrá-lo. Ir ao encontro dos mais necessitados.
Às vezes, eu pergunto a alguém:
“Você dá esmola?”.
Dizem pra mim: “Sim, padre”.
“E quando você dá a esmola, olha nos olhos da pessoa a quem dá a esmola?”
“Ah, não sei, não me dou conta disso”.
“Então você não encontrou a pessoa. Você jogou a esmola e foi embora. Quando você dá a esmola, toca a mão ou joga a moeda?”
“Não, jogo a moeda”.
“E então não o tocou. E se não o tocou, não o encontrou”.
Aquilo que Jesus nos ensina, antes de tudo, é encontrar-se e, encontrando, ajudar. Devemos saber encontrar. Devemos edificar, criar, construir uma cultura do encontro. Quantas divergências, problemas na família, sempre! Problemas no bairro, problemas no trabalho, problemas em todo lugar. E as divergências não ajudam. A cultura do encontro. Sair para encontrar-nos. E o tema diz: “Encontrar-nos com os mais necessitados”, com aqueles mais necessitados que eu. Com aqueles que estão passando por um momento difícil, pior que aquele que eu estou passando. Tem sempre alguém passando por algo pior, né? Sempre! Tem sempre alguém. Então, eu penso: “Estou passando por um momento difícil, estou na fila para encontrar-me com São Caetano e com Jesus e depois vou encontrar os outros, porque tem sempre alguém que passa por algo pior que eu”. Com estas pessoas, é com estas pessoas que nós devemos nos encontrar."
E foi assim que hoje se ainda havia alguma dúvida de que por sermos gays não fazemos parte da igreja católica, essa dúvida foi resolvida de uma vez por todas. Quando entregamos um cobertor, ouvimos de um irmão mais necessitado, uma pergunta que na realidade era uma afirmação: "Vocês são da Igreja Católica?". 
Sim, somos, com muito orgulho!

Hugo Nogueira
Equipe Diversidade Católica





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