quinta-feira, 29 de maio de 2014

O pastor da paz



Uma feliz notícia: o arcebispo de Recife e Olinda dará entrada no pedido de beatificação e canonização de D. Helder Câmara, que por sua vida e suas obras já foi há muito santificado pelo povo. Viva D. Helder!

"Data memorável e histórica para a igreja particular de Olinda e Recife, nosso Arcebispo Dom Antônio Fernando Saburido, depois de consultar seus irmãos bispos do Regional Nordeste 2, encontrou parecer favorável, para dar inicio ao processo de Beatificação e Canonização do grande pastor da paz DOM HÉLDER CÂMARA. Hoje na Igreja dos Manguinhos em Recife foi lida e depois assinada por nosso Arcebispo Dom Fernando a carta que será enviada à Congregação para a causa dos Santos, em Roma. Que alegria imensa para toda Arquidiocese e todo povo de Deus que conheceu e pôde partilhar a vida, com Dom Hélder, o DOM, o pai dos pobres, o pastor da paz."

Via Frei Ronaldo César, aqui

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Obrigada, Senhor!

 
Nossa amiga e parceira Majú Giorgi, do Mães pela Igualdade e colunista do iG, fez um balanço e uma reflexão sobre sua relação com o catolicismo e os rumos recentes que a Igreja vem tomando. Destacamos alguns trechos abaixo, com links para os fatos e pessoas citados por ela  - e você pode ler o texto na íntegra aqui.
(...) Eu não sou mais católica, porque quando eu mais precisei eu não pude contar com a minha Igreja, muito pelo contrário. Foi o primeiro lugar que procurei e inócuo foi. Queriam enfiar meu filho de volta pra dentro do armário. (...)

Hoje eu sei separar bem religião e religiosidade. Apesar disso, continuei devota de minha Nossa Senhora a quem peço todos os dias que cubra meus filhos com seu manto sagrado! Nos últimos anos tenho tido a grata surpresa de me deparar com vozes que lentamente se levantam na defesa dos LGBT dentro das Igrejas. São padres, rabinos e pastores que gradualmente se colocam a serviço do enfrentamento a homofobia e suas matizes tão injustas. Poderia citar aqui Padre Beto, Rabino Nilton Bonder, Pastor Ricardo Gondim, Pastor Marcio Retamero e tantos outros. Seria eu uma intolerante se fosse buscar nas fogueiras da inquisição motivos para odiar a ICAR [Igreja Católica Apostólica Romana] sendo eu, hoje, testemunha da tentativa de mudança.

Na visita do Papa Francisco, pudemos ver a Diversidade Católica na JMJ. Logo depois vieram as declarações do Papa. Logo depois vieram as novas diretrizes da CNBB e que trazia em uma de suas pautas, pauta aliás que me arrancou lágrimas, o acolhimento a casais homoafetivos e que os filhos destes fossem mais que acolhidos, fossem batizados. Em seguida, vimos o apoio do CONIC (Conselho Nacional de Igrejas Cristãs no Brasil) do qual faz parte a ICAR, com assinatura em carta aberta ao PLC122 que pedia a equiparação da homofobia ao racismo.

Neste meio tempo, vimos Padres do mundo todo se posicionando contra as injustiças e a opressão sistemática ao povo LGBT. A felicidade de nossos meninos , meninas e famílias sexodiversas que têm no sagrado seu ponto de equilíbrio foi tão grande, tão imensa, que cartazes homenageando esses religiosos inundaram as redes sociais [veja alguns aqui].

Mas o ápice aconteceu as vésperas da Parada LGBT , quando a Arquidiocese de São Paulo emitiu [a nota que você pode ler aqui, em apoio à comunidade LGBT e condenando a violência homofóbica] (...)

A semana passada, a consagrada revista Vida Pastoral foi toda dedicada a sexualidade homoafetiva e pela primeira vez na sua história, trouxe um artigo de uma pessoa que não é padre, nossa querida Edith Modesto, e outro daquele que sempre traz em suas palavras um bálsamo para nossas almas sofridas, nosso amado Padre Luís Corrêa Lima [aqui]. Neste dia recebi uma mensagem de um menino…Emmanuel, que beirava a loucura de tanta felicidade e desejo de outra vez abraçar sua fé.

Por último, tivemos a declaração do Secretário Geral da CNBB, Dom Leonardo Steiner, que diz que uniões entre pessoas do mesmo sexo precisam de amparo legal [aqui].

Dito isso, eu espero que as pessoas entendam que sim, estão havendo reais mudanças na Igreja Católica. Hoje o Papa Francisco soma sua voz à de outros dois grandes líderes religiosos mundiais, Desmond Tutu e Dalai Lama pelo fim da perseguição ao povo LGBT.

Lembrem-se sempre, que os países com esmagadora maioria católica são os que mais somam avanços na causa LGBT, Espanha, Portugal, Argentina e Uruguai.

Sigo com minha fé…porque…CONTRA O AMOR NÃO HÁ LEI ! GÁLATAS 5:23 (...)


À Majú, todo o nosso carinho e gratidão pelos laços de afeto que nos unem e pelos caminhos compartilhados. Sigamos juntos!


segunda-feira, 26 de maio de 2014

Lançar fora o medo


"Este Túmulo sagrado convida-nos a lançar fora outro medo que é talvez o mais difuso na nossa era moderna, a saber, medo do outro, medo do que é diferente, medo do seguidor de outra fé, de outra religião, ou de outra confissão. O racismo e todas as outras formas de discriminação estão ainda espalhados em muitas das nossas sociedades contemporâneas; o pior é que, frequentemente, permeiam também a vida religiosa das pessoas. O fanatismo religioso já ameaça a paz em muitas regiões do globo, onde o próprio dom da vida é sacrificado no altar do ódio religioso."

- Patriarca Bartolomeu I, no encontro com o Papa Francisco

domingo, 25 de maio de 2014

Papa Francisco: Diversidade "não deve provocar rejeição" porque "variedade é sempre enriquecimento"

Papa Francisco abençoa o repórter palestino Imad Freij
durante o voo entre Roma e Amã, 24.5.2014. Via

O papa Francisco iniciou este sábado uma visita de três dias à Terra Santa, tendo sublinhado na homilia da primeira missa a que presidiu, na Jordânia, que «a diversidade de pessoas e de pensamento não deve provocar rejeição e obstáculos, porque a variedade é sempre enriquecimento».

A intervenção centrou-se no apelo à paz mediante a invocação do Espírito Santo, dado que a celebração, no estádio de Amã, capital jordaniana, se realizou «não longe do local onde o Espírito Santo desceu com poder sobre Jesus de Nazaré, depois que João o batizou no rio Jordão», disse Francisco, citado pela Rádio Vaticano.

«A Ele [Espírito Santo] pedimos para preparar os nossos corações para o encontro com os irmãos para além das diferenças de ideias, língua, cultura, religião; para ungir todo o nosso ser com o óleo da sua misericórdia que cura as feridas dos erros, das incompreensões, das controvérsia», pediu.

Francisco frisou que a paz «não se pode comprar, não se vende», sendo antes «um dom a procurar pacientemente e a construir artesanalmente mediante pequenos e grandes gestos» que envolvem a «vida quotidiana».

«O caminho da paz consolida-se se reconhecemos que todos temos o mesmo sangue e fazemos parte do género humano; se não esquecemos que temos um único Pai no céu e que somos todos seus filhos, feitos à sua imagem e semelhança», afirmou.

Ao chegar a Amã, o papa encontrou-se com o rei Abdullah, tendo elogiado o «generoso acolhimento» do país a uma grande quantidade de refugiados palestinos, iraquianos e provenientes de outras regiões de crise, em particular da vizinha Síria, envolvida num conflito que dura há demasiado tempo».

Torna-se «urgente uma solução pacífica para a crise síria, bem como uma solução justa para o conflito israelo-palestino», acentuou, pedindo a Deus para que proteja do «medo da mudança».

Na primeira intervenção na Jordânia, Francisco renovou o «profundo respeito» e «estima» pela comunidade muçulmana, e realçou o papel do monarca na promoção de «uma mais adequada compreensão das virtudes proclamadas pelo Islão e a serena convivência entre os fiéis das diversas religiões», tendo agradecido a Abdullah o facto de ser «artífice de paz».

A Jordânia foi também louvada «por ter encorajado várias iniciativas importantes a favor do diálogo inter-religioso para a promoção da compreensão entre judeus, cristãos e muçulmanos, entre as quais a "Mensagem Inter-religiosa de Amã"», bem como por ter patrocinado, no âmbito da ONU, a celebração anual da "Semana de Harmonia entre as Religiões".

Dirigindo «uma saudação plena de afeto à comunidade cristã», presente na região «desde a era apostólica», Francisco recordou a sua contribuição «para o bem comum da sociedade».

«Apesar se serem hoje numericamente minoritários», os cristãos trabalham no apoio aos refugiados, através da Cáritas Jordânia, além de dirigirem escolas e hospitais, «podendo professar com tranquilidade a sua fé, no respeito da liberdade religiosa, que é um direito humano fundamental».

A terminar, o papa expressou os votos de «paz» e «prosperidade» para a Jordânia, com o desejo que a visita «contribua para incrementar e promover boas e cordiais relações entre cristãos e muçulmanos».

O programa do primeiro dia da viagem de Francisco à Terra Santa completa-se com a visita ao local do Batismo de Jesus (Betânia além do Jordão) e, às 17h15 (hora de Lisboa), o encontro com refugiados e jovens com deficiência, na igreja latina de Betânia.

Líderes de crenças diversas apoiam religiões afro-brasileiras


Representantes e e estudiosos das mais variadas crenças repudiaram a sentença do juiz federal do Rio de Janeiro Eugênio Rosa de Araújo, afirmando que “manifestações religiosas afro-brasileiras não se constituem religião”. Araújo se retratou em relação às religiões afro-brasileiras, mas não retirou os vídeos do YouTube, atitude criticada por líderes religiosos. Presidente da Associação Nacional de Mídia Afro, a candomblecista Márcio Righetti, responsável pela denúncia feita ao Ministério Público Federal, ressalta que a mobilização contra os vídeos não é voltada apenas para os devotos de matrizes afro-brasileiras, mas também pela democracia:

– A sociedade civil tem que mostrar sua capacidade política para que não aconteça novamente. As declarações do juiz foram totalmente infelizes. Mesmo se retratando, ao não retirar os vídeos, mantém institucionalizada a intolerância religiosa. Quero deixar claro que isso não é uma defesa específica da comunidade de terreiro; é uma defesa da democracia.

No ato Independente de escolhas, somente unidos somos fortes, que ocorreu nesta quarta-feira (21) na Associação Brasileira de Imprensa (ABI), no Centro do Rio, líderes de diferentes religiões debateram sobre o problema da intolerância religiosa no Brasil. Foram recolhidas assinaturas no abaixo-assinado pedindo a retirada dos vídeos, a ser entregue ao Ministério Público. O babalaô Ivanir dos Santos, presidente da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), também não ficou satisfeito com o que chamou de “arrependimento pela metade”:

– Por sermos religiosos, nós aceitamos o arrependimento, mas não pode ser pela metade. O juiz reconhece que são religiões, mas mantém a medida e os vídeos. É contraditório. Estamos pedindo que retirem o vídeo para nos respeitarem. Não queremos punir ninguém. Estamos pedindo respeito e dignidade.

Não apenas as religiões diretamente atacadas pelo juiz Eugênio Rosa participaram do ato contra a intolerância religiosa, que contou com a participação de católicos, muçulmanos e judeus. Representante do arcepisbo do Rio, dom Orani Tempesta, que não pôde comparecer ao ato, o diácono Nelson Águia, secretário da Comissão Arquidiocesana de Diálogo Inter-Religioso, também defendeu a retirada dos vídeos, e ressaltou a importância do encontro entre as religiões:

– Não devemos criar acirramento entre as religiões, uma guerra religiosa. Devemos construir pontes, e não levantar muros. Não viemos para discutir dogmas nem doutrinas, viemos conversar sobre aquilo que nos é comum: a paz e a fraternidade. O que todas as religiões querem é que o homem seja melhor do que ontem. Nós temos mais coisas que nos unem, portanto, para que acentuar aquilo que nos separa? Devemos promover a harmonia. Eu vim representando Dom Orani, que prega a união e a harmonia entre as religiões. A expressão dele é que não devemos deixar ninguém de fora. Nós devemos incluir, e não excluir. Devemos conversar com todos. (ouça as declarações de outros líderes religiosos).

"A sentença é inaceitável para toda a sociedade", diz pesquisadora

A historiadora especialista em pertenças religiosas Denise Fonseca, professora do Departamento de Serviço Social da PUC-Rio e uma das autoras do livro Presença do axé: mapeando terreiros no Rio de Janeiro (Ed. PUC-Rio e Pallas), com a também professora da PUC Sonia Giacomini, questiona a postura do magistrado.

– O juiz jamais poderia emitir um parecer, transformando sua autoridade em verdade, e impor à sociedade brasileira, do lugar de poder que ocupa, uma percepção que parece um tanto pessoal. No espaço público, onde ele se enunciou, não poderia ter feito. Para fazer uma argumentação como aquela, num espaço jurídico, refletindo sobre questões que passam pelos campos da antropologia religiosa, da teologia, ele deveria, minimamente, ter consultado especialistas destas áreas.

Para a professora da PUC, a sentença é inaceitável para toda a sociedade. A defesa da liberdade democrática deve ser debatida por todos, não só pelos adeptos das religiões de matrizes africanas, como se fosse um problema exclusivamente deles.

– Isso reflete também uma vontade política, uma adesão a um projeto intolerante que vem se construindo na sociedade brasileira e que hoje ocupa espaços de poder muito importantes. Por trás, está a vontade que é expressa nos 15 vídeos. Trata-se, sim, de cooptar e aliciar politicamente, explorar economicamente um segmento muito vulnerável – analisa Denise, que completa: – Essa questão é apenas a ponta de um iceberg, de uma questão política que diz respeito a todos nós.

Em carta aberta, Denise defende a livre expressão, “fundamento democrático para a concretização do princípio de dignidade da pessoa humana”, e lembrou que é preciso combater “antigos e odiosos projetos de sociedade nos quais nossas diferenças – de qualquer ordem – são percebidas como equívocos e tratadas com desrespeito”. Citando o estudo sobre o trabalho social desenvolvido nas casas religiosas, ela afirma: “Ali se cuidam de pessoas que buscam na fé um esteio para sobreviver à pobreza com dignidade”. Lançada em março, a publicação é resultado de uma pesquisa que mapeou 847 terreiros no Estado do Rio, em 20 meses de trabalho de campo, contanto com mais de 30 pesquisadores, entre eles líderes religiosos. (Leia também Rio ganha mapa das casas de umbanda e candomblé e assista reportagem de TV).

Padre Hortal: "Caso expõe incompreensão de aspectos religiosos e culturais"

Para o reitor da Universidade Católica de Petrópolis e ex-reitor da PUC-Rio, padre Jesus Hortal Sánchez, o caso mostra uma incompreensão dos aspectos religiosos e culturais que envolvem as religiões de matrizes africanas para além dos cultos nos terreiros.

– Na nossa sociedade, os símbolos da umbanda e do candomblé, sobretudo em algumas regiões, são muito comuns. É um aspecto mais cultural do que religioso. Isso acontece com outras religiões.

Padre Hortal, que foi consultor do Vaticano para o diálogo com o judaísmo por dez anos, ressalta que religiões costumam ser definidas como um conjunto de crenças, que têm um código de conduta e que significam sempre uma relação com a divindade. No entanto, lembra, elas podem ser constituídas de formas diferentes:

– Existem os dois aspectos: o da fé, das crenças, das doutrinas; e o da conduta ética. Há religiões reveladas, como o judaísmo, o cristianismo e o islamismo, que têm escritura. E há também religiões que, na tradição, elaboram suas crenças e condutas.

Denise ainda afirma que as alegações do juiz federal, que se baseiam em três aspectos para considerar uma religião como uma religião – ter um Deus único, uma hierarquia visível e de ter um texto sagrado como referência –, não se sustentam em face a muitas outras religiões. Esta não seria a única maneira de definir religiões. A professora completa que a sentença está em total desacordo com a liberdade de credo e o respeito a diferentes crenças. O fato de o juiz ter voltado atrás “pelo apoio que a sociedade demonstrou”, para ela, foi tão inaceitável quanto a afirmação inicial de que candomblé e umbanda não são religiões:

– Inaceitável em nome da democracia brasileira. A sentença abominável foi mantida. O juiz voltou atrás evocando o direito da livre expressão, fundante do princípio democrático, que garante a liberdade de expressão para tornar concreta a dignidade da pessoa humana, exatamente o que não está feito. A decisão garantiu a manutenção de espaços de violência, de degradação e de desqualificação do outro.

O babalaô Ivanir (foto), porém, vê um lado positivo na discussão sobre intolerância religiosa no Brasil:

– Este tem sido um problema muito grave na sociedade brasileira. O dado novo é que a sociedade está acordando. Não é só o ataque à umbanda e ao candomblé; é o desrespeito com a pessoa que é de uma religião diferente ou até mesmo não tem religião. Se alguém escolhe até não acreditar em Deus, tenho que respeitá-lo.

Fonte

Comunicação ao serviço de uma autêntica cultura do encontro


Compartilhamos aqui a mensagem do Papa Francisco para o 48º Dia Mundial das Comunicações Sociais, em 1º de junho de 2014. Os grifos são nossos.

Queridos irmãos e irmãs,

Hoje vivemos num mundo que está a tornar-se cada vez menor, parecendo, por isso mesmo, que deveria ser mais fácil fazer-se próximo uns dos outros. Os progressos dos transportes e das tecnologias de comunicação deixam-nos mais próximos, interligando-nos sempre mais, e a globalização faz-nos mais interdependentes. Todavia, dentro da humanidade, permanecem divisões, e às vezes muito acentuadas. A nível global, vemos a distância escandalosa que existe entre o luxo dos mais ricos e a miséria dos mais pobres. Frequentemente, basta passar pelas ruas duma cidade para ver o contraste entre os que vivem nas calçadas e as luzes brilhantes das lojas. Estamos já tão habituados a tudo isso que nem nos impressiona. O mundo sofre de múltiplas formas de exclusão, marginalização e pobreza, como também de conflitos para os quais convergem causas económicas, políticas, ideológicas e até mesmo, infelizmente, religiosas.

Neste mundo, os meios de comunicação em massa podem ajudar a sentir-nos mais próximo uns dos outros; a fazer-nos perceber um renovado sentido de unidade da família humana, que impele à solidariedade e a um compromisso sério para uma vida mais digna. Uma boa comunicação ajuda-nos a estar mais perto e a conhecer-nos melhor entre nós, a ser mais unidos. Os muros que nos dividem só podem ser superados, se estivermos prontos a ouvir e a aprender uns dos outros. Precisamos de harmonizar as diferenças por meio de formas de diálogo, que nos permitam crescer na compreensão e no respeito. A cultura do encontro requer que estejamos dispostos não só a dar, mas também a receber de outros. Os meios de comunicação podem ajudar-nos nisso, especialmente nos nossos dias em que as redes da comunicação humana atingiram progressos sem precedentes. Particularmente a internet pode oferecer maiores possibilidades de encontro e de solidariedade entre todos; e isto é uma coisa boa, é um dom de Deus.

No entanto, existem aspectos problemáticos: a velocidade da informação supera a nossa capacidade de reflexão e discernimento, e não permite uma expressão equilibrada e correcta de si mesmo. A variedade das opiniões expressas pode ser sentida como riqueza, mas é possível também fechar-se numa esfera de informações que correspondem apenas às nossas expectativas e às nossas ideias, ou mesmo a determinados interesses políticos e económicos. O ambiente de comunicação pode ajudar-nos a crescer ou, pelo contrário, desorientar-nos. O desejo de conexão digital pode acabar por nos isolar do nosso próximo, de quem está mais perto de nós. Sem esquecer que a pessoa que, pelas mais diversas razões, não tem acesso aos meios de comunicação social corre o risco de ser excluído.

Estes limites são reais, mas não justificam uma rejeição dos meios de comunicação; antes, recordam-nos que, em última análise, a comunicação é uma conquista mais humana que tecnológica. Portanto haverá alguma coisa, no ambiente digital, que nos ajuda a crescer em humanidade e na compreensão recíproca? Devemos, por exemplo, recuperar um certo sentido de pausa e calma. Isto requer tempo e capacidade de fazer silêncio para escutar. Temos necessidade também de ser pacientes, se quisermos compreender aqueles que são diferentes de nós: uma pessoa expressa-se plenamente a si mesma, não quando é simplesmente tolerada, mas quando sabe que é verdadeiramente acolhida. Se estamos verdadeiramente desejosos de escutar os outros, então aprenderemos a ver o mundo com olhos diferentes e a apreciar a experiência humana tal como se manifesta nas várias culturas e tradições. Entretanto saberemos apreciar melhor também os grandes valores inspirados pelo Cristianismo, como, por exemplo, a visão do ser humano como pessoa, o matrimónio e a família, a distinção entre esfera religiosa e esfera política, os princípios de solidariedade e subsidiariedade, entre outros.

Então, como pode a comunicação estar ao serviço de uma autêntica cultura do encontro? E – para nós, discípulos do Senhor – que significa, segundo o Evangelho, encontrar uma pessoa? Como é possível, apesar de todas as nossas limitações e pecados, ser verdadeiramente próximo aos outros? Estas perguntas resumem-se naquela que, um dia, um escriba – isto é, um comunicador – pôs a Jesus: «E quem é o meu próximo?» (Lc 10, 29 ). Esta pergunta ajuda-nos a compreender a comunicação em termos de proximidade. Poderíamos traduzi-la assim: Como se manifesta a «proximidade» no uso dos meios de comunicação e no novo ambiente criado pelas tecnologias digitais? Encontro resposta na parábola do bom samaritano, que é também uma parábola do comunicador. Na realidade, quem comunica faz-se próximo. E o bom samaritano não só se faz próximo, mas cuida do homem que encontra quase morto ao lado da estrada. Jesus inverte a perspectiva: não se trata de reconhecer o outro como um meu semelhante, mas da minha capacidade para me fazer semelhante ao outro. Por isso, comunicar significa tomar consciência de que somos humanos, filhos de Deus. Apraz-me definir este poder da comunicação como «proximidade».

Quando a comunicação tem como fim predominante induzir ao consumo ou à manipulação das pessoas, encontramo-nos perante uma agressão violenta como a que sofreu o homem espancado pelos assaltantes e abandonado na estrada, como lemos na parábola. Naquele homem, o levita e o sacerdote não vêem um seu próximo, mas um estranho de quem era melhor manter a distância. Naquele tempo, eram condicionados pelas regras da pureza ritual. Hoje, corremos o risco de que alguns meios de comunicação nos condicionem até ao ponto de fazer-nos ignorar o nosso próximo real.

Não basta circular pelas «estradas» digitais, isto é, simplesmente estar conectados: é necessário que a conexão seja acompanhada pelo encontro verdadeiro. Não podemos viver sozinhos, fechados em nós mesmos. Precisamos de amar e ser amados. Precisamos de ternura. Não são as estratégias comunicativas que garantem a beleza, a bondade e a verdade da comunicação. O próprio mundo dos meios de comunicação não pode alhear-se da solicitude pela humanidade, chamado como é a exprimir ternura. A rede digital pode ser um lugar rico de humanidade: não uma rede de fios, mas de pessoas humanas. A neutralidade dos meios de comunicação é só aparente: só pode constituir um ponto de referimento quem comunica colocando-se a si mesmo em jogo. O envolvimento pessoal é a própria raiz da fiabilidade dum comunicador. É por isso mesmo que o testemunho cristão pode, graças à rede, alcançar as periferias existenciais.

Tenho-o repetido já diversas vezes: entre uma Igreja acidentada que sai pela estrada e uma Igreja doente de auto-referencialidade, não hesito em preferir a primeira. E quando falo de estrada penso nas estradas do mundo onde as pessoas vivem: é lá que as podemos, efectiva e afectivamente, alcançar. Entre estas estradas estão também as digitais, congestionadas de humanidade, muitas vezes ferida: homens e mulheres que procuram uma salvação ou uma esperança. Também graças à rede, pode a mensagem cristã viajar «até aos confins do mundo» (Atos 1, 8). Abrir as portas das igrejas significa também abri-las no ambiente digital, seja para que as pessoas entrem, independentemente da condição de vida em que se encontrem, seja para que o Evangelho possa cruzar o limiar do templo e sair ao encontro de todos. Somos chamados a testemunhar uma Igreja que seja casa de todos. Seremos nós capazes de comunicar o rosto duma Igreja assim? A comunicação concorre para dar forma à vocação missionária de toda a Igreja, e as redes sociais são, hoje, um dos lugares onde viver esta vocação de redescobrir a beleza da fé, a beleza do encontro com Cristo. Inclusive no contexto da comunicação, é precisa uma Igreja que consiga levar calor, inflamar o coração.

O testemunho cristão não se faz com o bombardeio de mensagens religiosas, mas com a vontade de se doar aos outros «através da disponibilidade para se deixar envolver, pacientemente e com respeito, nas suas questões e nas suas dúvidas, no caminho de busca da verdade e do sentido da existência humana (Bento XVI, Mensagem para o XLVII Dia Mundial das Comunicações Sociais, 2013). Pensemos no episódio dos discípulos de Emaús. É preciso saber-se inserir no diálogo com os homens e mulheres de hoje, para compreender os seus anseios, dúvidas, esperanças, e oferecer-lhes o Evangelho, isto é, Jesus Cristo, Deus feito homem, que morreu e ressuscitou para nos libertar do pecado e da morte. O desafio requer profundidade, atenção à vida, sensibilidade espiritual. Dialogar significa estar convencido de que o outro tem algo de bom para dizer, dar espaço ao seu ponto de vista, às suas propostas. Dialogar não significa renunciar às próprias ideias e tradições, mas à pretensão de que sejam únicas e absolutas.

Possa servir-nos de guia o ícone do bom samaritano, que liga as feridas do homem espancado, deitando nelas azeite e vinho. A nossa comunicação seja azeite perfumado pela dor e vinho bom pela alegria. A nossa luminosidade não derive de truques ou efeitos especiais, mas de nos fazermos próximo, com amor, com ternura, de quem encontramos ferido pelo caminho. Não tenhais medo de vos fazerdes cidadãos do ambiente digital. É importante a atenção e a presença da Igreja no mundo da comunicação, para dialogar com o homem de hoje e levá-lo ao encontro com Cristo: uma Igreja companheira de estrada sabe pôr-se a caminho com todos. Neste contexto, a revolução nos meios de comunicação e de informação são um grande e apaixonante desafio que requer energias frescas e uma imaginação nova para transmitir aos outros a beleza de Deus.

Vaticano, 24 de Janeiro – Memória de São Francisco de Sales – do ano 2014.

Franciscus
Fonte
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