Foto: Caras Ionut
É com imensa alegria que ganhamos esta semana um novo colaborador: nosso querido Marcelo Moraes Caetano, que já havia nos brindado há pouco tempo com um comentário que virou post esta semana ("Aqueles que são bem ditos", aqui). Neste texto, ele comenta algumas questões muito presentes recentemente em nossas discussões.
Eu hoje queria tratar de dois aspectos da Igreja Católica que a acompanham desde a sua fundação, feita pelo próprio Cristo.
Gostaria de falar da sua rigidez, porquanto perfeitamente fiel à vontade do Pai, anunciada por Jesus, e da sua flexibilidade, aparentemente paradoxal àquela primeira característica aludida, a rigidez.
Não vou retroceder aos tempos dos primeiros cristãos, dos catecúmenos. Prefiro restringir-me aos dias mais recentes, e observar como as duas características da Igreja, em vez de se oporem, se interpenetram e se complementam.
Antes de tudo, erra quem acredita que o dogma da infalibilidade significa que algo que foi postulado ou dito não poderá jamais ser revogado. O Papa é infalível; seus bispos, ministros, sacerdotes, todo o clero é infalível. Cremos nisso, com devoção e amor; se não crêssemos, não seríamos católicos, e não estaríamos aqui discutindo em prol de nossa vivência completa no catolicismo: simplesmente estaríamos fazendo o que bem nos aprouvesse e não debateríamos sobre os sacramentos e os dogmas da Igreja de Cristo, que amamos, e de que queremos participar sem sermos “invisíveis”.
Toquei no ponto da infalibilidade para voltar àquela dicotomia acima: rigidez X flexibilidade. E para refletir sobre a questão do ar insuflado no coração eclesial. Com efeito, “ar” é palavra que em grego é polissêmica, e significa ao mesmo tempo “alma”, “espírito” e “vento”, “fôlego” (cf. “ar”, do grego: “pneuma”; essa mesma polissemia ocorre em hebraico, cf: “ruach” = “ar” e “espírito”). O próprio Messias utiliza um trocadilho com essa polissemia, para ser instrutivo a seus discípulos: “Vede, o vento sopra onde lhe apraz, e vós ouvis a sua voz, porém não sabeis nem de onde vem, nem para onde vai. Assim acontece para quem nasce do Espírito” (Evangelho de São João). Jesus usou também um trocadilho quando usou a palavra “sefas”, que significa “pedra”, para dizer justamente a “Pedro” que lançasse a “pedra” fundamental de Sua Igreja, pondo-o como o seu apóstolo paráclito e pioneiro.
O ar da igreja, seu Espírito, é ao mesmo tempo causa e consequência (nesses aparentes paradoxos que só Deus pode solucionar) de sua infalibilidade, que por sua vez, sustenta-se no equilíbrio (como as asas de uma Divina Pomba, como a pomba que volta do dilúvio com o ramo de oliveira entre o bico, profetizando a nova aliança) entre rigidez (a pedra) e flexibilidade (o voo, o ar).
A Igreja precisa ser rígida, antes de tudo, porque sua fidelidade à Voz de Deus não lhe permite meias palavras, meios-termos. Outra razão é o fato de que a Igreja precisa manter a sua tradição, porque, se não a mantiver, os fiéis vão se indagar: “Por que frequentar uma instituição que não difere em nada do mundo aqui de fora?” Nós, fiéis da Igreja Católica Apostólica Romana, vamos a ela, frequentamo-la, antes de tudo, porque sabemos que, ali dentro, em comunhão com o Cordeiro de Deus, “estamos dentro do mundo, mas completamente fora dele”, como diz São João da Cruz. “Abraçar a cruz é uma loucura”, como dizia Santo Agostinho. É uma loucura porque significa estar no mundo e fora dele... O Bispo de Hipona usou a palavra “loucura” com esta intenção: “nadar contra a correnteza”. E, se vamos à Igreja, é porque necessitamos de seu ar, de seu Espírito.
Repito, pois: se a Igreja aceitar todas as modernidades, tudo o que é modismo, o que entra e sai da voga como um produto descartável qualquer, vai perder seu sentido, antes de tudo porque não estará mais anunciando a Lei de Deus, e, em seguida, porque seus fiéis não sentirão necessidade de comungar com o céu se este céu tiver se tornado mundano. Quem vai à igreja vai ao céu, está no céu. São Leonardo de Porto Maurício dizia que ser católico "...consiste em irdes à Igreja como se fôsseis ao Calvário, e de vos comportardes, diante do altar, como o faríeis diante do trono de Deus, em companhia dos Santos Anjos. Vede, por conseguinte, que modéstia, que respeito, que recolhimento são necessários para receber o fruto e as graças que Deus costuma conceder àqueles que honram, com sua piedosa atitude, mistérios tão santos".
A Igreja é – e precisa ser – rígida, tradicional. Esta é a sua infalibilidade. Sua infalibilidade existe porque tudo o que Pedro atar na Terra será atado no céu, e tudo o que ele desatar na Terra, assim o será no céu.
Mas, há a outra asa do Divino Espírito Santo, sem a qual a infalibilidade da Igreja não se sustentaria: a sua flexibilidade. Examinemos como isso se dá. Dizer que a Igreja não muda nunca, que nunca mudou, está muito distante da verdade, uma distância de côvados intermináveis, de estádios inteiros. Pedro mesmo aconselhou-nos que fôssemos tolerantes uns com os outros e que compreendêssemos uns aos outros. Jesus disse: Antes de chegardes ao altar e vos apresentardes para o Pai, ide até vosso irmão com quem vos desentendestes, e reconciliai-vos.
Duas palavras eu retiro daqui: ide e reconciliai-vos.
Cristo não disse: “Ide e julgai”.
Ide. Reconciliai-vos. Sede tolerantes. Compreendei-vos mutuamente.
A Igreja, como o Corpo de Cristo, também vai e se reconcilia com seu rebanho. Se não fizesse isso, não seria a nossa Igreja. É esta, precisamente, a marca do apostolado que levamos ao nos sabermos, de coração e alma, católicos, apostólicos, romanos. É esta, precisamente esta, a flexibilidade a que aludo. A legitimidade sobrepujando a legalidade. Os dons do Espírito soterrando a força por vezes aterrorizante de leis arcaicas e enferrujadas. Reconciliação. Se a Igreja fosse apenas rígida e tradicional, e se não buscasse a reconciliação, por meio de uma incrível flexibilidade ao longo de mais de 2000 anos (a instituição mais antiga do planeta), simplesmente não teria sobrevivido às intempéries históricas abjetas e hediondas às quais sobreviveu – fortalecida.
Os gays poderíamos estar em muitas outras religiões ou denominações cristãs que aceitam os gays, mas, com todo o respeito, profundo, que nutrimos por elas, por que preferimos nos manter católicos?
Exatamente porque confiamos na infalibilidade do nosso clero, cujo Pastor Divino é o nosso amado Papa. Palavra que é acróstico de “Petrus Apostolus, Princeps Apostolorum” (P.A.P.A.): “Pedro Apóstolo, Príncipe dos Apóstolos”. Nosso Papa é, sim, o Príncipe dos Apóstolos e o Sucessor legítimo e legal de São Pedro.
Por isso, como ensinou Pedro: “Sede tolerantes e buscai a compreensão mútua”.
A Igreja, então, muda, sim, para se reconciliar. Ela obedece a Cristo quando disse: “Ide e reconciliai-vos”. Ela não poderia fingir que esse mandamento não foi ordenado.
Para dar um primeiro exemplo: o Beato João Paulo II, em seu Pontificado, pediu perdão publicamente pelas omissões da Igreja durante o nazismo.
O Papa que estava naquele momento em sua missão pontifícia, Pio XII, foi “falível”?
Não! Ele não foi falível, mas a Igreja, ecclesia sancta et meretrix, igreja santa e pecadora, reconheceu uma omissão grave contra os seres humanos (nem os católicos, mas os judeus, ciganos, homossexuais e outras vítimas da sanha do Führer alemão), e, com a humildade de Cristo, pediu perdão ao seu pecado, confessando-se no sacramento da penitência, ao povo de Deus, Urbi et Orbi, a Roma e ao Mundo, frase dita por um sumo-Pontífice ao dirigir-se ao seu rebanho em bênçãos especiais, como a de Natal, de Páscoa e até mesmo, em alguns casos, a do início do compromisso como sucessor de São Pedro.
O Papa pediu perdão não porque seu predecessor tenha “errado”, mas porque, como Deus é o Senhor do tempo, ille tempore, ele viu que seu predecessor não estava vendo (ou até mesmo não estava conseguindo executar) algo crucial à manutenção do rebanho de Deus: a prática irrestrita da misericórdia a todos.
O Papa Pio XII não era nazista, como alardearam alguns livros mal informados. Sabe-se que ele escondeu milhares de judeus, homossexuais e perseguidos nos subsolos do Vaticano. Ajudou-os a fugir com a anuência de diplomatas, inclusive brasileiros, como Sousa Dantas (na França) e Guimarães Rosa e sua esposa, Aracy Guimarães Rosa (na própria Alemanha). Há um detalhe: o governo brasileiro na época era a favor do nazismo, e, ainda assim, esses e outros diplomatas brasileiros na Europa, junto com o Papa Pio XII, arriscaram não apenas seus cargos, mas suas vidas ao fazerem migrar judeus, ciganos, homossexuais, testemunhas de Jeová, comunistas e outros perseguidos para solos simpatizantes ao nazi-fascismo, como o era o Brasil, repito.
O Papa Pio XII foi um Pastor de valentia comparável à de um Santo Inácio de Loyola, e, embora diplomático (o que faz com que alguns o tenham na conta equivocada de omisso), lutou com todas as suas forças e poderes e hierarquias contra o nazismo.
Mas, ainda assim, João Paulo II pediu perdão pelas omissões cometidas por todo o clero durante o regime de Hitler. Porque houve omissões. Ou ao menos o Papa João Paulo II assim o sentiu, e, obedecendo ao seu coração, veio a público pedir perdão.
Houve, para dar continuidade à questão, outros membros do clero, padres, freiras, e até leigos valorosíssimos a favor dos direitos humanos em todos os momentos da História. Houve padres que foram a favor da Inconfidência Mineira (e morreram por causa disso), da Conjuração Baiana (Soror Joana Angélica morreu fuzilada e martirizada ao impedir, sozinha, que um exército invadisse seu convento). O Padre Fernando Bastos d´Ávila, e tantos outros, lutaram aguerridamente contra os abusos e desmandos da ditadura militar, recente no Brasil, pondo suas próprias vidas em risco para socorrer os perseguidos pelo status quo, pelo establishment terrível e iníquo que grassava. E os exemplos pelo mundo seriam praticamente infinitos.
Então voltando ao caso do Santo Padre João Paulo II, ele pediu perdão ao mundo. Ele foi e se reconciliou.
Foi uma atitude de humildade, e de flexibilidade. Ele não se constrangeu de admitir uma omissão grave por parte do clero e da sua então atitude enregelada, legalista, farisaica, omissa, condescendente. Antes, com total sinal de contrição, foi a público pedir perdão por um erro do qual ele, como Pontífice, seria co-responsável se não se confessasse. E, com isso, redimiu toda a Santa Igreja de um pecado que ela cometeu, sim, num passado bastante recente.
Assim, tempo chegará, certamente, em que a Igreja inteira há de perceber o equívoco que há em se banir um homossexual pelo simples fato de ele ser homossexual, e não por supostos frutos indevidos de sua videira, ou em exigir que esse homossexual se esconda da sociedade e se abstenha da sexualidade, do sexo, a não ser que ele tenha sido chamado, por Deus, em Jesus e no Espírito Santo, e só pela Santíssima Trindade, por mais ninguém, à vida em celibato e em castidade.
Não se julga uma árvore senão pelos seus frutos. Não se pode julgar um grupo de pessoas (todas as vezes que se fez isso, que qualquer instituição fez isso, inclusive a Igreja, errou; a diferença é que a Igreja reconhece seus erros e pede perdão por eles), não se julga um grupo inteiro, sem se atentar para as individualidades e singularidades que compõem este grupo. Não se diz “os homossexuais estão errados”, “as mulheres estão erradas”, “os negros estão errados” etc. Será que só há figueiras estéreis nesses grupos olhados de maneira tão truculentamente panorâmica? Einstein definia “estupidez” como a faculdade de não discernir. Nomear grupos e dar a todos que ali estão inseridos uma mesma característica – boa ou má, pecador ou santo – é estupidez, isso para ficarmos no campo do eufemismo.
Julga-se alguém – Deus julga alguém, fique bem claro – pelas suas obras, por seus frutos. Na parábola do joio e do trigo, Jesus deixa isso claro: o joio e o trigo, na aparência inicial, são idênticos; mas, ao crescerem, diferem um do outro; então – ensina o Salvador – deve-se atar o trigo para o pão num feixe o joio será amarrado e queimado. Onde haverá choro e ranger de dentes. Deus julgará a cada um de nós, independentemente dos “grupos” a que pertencemos, pelas nossas obras, nossos frutos, se fomos ou não capazes de multiplicar os talentos que ele nos deu, se, enfim, somo joio ou trigo.
Essa é a interpretação da misericórdia do Julgamento de Deus nos Dies Irae.
Por não se ter pensado assim, no passado, já se usou a Bíblia para se justificar a escravidão dos negros todos, um grupo (supostamente descendentes de Sem, filho enjeitado de Noé, o que também gerou o antissemitismo, pois os semitas seriam descendentes do mesmo Sem); a completa submissão das mulheres, todas elas, por causa do pecado original de Eva; o desprezo aos deficientes físicos, sem exceção, inscrito em Levíticos, que prescreve que eles não poderiam sequer se aproximar das proposições; e vários outros livros. Mas Cristo veio para redimir a todos esses “desterrados”. Cristo veio e salvou as prostitutas, os leprosos, os deficientes físicos de todo tipo, os publicanos, as mulheres, os samaritanos... Enfim, o médico veio por causa dos doentes, e não por causa dos sãos.
O médico veio para discernir. Para separar o joio do trigo. Para secar a figueira estéril e comer o fruto da figueira fértil. Ambas eram figueiras – do mesmo “grupo” – mas Cristo não julga “grupos”, julga indivíduos.
Cristo teria, então, vindo para remendar o Antigo Testamento? De jeito nenhum: ele veio para dar a chave da CORRETA interpretação do Antigo Testamento – o amor. Sem o amor, o verbo não teria se feito carne, e nem habitado entre nós. “Ainda que eu fale a língua dos homens, e que eu fale a língua dos anjos, sem amor, eu nada seria” – ensinou Paulo. Cristo veio confirmar a Lei, mas a sua confirmação é esta: ser lida em Espírito, em amor, e não em formalidade, em farisaísmo.
O homossexual vive uma vida de dores e alegrias exatamente igual à dos heterossexuais. Simone de Beauvoir, em seu livro “O segundo sexo”, diz algo que parafraseio aqui: “Homens, mulheres, homossexuais, todos gozam alegrias e padecem dores iguais; todos caminham na estrada da consciência da vida, e suas éticas não estão, de forma alguma, ligadas às suas manifestações íntimas”.
Portanto, ser infalível não significa dizer que o tempo não revelará que as atitudes tomadas em dado momento estavam incorretas. Ou melhor: as atitudes estavam corretas PARA AQUELE momento, mas isso não significa que não tenham de ser revistas, reconciliadas, e, em muitos casos, alvo de pedido de perdão público até mesmo de um Papa, que, exatamente por ser um Papa, sabe que o sacramento da penit~encia pode ser necessário à Igreja como um todo, porque ela, instituição que também é formada por seres humanos, pode pecar.
Ser infalível significa que o clero age com a mais perfeita intenção, inspirado, sim, pelo Espírito Santo. E disso, nenhum de nós duvida.
Mas ser infalível também significa que, inspirado pelo mesmo Espírito Santo, o mesmo clero, em tempo vindouro, poderá reconhecer que 1) poderia ter feito mais do que fez, ou que 2) não deveria ter feito algo que fez, ou que 3) deveria ter feito algo que não fez.
Particularmente, eu, como católico praticante, em muitos momentos já me indispus com atitudes do clero que eu considerava demasiadamente farisaicas, e, como sempre faço, expressei-me publicamente acerca de minha indignação. Hoje, no entanto, compreendo exatamente a dicotomia da infalibilidade, que reside, como foi dito, na rigidez necessária e na flexibilidade, cujo tempo de maturação pertence a Deus, Senhor dos Plantios e das Colheitas.
Todos nós, católicos, quer outros católicos nos aceitem, quer não aceitem e resistam em nos apedrejar, todos nós, sem exceção, somos o corpo de Cristo. Cristo, na missa, está na Palavra, na Hóstia e na Assembleia, isto é, em nós todos. Para Cristo, não faz diferença que sejamos condenados por outros católicos: o que importa é o nosso coração ali presente. O que Deus vê é o coração – sursum corda – corações ao alto. Deus não olha os nossos pecados, mas a fé que anima a Sua Igreja. Nossa prestação de contas é no sacramento da penitência. Não somos obrigados, nem mesmo do ponto de vista civil (há leis civis que nos protegem) a sermos achincalhados, hostilizados pelo que quer que sejamos.
Somos singulares, a nossa prestação de contas a Deus será individual. Cristo disse que veio e separará, da mesma FAMÍLIA (mesmo grupo) pai de mãe, filho de filha, irmão de irmã. Por Cristo discerne, não juga a FAMÍLIA, o GRUPO, mas a PESSOA, o FRUTO, os TALENTOS
O Papa Bento XVI disse, na Homilia pelo início do seu Ministério Petrino, em 24 de abril de 2005: "Queridos amigos, neste momento eu posso dizer apenas: rezai por mim, para que eu aprenda cada vez mais a amar o Senhor. Rezai por mim, para que eu aprenda a amar cada vez mais o seu rebanho, a Santa Igreja, cada um de vós singularmente e todos vós juntos. Rezai por mim, para que eu não fuja, por receio, diante dos lobos."
Não teremos nós, tampouco, medo de lobos astuciosos, que se escondem sob pele de cordeiro, que odeiam nossas singularidades, ressaltadas pelo Santo Padre em sua primeira oração e exortação pública; lobos que são “modelos sociais”, “padrões”, mas que, no íntimo, tramam, quiçá, contra seus semelhantes, com um coração imundo, coração este que Deus sonda, observa, conhece, muito mais do que rostos contritos e convolutos em pé diante do altar, nas primeiras fileiras e nos lugares de honra dos banquetes, comendo o pão de Cristo como Judas Iscariotes comeu, com o coração doloso, intentando o mal, eretos, pomposos, augustos, junto aos escribas e doutores da lei...
Aquela mesma lei que mataria... se o Ar do Espírito não a vivificasse...
A infalibilidade da Igreja lhe concede, pois, o anúncio da Vontade de Deus, com a rigidez que isso venha a requerer, e o reconhecimento das próprias faltas e pecados, numa flexibilidade que lhe permite pedir perdão não como um ato ignominioso ou vexatório, mas, antes pelo contrário, como uma atitude digna de quem se comprometeu completamente ao Ministério de Cristo: a Piedade e o Perdão, inclusive a si mesmo, pelas faltas cometidas no passado.
Não nos enganemos com falsos messias que vêm bradando a palavra seca da Bíblia como navalha. O mundo está cheio de seitas que se arrogam cristãs e cujo artifício de sedução (seduzir é a arma do demônio, que é o pai da mentira, como ensina São João Evangelista) é exatamente o uso da Bíblia como um gládio, um punhal, uma mortalha de chumbo sobre os ombros, um discurso histérico e fundamentalista que insiste na “leitura” formalista e farisaica das Sagradas Escrituras, sem admitir nenhuma possibilidade de que aquela interpretação, dada por seres humanos, possa sequer estar errada. São pessoas que, ao que parece, acham-se Deuses – ou o próprio Deus? – na Terra.
Não é essa a Igreja que conhecemos. Não é essa a Igreja que amamos.
Cristo, nossa cabeça, está dirigindo o corpo eclesial, do qual nós todos fazemos parte, quer nos aceitem, quer nos repudiem. (Aliás, se nos repudiarem, em nome de Cristo, seremos exatamente aqueles últimos que virão a ser os primeiros.) E é essa cabeça, só essa, que tem o poder de julgar quais os corações que contêm impurezas e quais aqueles que se apresentam diante do altar com o coração sedento de Deus e de Misericórdia. INDEPENDENTEMENTE DA FAMÍLIA, GRUPO, ORIGEM ÉTNICA, SOCIAL, CULTURAL, SEXUAL. Deus não julga grupos: Deus julga pessoas. Até no dilúvio, Deus salvou quem merecia ser salvo. Até Lot foi salvo, enquanto sua própria esposa se tornava uma estátua de sal no extermínio de Sodoma. Deus salvou quem tinha de ser salvo. Até entre os samaritanos, havia um que se curvou para socorrer seu rival, o bom samaritano. Até entre os centuriões houve um sobre cuja fé Jesus afirmou nunca ter visto outra semelhante, que lhe disse: “Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha morada, mas dizei uma só palavra e serei salvo”. Até entre os dois bandidos que foram crucificados com Jesus houve discernimento. Jesus não julgou a “categoria”, o “grupo” dos bandidos: ao contrário, um deles foi salvo (São Dimas, o primeiro santo canonizado na Igreja Católica) e outro não. Até entre os apóstolos de Jesus, seu próprio “grupo”, houve uma PESSOA que o traiu: Judas Iscariotes.
Se Deus julgasse grupos e não pessoas, não poderia haver um Judas Iscariotes exatamente no grupo de Seu Filho Unigênito.
(A propósito, São Tomás de Aquino e São Gregório Magno afirmam que a perdição de Judas não se deu no ósculo detrator, mas, antes disso, quando Judas Iscariotes comeu do pão e bebeu do vinho da Santa Ceia já com o coração mal-intencionado. Um alerta, avisam-no-lo os dois santos escolásticos, àqueles que participam da Eucaristia da Missa com o coração cheio de intriga e dolo em relação ao seu semelhante.)
Eu obedeço ao Papa, a quem amo profundamente, pois sei que o Santo Padre Bento XVI é um enviado de austeridade e transparência inigualáveis, discreto, atento, sensível, erudito, inspirado, rígido e flexível, como todo Pai deve ser, e faço o que ele manda: rezo por ele, para que, como ele nos exortou, ele “aprenda cada vez mais a amar o Senhor. Aprenda a amar cada vez mais o seu rebanho, a Santa Igreja, cada um de nós singularmente e todos nós juntos.”
Rezo por vós, meu amado Papa, “para que vós não fujais, por receio, diante dos lobos”.
Por isso, eu repito que, na rigidez e na flexibilidade, frutos sagrados da infalibilidade com que o próprio Cristo dotou Sua Igreja, reside a pedra fundamental e o ar do Espírito Santo que conferem a essa mesma Igreja o Sopro de Vida da Eternidade. Pelos séculos dos séculos. Tweet
3 comentários:
:)
Que bom!
Esperamos de coração aberto que mesmo que vc discorde, nossos distintos pontos de vista possam enriquecer um ao outro sempre.
Também nos sentimos feliz!
Um fraterno e carinhoso abraço;
Equipe Diversidade Católica
Eu entendi o seu ponto e você tem razão sim.
Não discordo do que vc colocou...só olho teu argumento sob um outro ponto de vista.
Tivemos um tempo atras uma reflexão sobre questões parecidas com a sua.
Veja:
http://diversidadecatolica.blogspot.com/p/gratuidade-e-incondicionalidade-do-amor.html
:)
Concordo com vc!
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