domingo, 27 de novembro de 2011

Estar vigilantes para despertar os demais…


“A nossa espera é, ao mesmo tempo, contemplativa e ativa. Quando é contemplativa, voltada para outro diferente de nós, chama-se esperança. Quando se põe em obra, chama-se vontade”.

A reflexão é de Raymond Gravel, sacerdote do Quebec, Canadá, publicada no sítio Culture et Foi, comentando as leituras do 1º Domingo de Advento (27 de novembro). A tradução é de Susana Rocca.

Eis o texto, aqui reproduzido via IHU, com grifos nossos.


Referências bíblicas:
1ª leitura: Is 63,16-17.19; 64,2-7
Evangelho: Mc 13,33-37

O tempo do Advento, que significa vinda, retorna a cada ano. Este tempo, independentemente do evangelista do ano em curso, é um tempo de espera, um tempo de vigilância, um tempo de conversão, um tempo de alegria, um tempo de vigília. A palavra vigília que caracteriza o tempo de Advento deve sempre ser nova, se quisermos que o Advento não seja uma repetição dos Adventos precedentes. Não é por acaso que, no Evangelho de Marcos deste 1º Domingo do Advento, a palavra vigiar retorna quatro vezes em cinco versículos.

1. Fiquem vigiando! (Mc 13,37): O verbo vigiar tem dois sentidos…

Vigiar… no sentido de espera de uma vinda ou um acontecimento que não chegou, que não começou ainda. Esperar alguém que veio; mas esperar dessa maneira é ainda mais inquietante, se a pessoa demora a vir… É uma espera passiva e mesmo desesperadora. Há muitas pessoas que esperam Deus dessa maneira ou que esperam o fim do mundo, como um acontecimento próximo. É uma espera desesperadora, sendo que faz milhares de anos que se aguarda e esta atitude não mudará nada em milhares de anos ainda. No fundo, é uma espera inútil, porque este alguém ou este algo nunca virá.

Exemplo: Isso me faz pensar naquela história do homem que está numa região inundada. A água sobe sem parar; até sua estatura. Uma barca se aproxima dele: O senhor gostaria de subir a bordo? Não, disse o homem, creio em Deus e ele virá me salvar. A água continua subindo; o homem tem água até os ombros. Uma embarcação se aproxima e o convida a embarcar; o homem recusa e diz: Deus vai me salvar. A água continua sempre subindo até ao queixo dele; um helicóptero desce para socorrê-lo e o homem sempre se recusa… Deus vai vir me salvar! Finalmente, o homem se afoga, porque a água continuou subindo. Chegado ao outro lado da vida, o homem fala para São Pedro: Como é possível que Deus não viesse ao meu socorro? Sou crente, católico e eu esperei ele. E São Pedro lhe responde: Deus te enviou uma chalupa, uma embarcação e um helicóptero, e tu não quiseste ser socorrido. Que mais queres ainda?

Esperar passivamente, sentados numa igreja, que Cristo venha mudar alguma coisa no mundo, é utópico e ilusório... A gente pode aguardar a vida toda e nunca acontecerá nada. Há 2000 anos, no entanto, têm-se cristãos que, dessa maneira, estão vigilantes.

Velar no sentido de reconhecer um evento já começado, já chegado. Isso nos impulsiona a agir; leva-nos a descobri-lo. Esperar alguém que está já lá é procurar conhecê-lo, encontrá-lo. Isso me torna ativo, vigilante e atento. A gente se sente preocupado na espera; vigia-se atentamente. É este segundo sentido que se deve dar ao verbo vigiar no Evangelho de Marcos e é esta espera ativa que está em questão nos textos bíblicos de hoje e ao longo de todo o Advento. Se não fosse assim, o Advento seria inútil e ilusório.

Como dizia o exegeta France Quéré: “O Advento entrecruza duas propostas verdadeiras quando ficam juntas: o futuro se fará para nós, da mão do Senhor que nos ama, mas se fará também por nós, como se nós estivéssemos sós. A nossa espera é, ao mesmo tempo, contemplativa e ativa. Quando é contemplativa, voltada para outro diferente de nós, chama-se esperança. Quando se põe em obra, chama-se vontade”. Por conseguinte, são necessárias essas duas atitudes para que o nosso Advento 2011 seja significativo e necessário.

2. A desilusão: Na primeira leitura de hoje, tanto no tempo do terceiro Isaías como após o Exílio, passa-se da consolação (Is 40-55) à desilusão (Is 56-66). O que acontece? É o retorno do Exílio: a reinstalação dos repatriados é difícil, dado que as suas terras são ocupadas por estrangeiros. O templo não está reconstruído e tem-se a impressão que Deus abandonou o seu povo, por estar tão discreto e silencioso. É então que um profeta, o terceiro Isaías, implora ao céu: “Ah! Se rasgasses o céu para descer! Diante de ti as montanhas se derreteriam”. (Is 63,19). Por conseguinte, o autor faz referência à manifestação de Deus no monte Sinai, nos relâmpagos e no trovão.

Não estamos, hoje, numa situação semelhante, no plano social e político? Estamos em plena crise econômica. Trabalhadores perdem o seu emprego; países inteiros estão quase na falência; pessoas idosas veem afundar a economia de toda a sua vida. As nossas lideranças não se entendem: é a crise. Eleição após eleição e continua-se no mesmo ponto. Tem-se a impressão que não se caminha a lugar nenhum. E ninguém ousa falar de valores espirituais. Querendo separar a Igreja do Estado, evacuou-se completamente qualquer referência religiosa na nossa sociedade chamada leiga. Penso que teríamos necessidade de um profeta Isaías que implorasse aos céus para intervir a fim de reencontrar o caminho que conduza à esperança.

3. A responsabilização: O terceiro Isaías reconhece que Deus não pode fazer nada sem nós: “Vens ao encontro do que pratica a justiça com alegria e que se recorda de você que segue o teu caminho” (Is 64,4). No fundo, não é tudo crer em Deus, é necessário esperá-lo. Não é tudo esperá-lo passivamente; devemos igualmente participar. Mas uma coisa é certa: apesar dos nossos erros e pecados, somos salvos: “Ficaste irritado conosco, porque há muito tempo pecamos contra ti e fomos rebeldes” (Is 64,4). E por quê? Porque lhe pertencemos: “Mas agora, Javé, tu és o nosso pai; nós somos o barro, e tu és o oleiro: todos nós somos obra de tuas mãos” (Is 64,7).

Hoje, no nosso mundo secularizado, será que temos a humildade de reconhecer que precisamos de Deus? Somos conscientes também que Deus não pode fazer nada sem nós? Não está aí a necessidade de velar, de esperar com vigilância, fazendo renascer a esperança no meio das nossas vidas? É a única maneira de mudar a situação…

4. Uma espera ativa: Outras vezes, o evangelista Marcos nos convida a vigiar. O mestre saiu de viagem e nos confiou a sua casa. Ele deve voltar, pois ele é o proprietário. Aqui, São Marcos faz referência a Cristo ressuscitado e glorificado que a confiou aos seus discípulos, à Igreja que somos nós. A cada um ele deu uma responsabilidade: “Vai acontecer como a um homem que partiu para o estrangeiro. Ele deixou a casa, distribuiu a tarefa a cada um dos empregados e mandou o porteiro ficar vigiando” (Mc 13,34). Ele deu todo poder aos seus servidores, Cristo também deu a possibilidade de não fazer nada, e é talvez essa a impressão que temos quando olhamos para a nossa Igreja de hoje. E, no entanto, a incerteza do retorno: “pode ser à tarde, à meia-noite, de madrugada ou pelo amanhecer” (Mc 13,35), não deve nos subtrair das nossas responsabilidades. Deve-se não somente vigiar, mas também despertar os outros. E para fazer isso precisamos novidade. É necessário assumir riscos, afrontar novos desafios e empreender caminhos ainda inexplorados. É necessário renascer à esperança, esperá-lo em tudo e fazer tudo esperando. Isso é uma espera ativa, que deve caracterizar o nosso Advento 2011.

Terminando, quereria simplesmente citar o fundador dos Jesuítas, Santo Inácio de Loyola, que dizia com sabedoria: “Que a primeira regra das vossas ações seja agir como se o sucesso dependesse de vocês e não de Deus, e a segunda regra, abandonar-se em Deus, como se ele fizesse tudo em vosso lugar”.

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