Foto: Marcel Lammerhirt
“Assim, a veste nupcial não é uma roupa que devemos comprar para participar da festa de casamento; as pessoas são convidadas nas encruzilhadas, nas ruas, assim como elas são. A veste nupcial diz o que nós nos tornamos quando participamos da festa de casamento, organizada pelo Deus da Nova Aliança. No fundo, aceitar o convite, responder ao chamado, é aceitar nos deixar transformar por Cristo para nos tornarmos como ele. É revestir-se de Cristo; é tornar-se o Cristo ressuscitado.”
A reflexão é de Raymond Gravel, sacerdote do Quebec, Canadá, publicada no sítio Culture et Foi, comentando as leituras deste domingo, 28º Domingo do Tempo Comum (09 de outubro). A tradução é do Cepat, aqui reproduzida via IHU, com grifos nossos.
Eis o texto.
Referências bíblicas:
Primeira leitura: Is 25, 6-9;
Evangelho: Mt 22, 1-14.
Depois da parábola do pai e dos dois filhos (26º domingo do Tempo Comum, Ano A) e aquela dos vinhateiros homicidas (27º domingo do Tempo Comum), esta é a terceira parábola do Reino que Mateus nos conta em duas partes, que parecem, à primeira vista, se contradizer. Mas, na verdade, trata-se de duas parábolas que são complementares: a parábola do banquete aberto a todos (Mt 22, 1-10) e a parábola da veste nupcial exigida de todos (Mt 22, 11-14). Como devemos entendê-las?
1. A parábola do banquete aberto a todos (Mt 22,1-10). Nesta primeira parte do Evangelho de hoje, ou melhor, a parábola do banquete, Mateus lembra-nos que o cristianismo não está reservado para uma elite. Todos, independentemente de quem somos e do que fazemos, somos convidados pelo Senhor para a grande festa do Reino: “Ide, pois, às encruzilhadas dos caminhos e convocai para o banquete todos aqueles que encontrardes” (Mt 22, 9).
Já no Antigo Testamento, o Livro de Isaías no trecho de hoje, o profeta fala de um grande banquete onde todos são convidados: “Javé dos exércitos vai preparar no alto deste monte, para todos os povos do mundo, um banquete de carnes gordas, um banquete de vinhos finos, de carnes suculentas, de vinhos refinados” (Is 25, 6). Mas que festa é essa? Esta é a festa messiânica prometida pelos profetas. Para os cristãos que releem Isaías, esta é a nova Aliança selada na morte e ressurreição de Cristo. Esta esperança em um mundo novo não é uma invenção cristã. Ela pode ser encontrada no profeta Isaías: “Dir-se-á, nesse dia: É ele o nosso Deus. Nós esperamos nele e ele nos liberta. É o Senhor em quem pusemos nossa esperança. Exultemos, jubilosos, pois ele nos salva” (Is 25, 9).
Então, Mateus, inspirando-se no profeta Isaías também fala de uma festa, de um banquete em que o rei (Deus) casa seu filho (Jesus). Deus convida, primeiro, seus convidados de qualidade: os sacerdotes, os fariseus, os escribas, os líderes do povo: “Ele mandou seus servos chamarem os convidados às núpcias. Mas eles não quiseram vir” (Mt 22, 3). Mas Deus insiste: “Ele mandou ainda outros servos com o encargo de dizer aos convidados: ‘Eis que eu preparei o meu banquete, os meus touros e meus animais cevados já foram degolados, tudo está pronto, vinde às núpcias’” (Mt 22, 4). Mais uma vez, os eleitos ficaram indiferentes: “Mas eles, sem fazer caso, foram-se um para seu campo, outro para seu negócio” (Mt 22, 5). E pior ainda, e Mateus não faz referência ao que aconteceu historicamente, ele disse apenas que alguns atacaram os servos, os profetas: “Os outros, agarrando os servos, maltrataram-nos e os mataram” (Mt 22, 6).
O evangelista refere-se à destruição de Jerusalém pelos babilônios em 587 a.C., quando os líderes de Israel ficaram surdos aos apelos dos profetas e também se refere à destruição de Jerusalém pelos romanos em 70 d.C., onde havia uma relação muito tensa entre o farisaísmo e a comunidade cristã de Mateus. Em ambos os casos, trata-se da recusa das autoridades eleitas (os principais sacerdotes e fariseus) em reconhecer a nova Aliança no Cristo Pascal: “Então, ele disse a seus servos: ‘O banquete está preparado, mas os convidados não eram dignos dele’” (Mt 22, 8). E assim, o convite é agora feito a todos, sem exceção: “Ide, pois, às saídas dos caminhos e convocai para o banquete todos aqueles que encontrardes” (Mt 22, 9).
A mensagem de Mateus é dizer que a salvação é universal e que nenhuma exigência moral é demandada: “Estes servos partiram pelos caminhos e reuniram todos os que encontraram, maus e bons. E a sala do banquete ficou cheia de convivas” (Mt 22, 10). Isto significa que na Igreja, na sala do banquete, você não pode negar o acesso ou a entrada baseado na moral ou numa questão de gênero, de raça, de sexo ou de cultura. Todos são chamados e convidados. A salvação é oferecida generosa e gratuitamente.
2. A parábola da veste nupcial (Mt 22, 11-14). Na segunda parábola, parece haver uma contradição: se todos estão convidados para o casamento, então por que a necessidade de usar roupas especiais? Na sua versão longa, a parábola do Evangelho de hoje nos dá um toque curioso, não encontrado em Lucas. De fato, em Mateus, vemos uma espécie de paradoxo entre a gratuidade da salvação oferecida a todos e a exigência de usar uma veste nupcial para aqueles que respondem positivamente ao convite. Como devemos entender essa aparente contradição?
A resposta é simples: quando aceitamos o convite que nos e graciosamente feito, responder é aceitar celebrar isso por que nós nos reunimos. Isto significa que, ao participar das núpcias do filho do Rei, o Cristo ressuscitado, nós devemos aderir a ele; vestir a veste nupcial é revestir-se do próprio Cristo, tornando-se como ele. São Paulo, na carta aos Gálatas, escreve: “Sim, vós todos que fostes batizados em Cristo vos revestistes de Cristo” (Gl 3, 27). Assim, a veste nupcial não é uma roupa que devemos comprar para participar da festa de casamento; as pessoas são convidadas nas encruzilhadas, nas ruas, assim como elas são. A veste nupcial diz o que nós nos tornamos quando participamos da festa de casamento, organizada pelo Deus da Nova Aliança. No fundo, aceitar o convite, responder ao chamado, é aceitar nos deixar transformar por Cristo para nos tornarmos como ele. É revestir-se de Cristo; é tornar-se o Cristo ressuscitado.
Para terminar, gostaria apenas de compartilhar um comentário do exegeta francês Jean Debruynne que faz uma diferença entre os eleitos e os chamados: "É sempre o mundo das parábolas. Desta vez, trata-se daquela das núpcias. Ela conduz diretamente ao dilema: é melhor ser chamado ou ser eleito? Mas colocar a questão desta forma já é uma prisão. É abrir o caminho para o privilégio, para o benefício e o melhor rendimento qualidade-preço. Os eleitos estão na defesa de seus privilégios. Eles têm direitos adquiridos. Eles estão segurando seus direitos. Os chamado não têm nada. Os chamados são aqueles que não têm nenhum mérito, nenhum direito. Eles devem o que são à ternura de Deus". Tweet
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