Foto: Elena Kalis
Das altas cátedras, os papas falam de casais e da convivência, e o mundo verdadeiro se encontra em um outro lugar.
A reportagem é de Marco Politi, publicada no jornal Il Fatto Quotidiano, 07-06-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto, aqui reproduzida via IHU, com grifos nossos.
Há uma distância sideral entre a Igreja doutrinária e a vida real de homens e mulheres, jovens e maduros, ao longo deste século XXI, a tal ponto de desencorajar até mesmo o debate.
Na Croácia, Bento XVI mais uma vez – assim como, antes dele, o Papa Wojtyla – condenou as convivências, associando-as à leveza inconsciente de quem "reduz o amor a emoção sentimental e a satisfação de pulsões instintivas, sem se comprometer a construir laços duradouros de pertença recíproca e sem abertura à vida". Paola Concia tem razão ao responder com uma piada: "Certo, deixemos que os casais gays se casem".
Porque a família que é descrita dos púlpitos não tem nenhum contato com o que acontece na sociedade. Deixemos estar as atitudes subjetivas e as embriaguezes passageiras. O nó de fundo é que desapareceu a velha instalação da família – da forma como se ergueu ainda até o final da Segunda Guerra Mundial – dos camponeses, dos operários, dos burgueses grandes e pequenos que se casavam entre os 20 e os 30 anos. Que tinham diante de si os trilhos de perspectivas substancialmente estáveis, comuns, sem grandes choques culturais.
Essa família não existe mais. O que a Igreja-instituição é capaz de dizer aos jovens homens e mulheres que conseguem criar uma vida economicamente mais ou menos "sistematizada" (e muitas vezes menos do que mais) no final dos 30 anos senão em torno aos 40 anos? O que eles deveriam fazer nas duas décadas de intervalo entre a puberdade e o matrimônio ou a convivência? "Pecar" solitariamente ou em dois, correndo depois para o confessionário... esperar o príncipe encantado e a rainha dos sonhos?
Há um falar abstrato dos púlpitos que fecha os olhos diante da realidade, em nada composta na sua grande maioria por "pecadores" ou hedonistas, mas sim por homens e mulheres que buscam o seu próprio caminho. E consideram positivas as relações pré-matrimoniais, pôr-se à prova, experimentar a proximidade dos corpos e dos temperamentos, porque não faz sentido embarcar em naufrágios.
O velho modelo já não se mantinha em pé nas almas mais virtuosas, mas no mero fato da subordinação da mulher, que, tendo uma vez entrado na estrutura do matrimônio, "ali ficava", enquanto o homem continuava sentindo que sua própria liberdade estava garantida.
Não é mais assim. O divórcio foi assumido por centenas de milhões de pessoas – totalmente pacatas, equilibradas, não consumistas – como um dado de valor. E justamente. O desvalor é o fracasso de um laço, o fim de um projeto, a deterioração de uma vida juntos. Não a responsabilização pelo fim. Dissolver uma relação quando não há mais "comunhão" e comunicação é positivo, libertador, vivificador.
Vive-se juntos de muitos modos hoje. Formam-se casais heterossexuais ou gays fortemente solidários, que aceitam também a perspectiva de que, um dia, os caminhos podem se separar. Porque cresceram com ritmos diferentes, porque não se compartilha mais o mesmo projeto.
Casa-se, separa-se, convive-se, vive-se sozinho, casa-se novamente, vive-se em casas separadas. O antigo modelo não existe mais. Há muito tempo. Não é o sinal de um arbítrio desenfreado. É o produto de uma sociedade que torna todos mais mononucleares. Uma sociedade marcada fortemente também pela incerteza econômica. Uma sociedade mais móvel, mais líquida.
Quando o cardeal Bagnasco descreve a juventude italiana como "geração não ouvida", sem futuro – captando a angústia decorrente da perene precariedade –, é preciso depois entender (como fazem os párocos há décadas) que ruiu o contexto em que casais esperançosos se aproximavam do altar ou iam ao cartórios assim que completavam 20 anos.
Isso quer dizer que a Igreja não tem mais espaço para transmitir valores evangélicos nas relações entre homem e mulher, entre pessoa e pessoa, entre pais e filhos? Não, absolutamente. Ela tem muito a dizer a respeito: a ternura, o amor, o perdão, o carinho, a paciência, o esforço, a solidariedade, o sacrifício, a partilha, a responsabilidade. Tudo isso que concerne ao núcleo daquele mandamento atemporal que diz: "Ama o teu próximo como a ti mesmo". Porque, como explicam os exegetas, somente reconhecendo o Outro semelhante a mim, eu e nós podemos viver em paz, em serenidade.
E muito, naturalmente, pode vir de uma mensagem religiosa para a dimensão educativa, aquele mundo complicado, fascinante, sempre a ser explorado, em que os pais fazem com que os filhos cresçam de modo que sejam maduros e independentes.
Mas, para reencontrar a escuta das novas (e nem tão novas) gerações, a Igreja deveria abandonar a obsessão de controlar o território da sexualidade e das relações interpessoais, como ocorreu nos séculos passados. Essa época não voltará mais. Os jovens que louvavam Wojtyla no jubileu de Tor Vergata, depois, debaixo das barracas, felizes, faziam amor.
Se, depois, o uso das palavras papais deve servir para perpetuar o veto a uma legislação sobre os casais de fato, é hora de dizer basta àqueles políticos que, legitimamente, vivem suas próprias vidas e depois pretendem – entre um sinal da cruz e outro – enjaular com vetos as existências alheias. Tweet
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