Uma bela reflexão sobre o modo de conhecer o mundo da ciência, que leva a um questionamento: por que esse modo de conhecer e dar sentido ao mundo seria incompatível com a fé, e não complementar? A dicotomização entre ciência e espiritualidade, razão e fé serve apenas, a nosso ver, para alimentar radicalismos e intolerâncias. Muito mais proveitoso é trabalhar nos pontos de convergência e, em vez de tratá-las como incompatíveis, encará-las como formas complementares de compreender o mundo e lidar com a realidade. :-)
Eis o artigo, aqui reproduzido via IHU.
Do jeito que a ciência é ensinada nas escolas, não é à toa que a maioria das pessoas acha que o conhecimento científico cresce linearmente, sempre se acumulando.
No entanto, uma rápida olhada na história da ciência permite ver que não é bem assim: o caminho que leva ao conhecimento é tortuoso e, às vezes, vai até para trás, quando uma ideia errada persiste por mais tempo do que deveria.
Isso pode ocorrer por razões como censura política (veja o caso de Trofim Lysenko durante o regime stalinista na União Soviética) ou por ideologias na classe científica, promulgadas por membros influentes.
Apresentar a ciência nas escolas e universidades ou nos meios informais de comunicação como um triunfalismo infalível da civilização esconde um de seus lados mais interessantes: o drama da descoberta, as incertezas da criatividade.
Cientistas tendem a reagir negativamente às ideias que ameaçam o status quo. Por um lado, esse ceticismo é essencial, dado que a maioria das ideias novas está errada. Por outro, ele pode revelar um conservadorismo que atravanca o avanço do conhecimento.
Um bom exemplo disso é o experimento de Albert Michelson e Edward Morley, realizado em 1887 para detectar o movimento da Terra através do éter, o meio material cuja função era servir de suporte para a propagação das ondas de luz.
Tal qual as ondas de som se propagam no ar, supunha-se que as ondas luminosas também necessitassem de um meio para se propagar, o éter. O experimento mediria as diferenças na velocidade da luz quando um raio luminoso ia contra o éter ou a favor, como quando andamos de bicicleta e sentimos um "vento" contra nosso corpo. (Uma bola jogada contra ou a favor do "vento" terá velocidades diferentes.)
Para total e completa surpresa da comunidade científica, o experimento não detectou diferenças na velocidade da luz em qualquer direção.
Em meio à perplexidade generalizada, várias tentativas de explicar o achado foram propostas, inclusive uma por George Fitzgerald e Hendrik Lorentz que sugeria que as hastes do aparato podiam encolher na direção do movimento. Esse encolhimento de fato existe, mas não como proposto pelos dois.
Apenas em 1905 Einstein explicou o que estava acontecendo, com sua teoria da relatividade especial: o éter não existe - a velocidade da luz é sempre a mesma, uma constante da natureza.
Observações recentes andam questionando a existência de um outro meio material ainda não detectado, a matéria escura. Essa matéria, supostamente feita de partículas diferentes das que compõem o que conhecemos no Universo (ou seja, coisas feitas de elétrons, prótons e nêutrons), deve ser seis vezes mais abundante que a matéria comum e se aglomerar em torno de galáxias, inclusive a nossa.
As observações não detectaram a quantidade esperada de matéria escura. E agora? A coisa é complicada porque existem outros métodos de detecção da matéria escura que parecem bastante claros. Qualquer que seja a resolução do impasse atual, estou certo de que algo de novo e surpreendente está para acontecer. Será interessante ver a reação da comunidade ao se deparar com o inesperado.
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