segunda-feira, 27 de junho de 2011

É possível o diálogo entre o movimento LGBT e religiosos

Ilustração: Sage Vaughn

Estudiosa defende que movimento deve buscar interagir com religiosos que vivem sua sexualidade, ainda que lideranças sejam mais reacionárias.

Publicado no site da APOGLBT SP em 14/06/2011. Reproduzido com grifos nossos (mais uma dica preciosa do amigo Teleny! ;-).


No último sábado (11), o 9º. Ciclo de Debates discutiu as relações entre religião, Estado e movimento LGBT. A pesquisadora associada do Núcleo de Estudos para Prevenção da AIDS (NEPAIDS/USP), Cristiane Gonçalves da Silva, defendeu, na ocasião, que é possível dialogar com a base de religiosos, independente do reacionarismo que têm manifestado suas lideranças parlamentares e clericais. De acordo com sua pesquisa de doutorado, quando entrevistou jovens de várias denominações e matrizes religiosas, existe espaço para um debate realista sobre direitos sexuais e reprodutivos.

Na mesa iniciada por volta das 10h, no plenarinho da Câmara Municipal de São Paulo, Cristiane respondeu à pergunta que tematizou o debate: “Sim, o Estado faz acepção de pessoas!” Em sua opinião, a separação entre estado e igreja não é suficiente, na prática, para consolidar a laicidade democrática. “Há uma desigualdade intrínseca ao modelo de democracia que temos, em que alguns são mais cidadãos que outros”, afirmou, ressaltando que é explícita a tomada de decisões no governo a partir de moralidades religiosas.

Diálogo entre radicais
A liberdade de consciência, princípio do estado laico, é algo que está garantido na lei, mas não na prática, conforme diz a pesquisadora. Isso leva à reprodução da moralidade religiosa no cotidiano dos serviços públicos, por exemplo. Ainda assim, Cristiane considera temerário partir da criminalização para combater a homofobia, num país tão desigual. “Aqui, toda criminalização é sempre da pobreza, ou seja, caso a homofobia seja crime, não será o pastor da televisão que será punido, mas aquele da igrejinha de periferia, que não dispõe de acesso ao sistema judiciário”, ponderou.

A advogada Cléo Dumas, coordenadora do Ciclo de Debates, comentou que também considera mais efetiva criação de penas pedagógicas em casos de perjúrio homofóbico. Para ela, a prisão gera efeitos colaterais como mais ódio aos homossexuais por parte das pessoas envolvidas. Ela sugeriu a Lei estadual 10.948 como um exemplo de lei pedagógica que admoesta com multa alta numa primeira infração, podendo chegar ao fechamento do estabelecimento comercial em caso de reincidências.

Para Cristiane, há uma falta de espaços reais de diálogo sobre o assunto. Por isso, uma parcela grande dos religiosos ficam restritos ao acesso às informações de seus pastores, que por interesses particulares, distorcem os fatos e as argumentações para seu público. “Ainda que alguns achem utópico, considero o diálogo com estes setores um caminho possível, pois a maioria dos crentes só recebe a mensagem de que têm que ser contra os direitos LGBT para não serem presos, conforme prevê a lei em discussão”, apostou ela, ressaltando que as autoridades religiosas representam o dogma muito mais do que as vivências religiosas individuais.

Em suas entrevistas, Cristiane observou como algumas tradições pentecostais vão cercando o crente com uma vida comunitária cada vez mais fechada. “Em áreas mais pobres e periféricas, a igreja constitui um ambiente comunitário que ocupa o lugar do estado na economia local”, explica ela. Jovens religiosos que encontram parceiros para namoro e amizade em eventos da igreja, restringem seu contato cultural com os mesmos eventos e só têm contato com o mundo secular no ambiente de trabalho ou na escola.

“É por isso que a escola se constitui o lugar privilegiado para o diálogo com comunidades religiosas mais fechadas, já que na mídia a maioria dos debates se dá entre radicais”, defendeu. Para ela, é possível, também, utilizar da internet como ferramenta para esse diálogo possível e necessário.

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