sábado, 24 de agosto de 2013

Peregrinos da Jornada Mundial da Juventude buscam refúgio no Brasil


RIO DE JANEIRO, Brasil, 22 de agosto de 2013 (ACNUR) – Peregrinos de diferentes países que vieram ao Brasil para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) estão solicitando refúgio às autoridades brasileiras. Entre as razões alegadas pelos solicitantes de refúgio estão perseguições sofridas por questões religiosas ou relacionadas a conflitos armados em seus países de origem. A JMJ aconteceu entre os dias 23 e 28 de julho e reuniu cerca de 03 milhões de pessoas no Rio de Janeiro.
Segundo dados coletados pelo Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR) junto à Caritas Arquidiocesana do Rio de Janeiro (CARJ), cerca de 40 solicitações de refúgio já foram feitas por peregrinos da JMJ. A Caritas Arquidiocesana de São Paulo (CASP) também tem recebido pedidos de refúgio por parte de peregrinos que participaram da JMJ. Até agora foram cinco casos. Entre os solicitantes estão nacionais do Paquistão, Serra Leoa e República Democrática do Congo.
Assim como todos os solicitantes de refúgio que chegam ao Brasil, os peregrinos da JMJ terão seus pedidos analisados pelo Comitê Nacional para Refugiados (CONARE), que funciona no âmbito do Ministério da Justiça. Para isso, terão de se apresentar à Polícia Federal e serão entrevistados por oficiais de elegibilidade do CONARE. Como de praxe, após avaliação individual o CONARE decidirá quais casos devem ser reconhecidos como refugiados.
No Rio de Janeiro, pelo menos 12 solicitantes relataram perseguições relacionadas a questões religiosas. “Meu pai foi morto por ser cristão, e sempre disse a minha mãe que isso poderia acontecer com nossa família. Sendo também cristão, a JMJ foi a única oportunidade que tive para conseguir um visto e sair do meu país”, disse ao ACNUR o jovem Peter Atuma (*), católico de 24 anos que vivia em Serra Leoa, no oeste da África. Seu corpo tem cicatrizes de ferimentos causados por grupos religiosos hostis aos cristãos da comunidade onde vivia. 
Ele já declarou à CARJ sua intenção de solicitar refúgio e tem agendada uma entrevista com a Polícia Federal no Rio de Janeiro para formalizar seu pedido. “Onde há paz, é possível viver tranquilamente”, completa Atuma, que deixou para trás sua mãe e oito irmãos vivendo em uma comunidade no norte de Serra Leoa. “Não tenho como voltar. Quero reconstruir minha vida aqui no Brasil”, diz Atuma, que tem formação na área de contabilidade.
Outro peregrino com entrevista já agendada na Polícia Federal para solicitar refúgio é o paquistanês cristão Imran Masih (*), que vivia ao sul de Islamabad com seus pais e quatro irmãos. Por causa da sua religião, teve problemas com as autoridades do país, foi discriminado na busca por um emprego e testemunhou perseguições e violência contra outros católicos de sua comunidade.
“Quando cheguei à JMJ, vi muitos católicos expressando sua fé sem problemas e convivendo com pessoas de outras religiões em paz. Todos nós somos criaturas de Deus e não podemos ser discriminados por causa do que acreditamos”, afirma Masih, que não se sente seguro para retornar ao seu país. Interessado em filosofia e teologia, ele quer iniciar estudos no Brasil para ser ordenado padre.
Os peregrinos solicitantes de refúgio no Rio já estão sendo assistidos pela CARJ, por voluntários ligados à Igreja Católica que participaram da JMJ e por autoridades municipais. Um grupo de cinco homens solteiros que alega perseguição religiosa foi acomodado em uma casa de passagem administrada pela CARJ e está se mantendo com doações da Igreja local e de fiéis, além de alimentos comprados pela Caritas. Outros seguem hospedados por voluntários da JMJ, devendo ser transferidos para uma residência provisória cedida por uma paróquia da cidade. Os demais solicitantes que alegam perseguições devido a conflitos armados, como é o caso dos cidadãos originários da República Democrática do Congo, estão sendo acolhidos tanto por voluntários da JMJ como pela própria comunidade de refugiados congoleses que vive no Rio de Janeiro.
A assistente social Aline Thuller, uma das coordenadoras do projeto de assistência e proteção a refugiados implementado pela CARJ, com apoio do ACNUR e do governo brasileiro, explica que a assistência financeira direta só poderá ser prestada quando os pedidos de refúgio forem formalizados. “Outros apoios, como aulas regulares de português e cursos profissionalizantes, também só poderão ser dados quando os peregrinos tiverem o protocolo da Polícia Federal confirmando seu pedido de refúgio”, afirma Thuller.
Os pedidos de refúgio feitos por peregrinos que participaram da Jornada Mundial da Juventude e alegam perseguição religiosa representam, de certa forma, um novo desafio para as autoridades brasileiras. “Não temos dados específicos sobre este tema, pois muitas vezes as questões religiosas se misturam com perseguições associadas a motivos políticos. Faremos um acompanhamento detalhado destes casos, pois o pedido de refúgio devido a questões religiosas é uma questão complexa de ser decidida, afirma o Representante do ACNUR no Brasil, Andrés Ramirez.
Ramirez ressalta que a Constituição do Brasil garante a livre expressão religiosa e determina a separação entre o Estado e as religiões. “Este é um componente de proteção importante para quem sofre perseguições religiosas”, afirma Ramirez.
Entre os peregrinos entrevistados pelo site do ACNUR, alguns comparam sua saga à de santos da Igreja Católica, que sofreram perseguições por causa da sua fé. “Muitos desses santos sofreram por anunciar as boas novas de Deus. Mas permaneceram firmes em sua fé” diz Asham Daniel (*), paquistanês de 24 anos. “Outros foram humilhados por reis e pessoas poderosas, mas reconstruíram suas vidas em outros países e puderam acolher suas famílias no exílio”, disse Atuma, de Serra Leoa.
O Brasil possui cerca de 4.200 refugiados reconhecidos pelo governo federal, originários de mais de 70 nacionalidades diferentes. Em 2013, cerca de 300 novos pedidos foram aceitos pelo Comitê Nacional para Refugiados (CONARE), sendo a maioria composta por refugiados originários da Síria, Colômbia e República Democrática do Congo.
(*) Nomes trocados a pedido dos entrevistados, por questões de segurança.
Por Luiz Fernando Godinho, do Rio de Janeiro. 
Por: ACNUR

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