sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Mudança de época: as palavras que faltam aos católicos


A Igreja sabe que, para toda profecia, há um tempo oportuno, um kairós, que, se perdido, resta só o peso silencioso da penitência: esta também testemunhada pelas longas épocas escuras da sua história.

A análise é Alberto Melloni, historiador da Igreja italiano e professor da Universidade de Modena-Reggio Emilia, em artigo publicado no jornal
Corriere della Sera, 20-08-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto, aqui reproduzido via IHU.


A reviravolta histórica sobre nós é de proporções superiores ao pânico que produz. O estilo de vida mantido pelo Ocidente, em que a dívida havia substituído outros sistemas de domínio, acabou. Para sempre. Assim como o colonialismo na Índia, como o bolchevismo na Rússia. É uma krisis, no sentido do Evangelho: um "juízo". Não é o fim do mundo: é o fim de um mundo. Portanto, excita os medos, encoraja os minimizadores, revela a estatura dos soberanos, denuncia a surdez de quem deu de ombros durante anos, convoca inteligências políticas e espirituais do amanhã.

Nesse revolver da história (por enquanto incruento, como em 1929 e 1989), a Igreja é frugal no fato de dizer as palavras que possui. Estes não são os tempos de Gregório Magno, que, diante do fim de uma era, reuniu o povo na basílica para explicar o profeta Ezequiel. Não são os tempos do Papa João, que, no crescimento do fatalismo atômico, desorganizou os parâmetros doutrinais da guerra justa.

São os nossos tempos, em que a geração do bem-estar mais prepotente sente estar deixando aos seus próprios filhos os escombros de um desastre político e moral. E, nesse tempo, a Igreja, no sentido mais amplo do termo, está como que retraída: articula lentamente as desgastadas condenações dos "ismos", sussurra coisas óbvias ou interessadas, quase como se para ela também fosse pouco legível uma realidade que grita de todos os horizontes.

No Oriente Médio sunita, explode uma jihad na qual o nome de Deus não é usado para agredir, mas para suportar, sem que aqueles que criticaram justamente as suas perversões violentas saibam dar uma leitura a isso. Um assassino psicótico norueguês arrasta para fora da escuridão o fundamentalismo de antissemitas clássicos, homofóbicos agressivos, tradicionalistas paranoicos, monoculturalistas fascistas, que o direito penal e canônico ignoraram antes e depois desse crime.

A genialidade de personagens como Pacelli, Adenauer, De Gasperi e Schuman que – falando em alemão e pensando em católico – deram à Europa um horizonte político de paz, é ridicularizada há meses pelo egoísmo alemão, sem que o discurso católico saiba sair do vitimismo das raízes, da euforia dos crucifixos e da obsessão dos direitos dos gays.

A guerra na Líbia levanta protestos periódicos do papa que caem no vazio de uma Igreja mais sensível ao espiritualismo do que à realidade. E aquele pedaço da África que se afoga entre Sirte e Lampedusa extorque qualquer senso de culpa às almas cultas, mas, no fim, é tratado como uma fatalidade que não deve ser compreendida, mas sim aceita.

A força que a Igreja teve em transições de magnitude comparáveis a essa – no século VI, mas também nos séculos XI e XVI com as reformas, no século XX com o Concílio – foi a de saber ler os processos históricos em sua globalidade: encontrar aquela sua chave supremamente sintética que, a partir do ato de fé em Jesus Cristo morto e ressuscitado, sabe indicar os caminhos de um novo tempo e preparar aquilo que já está escrito nas premissas presentes. Hoje, esse ato – tornado mais urgente pelo trágico nanismo das lideranças políticas – tarda a se fazer sentir.

No entanto, só o intuito espiritual de uma comunidade global como a católica pode dizer com autoridade que, se uma Europa pouco amada se arruína, não acaba o euro, mas sim a paz. Pode explicar à luz do seu próprio tesouro de ensinamentos sobre a sobriedade e a partilha que o colapso de um estilo de vida é uma oportunidade de justiça ou a antessala do canibalismo econômico.

Mas a Igreja também sabe que, para toda profecia, há um tempo oportuno, um kairós, que, se perdido, resta só o peso silencioso da penitência: esta também testemunhada pelas longas épocas escuras da sua história.

Seria estúpido e irreverente pensar que a afasia destes meses é do papa. Certamente, Bento XVI, de certo modo, deve se fazer ouvir: nestes dias em Madri diante de milhões de jovens, especialmente em Berlim no discurso no Bundestag de setembro, em outubro na oração inter-religiosa de Assis. E aquilo que ele diz vai permanecer.

Mas é da Igreja como communio que o mundo espera uma leitura do tempo, que mostre a capacidade de romper aquela homologação aos ritos do poder e da mídia. É a communio que permite ler um tempo que deve ser contido da tendência de se tornar pré-bélico justamente por uma força espiritual que o liga, se souber ser uma força e se souber ser espiritual.

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