domingo, 13 de novembro de 2011

Medo ao risco

Ilustração: Travis Louie

A parábola dos talentos é muito conhecida entre os cristãos. Segundo o relato, antes de sair de viagem, um senhor confia a gestão dos seus bens a três empregados. A um deixa-lhe cinco talentos, a outro dois e a um terceiro um talento: «a cada qual segundo a sua capacidade». De todos, espera uma resposta digna.

Os dois primeiros poem-se de imediato a negociar com os seus talentos. Vêm-se a trabalhar com decisão, identificados com o projecto do seu senhor. Não temem correr riscos. Quando chega o senhor entregam-lhe com orgulho os frutos: conseguiram duplicar os talentos recebidos.

A reacção do terceiro empregado é estranha. O único que lhe ocorre é «esconder debaixo de terra» o talento recebido para conserva-lo seguro. Quando volta o seu senhor, justifica-se com estas palavras: «Senhor, sabia que eras exigente e colhes onde não semeais... Por isso, tive medo e fui esconder o teu talento debaixo de terra. Aqui tens o teu». O senhor condena-o como empregado «negligente».

Na realidade, a raiz do seu comportamento é mais profunda. Este empregado tem uma imagem falsa do seu senhor. Imagina-o egoísta, injusto e arbitrário. É exigente e não admite erros. Não se pode fiar. O melhor é defender-se dele.

Esta ideia mesquinha do seu senhor paralisa-o. Não se atreve a correr qualquer risco. O medo bloqueia-o. Não é livre para responder de forma criativa à responsabilidade que se lhe há confiado. O mais seguro é «conservar» o talento. Com isso basta.

Provavelmente, os cristãos das primeiras gerações captavam melhor que nós a força interpeladora da parábola. Jesus deixou nas nossas mãos o Projecto do Pai de fazer um mundo mais justo e humano. Deixou-nos como herança o mandato do amor. Confiou-nos a grande Noticia de um Deus amigo do ser humano. Como estamos a responder hoje aos seguidores de Jesus?

Quando não se vive a fé cristã desde a confiança mas desde o medo, tudo se desvirtua. A fé conserva-se mas não se contagia. A religião converte-se em dever. O evangelho é substituído pela observância. A celebração fica dominada pela preocupação ritual.

Seria um erro apresentar-nos um dia ante o Senhor com a atitude do terceiro empregado: "Aqui tens o teu. Aqui está o Teu Evangelho, aqui está o projecto do Teu reino e a Tua mensagem de amor aos que sofrem. Conservamos fielmente. Predicamos correctamente. Não serviu muito para transformar a nossa vida. Tampouco para abrir caminhos de justiça para o Teu reino. Mas aqui o tens intacto".

- José Antonio Pagola
Reproduzido via Amai-vos, com grifos nossos

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