sábado, 23 de abril de 2011

Histórias que gostaríamos de ter visto antes


O excelente blog do @delucca publicou uma bela entrevista com Matarazzo, publicitário de 36 anos e dono da Agência Gringo, sobre um curta-metragem que já deu e ainda vai dar mais o que falar por aqui.

Ao mesmo tempo em que atos de violência contra homossexuais tornam-se cotidianos, ações contra a homofobia e a discriminação contra gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transgênicos ganham força. Neste embalo, será lançado durante o mês de maio deste ano, o curta-metragem Não Gosto dos Meninos, dirigido e produzido pelo publicitário André Matarazzo e pelo produtor Gustavo Ferri.

O curta-metragem teve como principal inspiração a campanha internacional contra a homofobia "It Gets Better", que reuniu depoimentos de gays, lésbicas e apoiadores dos direitos humanos, incluindo o Presidente dos EUA, Barack Obama. Na versão brasileira, o projeto reuniu 40 pessoas que contaram suas histórias de vida, completamente distintas com um objetivo comum: mostrar que são felizes sendo gays.


William De Lucca - Muitos diretores escolhem o nome do filme depois que ele está pronto. Como surgiu o nome do filme? Como ele foi concebido?

André Matarazzo – Na verdade a gente queria um nome que não fosse muito evidente. O filme já tem uma mensagem muito evidente pra quem assiste, que é mostrar que a vida de pessoas gays é normal, super diversa, e que não é apenas o estereótipo mostrado pela mídia. Outro objetivo do filme é mostrar que, depois que você passa por um período mais complicado, de aceitação, você acaba se encaixando e sua vida fica uma delícia. Queríamos mostrar gente que tinha passado por isso e não queríamos usar nomes comuns como ‘Somos Todos Iguais’, ou coisa do tipo, já que isto estava muito claro na história. Então, resolvemos criar algo um pouquinho misterioso, que todo mundo está se perguntando: “Porra, vocês não são gays, não gostam de meninos?”. Ainda não vou revelar o que é exatamente, mas é bem interessante.

De Lucca - Como foi a seleção das personagens que compõe o curta?

Matarazzo - São quarenta pessoas entrevistadas durante o filme. Eu me interessei pelo projeto depois de ver aquele projeto americano “It Gets Better”, onde inclusive o pessoal da Produtora Pixar participou, e pensei que seria super legal fazer isso na minha empresa, que tem um ambiente super legal, todo mundo sabe que eu sou gay, meu namorado sempre vai lá. Mas, como lá só tem três ou quatro gays, achei que era pouca gente, não teria a força que tem um monte de gente, e eu queria passar uma mensagem legal pra esta geração nova que está aí e que não tem modelos. Pra que eles possam chegar e dizer ‘porra, posso ser igual a esse cara’. Daí, encontrei o Guga (Gustavo Ferri), que tem uma produtora e que já faz vários trabalhos para agências de publicidade e convidei-o para o projeto e ele topou na hora e fomos atrás de pessoas interessadas. Postei no blog da minha empresa, no facebook, que estávamos procurando gente para o filme, e muitas pessoas quiseram participar, tivemos mais de 400 interessados. Como fizemos as gravações todas em um dia, em São Paulo, alocamos uma hora pra cada um e não teríamos como dar espaço pra todo mundo, mas as pessoas ficaram muito interessadas em falar da sua vida, elas estão mais abertas e com menos medo.

De Lucca - Como você encara essa onda de ataques homofóbicos pelo Brasil? A que você atribui este aumento?

Matarazzo - Eu acho que isso é uma relação simples de visibilidade. Quanto mais natural uma coisa é, mais ameaçada fica a pessoa que é insegura sobre aquela coisa, como a sexualidade. Então quando você tem um grupo de gays sem nenhuma voz, nenhuma visibilidade e quando eles aparecem são alvos de chacota, é cabeleireiro bichinha, o costureiro da novela, tudo fica razoável, porque é um personagem cômico. Agora quando você começa a mostrar além do personagem cômico, que esse cara gay pode ser teu irmão, o cara que trabalha com você, isso intimida muito, e aí começa um movimento contrário, de expulsão. Eles pensam “caralho, esses caras estão muito mais próximos do que eu imaginei, então eu vou dar porrada nesse filho da puta e mostrar quem é quem”. Acho que é um movimento que não tem retorno, acho que quanto mais visível isto tudo é mais ameaçado se sente quem não consegue lidar com as diferenças.

De Lucca - A Campanha It Gets Better teve uma adesão muito grande nos EUA, inclusive com a participação do Presidente Obama em um vídeo. Você acredita que um projeto como esse tenha uma adesão desse tipo no Brasil?

Matarazzo - Estamos fazendo algo um pouco diferente da campanha americana, nossa mensagem mais importante é mostrar que tinham pessoas com vidas normais, que não tem medo, e que vivem uma vida ótima, por mais que falem publicamente sobre sua orientação sexual. Nosso interesse não era arrancar pessoas do armário ou que as pessoas postassem vídeos dizendo ‘eu apoio a causa’, eu não queria isso. Imagina fazer um vídeo para um garoto de 15 anos, do interior de Santa Catarina, que tem modelos sobre ‘ser gay’ péssimos e que não pode nem imaginar que pode ser gay de forma natural, e que esse garoto possa imaginar “Caralho, olha essas pessoas, eu posso ser como um deles”. Este era nosso objetivo principal. Não vamos pedir para as pessoas fazerem os vídeos delas, participarem desta forma, ainda não estamos preparados pra isso agora, pode ser uma evolução, mas agora queremos passar esta mensagem.

De Lucca – Você acredita que este filme possa ter alguma influência política?

Matarazzo - Eu adoraria, mas não sei se isso vai acontecer. Nunca foi uma pretensão nossa, não somos militantes, nunca fiz nada com a temática gay, embora seja gay, o Gustavo não é gay, então não temos como interesse primário mexer com movimento político. Nossa intenção é ajudar uma pessoa que está precisando de apoio, de modelos, que está pensando que está fodido, sozinho no mundo, ele precisa ver este filme, só. Se isso acabar resvalando, tocando a opinião pública e ajudar em alguma outra coisa seria fenomenal, mas a gente não tem isso como interesse inicial.

De Lucca – Como será o lançamento do filme? Vocês já pensaram em um esquema para distribuição do filme?

Matarazzo - Não sabemos ainda a duração do filme, ainda estamos editando, mas ele deve ter entre 10 e 15 minutos. A distribuição vai ser da forma mais democrática possível, logo que for lançado ele estará disponível na internet pra que ele seja visto pelo maior número possível de pessoas, mas também queremos levá-lo para festivais, mostras, para que o filme tenha a maior visibilidade possível e possa ajudar muita gente.

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