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Tem repercutido o fato de que finalmente o Conselho Regional de Psicologia do Paraná chamou a senhora Marisa Lobo, autointitulada "Psicóloga Cristã" nas redes sociais e defensora de terapias para "cura da homossexualidade", a prestar esclarecimentos sobre sua atuação.
Como adverte o psicólogo Alessandro Vieira dos Reis:
Como já pontuado anteriormente, vivemos hoje no Brasil um crescimento assombroso do cristianismo evangélico, em especial do neopentecostal. Nesse contexto, surge um mercado consumidor para um novo tipo de terapia alternativa, ao lado de tantas outras já existentes e igualmente não reconhecidas oficialmente por órgãos como o Conselho de Psicologia e o de Medicina: a psicoterapia cristã (cujo carro-chefe, atuamente, é a propaganda da pretensa “cura da homossexualidade”).
Como toda terapia alternativa, (...) a Psicoterapia Cristã faz um pastiche teórico-metodológico da Psicologia com alguma espiritualidade mística e/ou religiosa. Como terapia alternativa explora o efeito placebo originário da fé do paciente. Pouquíssimo ou nada se baseia em Ciência. Seu diferencial diante das outras terapias alternativas é que a fé que neste caso é religiosa, reforçada por um aparato social poderoso (uma determinada comunidade cristã), e não uma fé mística individual (...).
Por conta desse mercado crescente, deduzo que será cada vez mais comum a presença de líderes religiosos em cursos de formação em psicoterapias breves, bem como a criação de cursos especialiados para membros dessa comunidade (como os já muito comuns, nos EUA, cursos de “aconselhamento pastoral”).
E eis aí um novo agente surgindo no cenário da Psicologia Brasileira, caros psicólogos e clientes de Psicologia. Em um Brasil que cada vez mais tem como grandes líderes pastores como Silas Malafaia (que também é psicólogo, notem!), Edir Macedo e Valdomiro Santiago, cada vez mais surgirá demanda e oferta de psicólogos cristãos. Marisa Lobo não é a primeira, mas é o protótipo e modelo teórico, metodológico e prático para muitos e muitas que estão por vir.Seu texto completo pode ser lido aqui.
A respeito desse caso, reproduzimos abaixo texto do também psicólogo e amigo deste blog Flavio Alves, originalmente publicado em seu blog Ideias Canhotas.
E, caso tenha interesse, você encontra aqui a nota da ABGLT de apoio ao Conselho Regional de Psicologia do Paraná a respeito do caso.
De tempos em tempos vejo algum burburinho em torno das declarações da senhora Marisa Lobo (“Psicóloga Cristã”) nas redes sociais. Particularmente não sou de dar muita audiência para pessoas ou blogs desse tipo, mas sendo um profissional da área é inevitável não ler alguma coisa sobre o que ela anda dizendo.
Sou psicólogo, entrei na faculdade de Psicologia no ano de 2006. Logo nas primeiras semanas, no meio de um debate em sala de aula, uma professora nos disse que, a partir do momento que ingressamos na graduação, já nos submetíamos aos dispositivos do Código de Ética da profissão.
O Código de Ética Profissional do Psicólogo gerou e subsidiou inúmeras discussões ao longo do curso, algumas bem calorosas e que, obviamente, envolviam religião, sexualidade, política, profissionalismo, entre milhares de outras questões inerentes ao trabalho do psicólogo.
Ao longo de minha formação aprendi, e assim o faço até hoje, a compreender o Código como NORTE e não como uma lista de regras. O Código expressa um conjunto de valores e princípios que são fundamentais para o exercício da função e nos dá a dimensão exata da responsabilidade que cada profissional tem para com as pessoas e para com a sociedade no exercício dela.
Assim, de tudo o que eu li até hoje, afirmo sem sombra de dúvidas que Marisa Lobo, para promover suas opiniões, distorce o Código de Ética do Profissional Psicólogo, deturpa textos científicos, falta com a verdade quando fala a respeito de proposições que tramitam nas Casas Legislativas do país e das bandeiras defendidas pelos movimentos sociais, e reúne uma rede de fundamentalistas contra todos os que a questionam.
Recentemente, Marisa Lobo foi chamada ao Conselho Regional de Psicologia do Paraná para prestar esclarecimentos sobre sua atividade profissional, e após o ocorrido fez inúmeros comentários nas redes sociais, mobilizando alguns segmentos para atacar a profissão e os movimentos sociais e se colocando acima de qualquer tipo de crítica.
Para entender a situação é fundamental conhecer o que diz o Código, instrumento que deveria ser conhecido por todos, psicólogos ou não.
Vejamos o que diz o texto: o Código de Ética Profissional já em seus princípios fundamentais afirma que cada psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos. E que trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (CFP, 2005, p.7).
Ou seja, o profissional de psicologia atua na sociedade e exerce sua profissão de maneira a garantir e promover os Direitos Humanos, nos sendo vedada qualquer tipo de ação que colabore, mesmo que indiretamente para a marginalização de qualquer grupo ou pessoa.
Indo mais adiante, o CE dispõe em seu primeiro artigo:
Art. 1º – São deveres fundamentais dos psicólogos:Este dispositivo estabelece o conhecimento científico como parâmetro para a atuação do profissional psicólogo, ou seja, seu exercício está condicionado ao domínio de métodos e técnicas validados e comprovados cientificamente, e que possam ser questionados da mesma maneira, pela ciência.
c) Prestar serviços psicológicos de qualidade, em condições de trabalho dignas e apropriadas à natureza desses serviços, utilizando princípios, conhecimentos e técnicas reconhecidamente fundamentados na ciência psicológica, na ética e na legislação profissional;
Independente da fé que professa, ao exercer sua profissão, o psicólogo se pautará pela ciência, sempre! O segundo artigo determina que:
Art. 2º – Ao psicólogo é vedado:Este artigo reforça o compromisso do psicólogo com os direitos humanos, impede que psicólogos se utilizem de sua profissão e da relação que estabelecem com seus atendidos para induzi-los a compartilhar de suas convicções, além de impedir que vinculemos nosso título a qualquer outra coisa que não se relacione a profissão, ou seja, religião, política, time de futebol, gosto musical entre milhões de outras coisas.
a) Praticar ou ser conivente com quaisquer atos que caracterizem negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade ou opressão;
b) Induzir a convicções políticas, filosóficas, morais, ideológicas, religiosas, de orientação sexual ou a qualquer tipo de preconceito, quando do exercício de suas funções profissionais;
f) Prestar serviços ou vincular o título de psicólogo a serviços de atendimento psicológico cujos procedimentos, técnicas e meios não estejam regulamentados ou reconhecidos pela profissão;
Em resumo, o Código o reafirma que em todo lugar em que o profissional se apresente como psicólogo, o deve fazer com base no conhecimento científico, nos métodos e técnicas advindos da Psicologia e respeitando os Direitos Humanos.
Marisa Lobo, que se tornou conhecida por se utilizar da profissão e do título acadêmico que possui para fazer proselitismo religioso, promove reiterados ataques aos movimentos por direitos humanos (com ênfase ao LGBT), às religiões de matriz africana, aos ateus e ao sistema de Conselhos de Psicologia.
Sabedora das infrações que comete, Marisa Lobo se esforça para se passar por vítima de um Conselho dominado por militantes intolerantes, postura fica nítida na foto em que posa em frente à sede do CRP/PR de bíblia em punho, numa tentativa de tornar uma discussão sobre sua conduta profissional em um debate religioso.
Sobre o processo que corre no CRP/PR, Marisa Lobo afirma que o Conselho exige que renuncie seu deus, renegue sua fé para exercer a profissão de psicóloga, numa clara distorção da verdade, expediente bem comum em seu blog e em suas postagens nas redes sociais.
Nas declarações que deu sobre o processo, Marisa Lobo em momento nenhum se defendeu, não desmente o que é colocado, ao contrário, ataca ainda mais os homossexuais, ateus, entre outros segmentos e novamente tenta se passar por vítima. Publicou alguns trechos na internet, e em NENHUM momento há a orientação para que ela deixe de freqüentar sua igreja ou suspenda seu trabalho missionário, o que existe é a exigência de que ela separe sua atuação profissional das atividades religiosas em que está envolvida, que deixe de utilizar do título de psicóloga para defender sua fé e misture ciência com religião.
Aos psicólogos, como a qualquer outra pessoa é garantido o direito de professar a sua fé e praticar sua religião, mas isso deve ser feito nos lugares e momentos adequados e de forma alguma deve ser associada ao exercício da profissão. Ao contrário do que Marisa Lobo tenta provar, é possível ser psicólogo e ter vida religiosa sem que uma coisa anule a outra.
Logo, fica claro que Marisa Lobo distorce e deturpa qualquer informação ou texto para atender seus interesses políticos/religiosos. Submete os interesses da profissão à sua agenda religiosa, incorre em falta ética, e deve ser responsabilizada por isso.
Como disse aqui, o Código afirma em seus princípios o compromisso com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, declaração esta que garante a liberdade religiosa como direito fundamental. Serve para nortear a atuação de todos os profissionais de Psicologia, independente de sua fé religiosa, convicção política, orientação sexual, o Código se aplica a todos e nenhum profissional está acima dele.
Espero que a situação no CRP do Paraná se resolva rapidamente, que a profissão saia fortalecida e nossos princípios sejam preservados! Tweet
5 comentários:
Sinceramente, ela está querendo aparecer. Veja o que ela diz sobre escolher ser cristão: "Se nossa religião é o Cristianismo - é por escolha - quando escolhemos uma religião uma igreja e nos convertemos a ela, aceitamos sua doutrina, suas regras..." Ora! Se ela faz Psicologia - por escolha - e vai seguir a Profissão, não deve, também, aceitar suas regras? Simples assim... Quando houver mudanças no Conselho, onde Religião e Psicologia se misturem(e eu não sou contra, desde que com regras bem elaboradas, para fanáticos não se aproveitarem), aí ela faz o que, agora - e ela sabe - não pode... Abraços...
Concordamos com você que os posicionamentos dela são incoerentes, Rosinha Tricolor - como, aliás, é regra nos fundamentalismos em geral - e que de inocente ela não tem nada. Mas esse dificilmente será um caso isolado. Ao que tudo indica, ela se insere em uma tendência de imiscuir uma leitura religiosa em assuntos de Estado e ciência, onde é completamente indevida. Permaneçamos atentos...
Um beijo carinhoso.
De inocente, ela não tem nada mesmo! Com toda certeza. Talvez a ideia dela e demais - pois já houve outros casos semelhantes - seja o de forçar uma barra para a regulamentação da Profissão de Psicólogo associado à Religião/Religiosidade. Como disse, não sou contra a ideia, pois acho que os dois podem muito bem se complementar e ajudar até mais. No caso do paciente não acreditar em nada relacionado, seria tratado na forma tradicional. Só. Mas sei que, hoje em dia, é um risco. Por isso, quando houver essa regulamentação(que eu acho que um dia sairá), que seja com regras muito bem definidas, para que aproveitadores de plantão não se utilizem de mais este lado. Não dá pra negar direitos a um grupo, por conta de poucos(falando da regulamentação). Que esses - que provavelmente se aproveitarão - sejam punidos e não os que pretendem trabalhar seriamente. Por isso, mais uma vez eu digo: com regras muito bem definidas, nada contra. Só teremos a progredir, ao meu ver. Abraços...
Bom, a nossa opinião é que a psicologia como ciência deve ser separada do aconselhamento religioso, para preservar as peculiaridades dos dois campos. Mas respeitamos a sua opinião, Rosinha Tricolor! :-)
Beijos e bom fim de semana!
Equipe DC
Sobre esta parte: "...falta com a verdade quando fala a respeito de proposições que tramitam nas Casas Legislativas do país e das bandeiras defendidas pelos movimentos sociais..." Basta ler o que ela escreveu sobre o PLC122/2006, para ver que está má intencionada: "Precisamos estar ao lado e fechar questão, literalmente sobre: • Criminalização de pastores padres e líderes religiosos que não concordarem em fazer casamento de pessoas do mesmo sexo (homossexuais)." <<< Gostaria de saber ONDE está escrito que padres e pastores terão que casar homossexuais? Pensei que mentir fosse pecado... ôÔ Abraços...
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