A desembargadora aposentada e advogada especializada em direito homoafetivo, Maria Berenice Dias, acaba de assumir mais uma encruzilhada em prol das questões LGBT. Nesta quarta-feira (24), ela formalizou junto à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) o Estatuto da Diversidade Sexual, que será encaminhado ao Congresso Nacional como uma demanda popular. Outro documento produzido pela OAB foi entregue à senadora Marta Suplicy (PT-SP): trata-se da PEC (Proposta de Emenda Constitucional), que prevê a criminalização da homofobia, entre outros direitos.
Na entrevista que você confere a seguir, Maria Berenice Dias diz que está na hora de os legisladores trabalharem em torno da questão LGBT e que é inaceitável que até hoje a comunidade gay não tenha nenhuma lei para si. A advogada critica a criação do Dia do Orgulho Hétero, que para ela carece de significado, visto que heterossexuais não sofrem violência ou exclusão social.
Maria Berenice Dias comenta ainda a respeito do Estado Laico, o qual não está sendo cumprido, segundo o seu ponto de vista. Sobre essa questão, ela diz que parte dos grupos religiosos realiza "marchas homofóbicas" para criticar e retirar direitos da comunidade LGBT. "A homofobia corre solta em nome das religiões e ninguém faz nada. Eles falam em liberdade religiosa, mas na verdade atuam em detrimento de uma parcela da população", critica a advogada.
O Estatuto da Diversidade Sexual conta com o apoio de parlamentares do Congresso Nacional?
Entregamos o Estatuto para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Ordem vai submeter ao Conselho Federal e vai encaminhar como iniciativa popular ao Congresso Nacional. Paralelamente ao Estatuto, elaboramos uma Proposta de Emenda Constitucional que já foi levada para o Senado e entregue à senadora Marta Suplicy (PT-SP). Na mesma oportunidade, falamos com o Sarney (José Sarney, PMDB-AP), presidente do Senado, e também falamos com o presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS). A Frente Mista pela Diversidade Sexual está apoiando esta iniciativa.
Como foi a recepção de Marco Maia e de José Sarney?
Ambas foram muito boas. Assumiram a responsabilidade de que há uma necessidade de haver uma legislação... Nós não temos nada, nenhuma lei... Só temos a concessão de alguns direitos específicos, mas até hoje nada andou. Agora é uma coisa que amplia tudo o que já foi proposto, decidido, e que está dentro do Estatuto: criminalização da homofobia, direitos das transexuais etc.
O projeto de parceria civil está há 15 anos no Congresso e a criminalização da homofobia está perto de completar dez anos na Casa. A senhora acredita que o Estatuto vai para frente?
Duas coisas importantes: em primeiro lugar, vem da Ordem dos Advogados, isso dá peso; em segundo, tem o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), que modificou todo o panorama ao reconhecer os direitos dos homossexuais, provocando o Legislativo.
Como a senhora observa as bancadas religiosas apresentando projetos de lei que propõem o Dia do Orgulho Hétero em várias cidades e estados do Brasil?
Isso é algo sem significado. Essas escolhas e determinações de datas para certos seguimentos são feitas para seguimentos vulneráveis que são alvo de algum tipo de exclusão e também servem para elevar a autoestima. O heterossexual não precisa disso: eles não são alvos de nenhum tipo de rejeição e exclusão. Mas isso é um movimento reativo à população LGBT, é altamente preconceituoso.
Podemos dizer que, mais do que querer aprovar estas leis, eles querem reforçar uma ideologia sexista e conservadora?
Com certeza. É uma forma de referendar o preconceito.
A senhora acredita que há um avanço de um suposto "Estado Evangélico" em detrimento do Estado Laico?
Pois é... Esses avanços a gente enxerga que acontece um pouco, mas acaba não superando toda essa laicidade existente. As próprias marchas (religiosas) não têm significado, eles fazem marcha para louvar a Deus e não para propagar o amor. São marchas para retirar o direito da população LGBT. São marchas homofóbicas. Mas o pior é que não há nenhuma reação... A homofobia corre solta em nome das religiões e ninguém faz nada. Eles falam em liberdade religiosa, mas na verdade atuam em detrimento de uma parcela da população.
Eles adoram falar "respeitamos o pecador, mas não aceitamos o pecado"...
Mas não existe pecado sem pecador.
As bancadas religiosas são constitucionais?
Elas não existem enquanto bancadas. Não existe uma Frente Popular Evangélica. Eles se unem, são articulados, têm dinheiro, dominam um grande espaço nos meios de comunicação. Há um avanço do fundamentalismo religioso no mundo. Isso é um retrocesso, é uma afronta à Constituição, assim como é uma afronta à Constituição ter crucifixo nos tribunais, nas câmaras. O crucifixo faz propaganda de um crime hediondo, que é a morte por crucificação. Os símbolos religiosos têm de ser retirados em nome do Estado Laico.
Fonte: A Capa Tweet
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