quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

A experiência de Deus



Neste belo artigo, publicado originalmente no site do Centro Cultural de Brasília, Manuel Eduardo Iglesias S.J. reflete sobre a importância da experiência de Deus, do afeto e da vivência da fé para que nossa religiosidade não se reduza a uma racionalidade vazia. Vale a leitura e a reflexão proposta ao final pelo autor.


Vivemos uma mudança de paradigmas na nossa cultura ocidental. É o caso da redescoberta da importância da experiência e do afeto na vida espiritual. David G. Benner é um leigo americano, pai de família, psicólogo, diretor espiritual e orientador de retiros. No seu livro Entrega total ao amor ele relata a sua experiência pessoal de Deus e a de muitas pessoas por ele acompanhadas. Já no capítulo primeiro confessa que, como tantos outros católicos, ele viveu durante muitos anos com uma fé apenas racional, e experimentou como tudo muda quando se passa a ter uma experiência pessoal e direta de Deus. Admira-se do fato de ter vivido tantos anos aceitando idéias sobre Deus sem ter experiência dele. Ser amados por Deus é o cerne da nossa identidade cristã. Cita esta afirmação de Jung: Eu não creio em Deus, eu conheço Deus. No epílogo, enfatiza que a espiritualidade cristã não é um conjunto de crenças, nem uma lista de deveres e mandamentos; não é um programa de auto-ajuda; é uma caminhada para a união com Deus. Antes de tudo, é uma relação!

A predição do teólogo Karl Rahner está se confirmando cada dia mais, a começar pela Europa: O cristão do futuro ou será um místico ou não será cristão. Após séculos de domínio solitário da teologia acadêmica passamos a re-valorizar também a via da experiência e do silêncio meditativo na nossa relação com Deus.*
Entendo por experiência uma modalidade de conhecimento que não se alcança por puro raciocínio. É uma percepção simples, imediata e intuitiva que atinge a pessoa toda, mente, sensibilidade e corpo, e que repercute sobre todo o ser. É conhecida a distinção que se pode fazer entre uma experiência religiosa do sagrado e uma experiência de Deus como Sentido radical. O que caracteriza a experiência de Deus é que nela a pessoa experimenta uma Presença que envolve a vida dentro do Sentido radical. O Sentido radical, como presença onipresente, é rigorosamente transcendente. A experiência cristã de Deus é a presença do Sentido radical revelado na existência histórica de Jesus de Nazaré. Uma experiência de fé, um encontro pessoal.

Vez por outra nos encontramos na prática pastoral com a difícil harmonia entre Religião e Fé. Religião como um conjunto de doutrinas, normas e ritos está a serviço do fundamental: a experiência de fé. Infelizmente, nem sempre acontece assim. A fé pode se apagar e a religiosidade manter uma fachada vazia.

A Igreja vive hoje o desafio da evangelização no nosso tempo. Como construir o Reino sobre o único alicerce que é Jesus Cristo? Como apresentar o rosto de Jesus às novas gerações? Como se manter fiéis ao essencial da nossa fé e abertos ao novo? O Documento de Aparecida é bem consciente dos desafios atuais e nos incentiva a uma caminhada em comunhão criativa e esperançosa. No hoje do nosso continente latino-americano, levanta-se a mesma pergunta cheia de expectativa: “Mestre, onde vives?” (Jo 1,38), onde te encontramos de maneira adequada para pra abrir um autêntico processo de conversão, comunhão e solidariedade? Quais são os lugares, as pessoas, os dons que nos falam de ti, que nos colocam em comunhão contigo e nos permitem ser discípulos e missionários teus?


Manuel Eduardo Iglesias S.J.
Artigo publicado originalmente no site do Centro Cultural de Brasília em 11/03/2010
*Grifo nosso.

* * *

Para refletir:

Como Deus se deixa sentir na sua vida?

Texto para meditar: Sl 139 (Tua mão me guia e me segura)

Um comentário:

Anônimo disse...

EXCELENTE!

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