Foto: Jackie Rueda
"(...) Importa no novo ano deixar para trás o que passou e procurar renovar o olhar, a atitude, o pensamento, o agir. Trata-se de mais do que simplesmente uma lista de resoluções sobre perder peso e fazer ginástica. Trata-se de uma renovação profunda e totalizante.
Para que o ano seja novo, há que estar disposto a renovar aquilo que há de mais profundo em nós e que nos faz mais humanos. Por exemplo, parar de continuar a nos autocompreender a partir de nós mesmos e defendendo desordenadamente, com unhas e dentes, um espaço "próprio". É preciso que nosso “lugar” de autocompreensão não seja nós mesmos, mas o outro ou a outra. Um dos baluartes da autocompreensão do ser humano é sua capacidade de êxodo de si mesmo, de êxtase, de saída da mesmice do olhar para si próprio e olhar para a alteridade e a diferença daquele ou daquela que tem frente a si.
E assim fazendo, seu destino não é perder 'seu' lugar para andar errante pela terra, sem ter para onde ir. É descobrir para si nova situação, novo lugar, outra terra, outra pátria, outra paisagem. Para que o ano seja novo, é necessário permitirmos que a solicitude, o amor e a generosidade nos arranquem de nós mesmos para situar-nos no outro, em seu lugar, suas preocupações, seus amores, suas dores, suas penas e glórias e fazer assim possível a descoberta e a vivência de uma nova comunhão.
Na antropologia se reproduzirá então o êxodo do Verbo, o qual, sendo de condição divina, não se aferrou à prerrogativa de ser igual a Deus, mas se fez homem, humilde, servo, obediente, até a morte de cruz (Fil 2,5-11). Reproduz-se, também, o êxodo do próprio Espírito, enviado constantemente pelo Pai e pelo Filho, 'outro' Paráclito que tem a missão de 'recordar' e 'rememorar' as palavras ditas por Jesus de Nazaré e conduzir seus ouvintes a toda a verdade (cf. Jo 16,13; 14,26; 15,26). Assim, à semelhança do êxodo e da 'saída' constante e contínua do próprio Deus de si mesmo, contemplando e experimentando o próprio Filho e o Espírito que saem da inefabilidade da comunhão intra-trinitária em direção ao mundo e à humanidade, o ser humano passará a ser e autocompreender-se como um peregrino, não possuindo aqui lugar onde repousar a cabeça, se encontrando em si mesmo, mas apenas fora de si mesmo, no outro, nos outros. (...)
Eu me situo no outro. Sou, sim, responsável por meu irmão. Respondo por ele, falo em nome dele ou dela quando a palavra lhes seja cassada; ajo em nome dele ou dela quando estiverem de mãos atadas; corro em seu auxílio quando estiverem necessitados. Assim, Aquele que renova todas as coisas será novo também em nós, pois através de nós estará levando a termo o parto da Nova Criação, feita de justiça e de amor."
Fazendo nossas estas belas palavras, desejamos a todos um Ano Novo feliz, e que cada vez mais nos façamos responsáveis pela nossa própria renovação.
Equipe Diversidade Católica
Maria Clara Bingemer é professora do Departamento de Teologia e Decana do Centro de Teologia e Ciencias Humanas da PUC-Rio.
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Maria Clara Bingemer é professora do Departamento de Teologia e Decana do Centro de Teologia e Ciencias Humanas da PUC-Rio.
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