Foto: Graham Blackall
A vida nos apresenta diferentes faces da realidade em uma sequência sempre imprevisível. Pegar um ônibus ou decidir mudar para um apartamento novo podem ser acontecimentos triviais de significados esquecíveis, ou podem se tornar marcos na nossa vida por causa das consequências que trazem. O elemento aleatório e inconsciente da vida está além do nosso controle. Se personificarmos essa aleatoriedade - ou mesmo karma - como Deus ou o diabo, porque as consequências nos parecem, no momento que ocorrem, boas ou más, podemos desfrutar do alívio de curta duração de uma explicação imediata para o que está acontecendo. Mas perdemos o sentido e, portanto, toda a verdade que nos liberta da ilusão.
Jesus foi levado para o deserto durante quarenta dias e tentado - testado - por aqueles que são, claramente, os avanços poderosos do ego. Auto-suficiência, orgulho e poder são as vozes sedutoras, a qualquer momento, mas especialmente quando estamos no deserto. Este é um local de exposição e vulnerabilidade, onde as nossas familiares ego-identidades estão suspensas e enfrentamos o egoísmo bruto e indisfarçável da sobrevivência e auto-promoção. O ego desnudo, nosso próprio egoísmo, é repugnante à mente consciente. Então, o disfarçamos, o negamos ou recusamos a aceitar a responsabilidade por ele, demonizando-o como uma força fora de nós.
De acordo com as histórias do Evangelho, Jesus enfrentou com firmeza o seu próprio ego, viu para além dele e reconheceu a sua voz como ilusória. Uma vez que tenhamos visto através da nossas ilusões auto-geradas, nos libertamos. Mesmo se elas voltarem para nos testar, estamos mais fortes para identificá-las e resistir. Cada teste nos torna mais real. Após o teste, podemos relaxar por um tempo e, pelas circunstâncias naturais e normais de nossa vida, sentimos um poder que nos toca, que renova e consola. "Então o diabo o deixou, e anjos apareceram e cuidaram dele."
Oração, a terceira grande práxis da vida cristã, é um deserto. Seu trabalho envolve encarar as ilusões e se tornar real.
- Laurence Freeman, OSB
Tradução: Leonardo Winck Corrêa
Publicado originalmente no site da Comunidade Mundial de Meditação Cristã no Brasil. Tweet
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