Foto: Kenji Aoki
O post de ontem levantou nos seus comentários argumentos muito pertinentes quanto a envolver-nos ou não em discussões sobre as diferentes interpretações de trechos das Escrituras que costumam ser usados contra os gays (como se o texto sagrado, sagrado justamente por ser portador da mensagem de amor de Deus por nós, pudesse ou devesse ser usado contra quem quer que seja. Triste, mas enfim).
O Rev. Marcio Retamero, por exemplo, observou que se interessa "mais pelas pessoas excluídas que ouvirão/lerão o debate do que com o fundamentalista arraigado nas suas fósseis opiniões". Um ponto crucial, sem dúvida, sobretudo para quem desenvolve um trabalho pastoral junto ao público gay.
O curioso é que cheguei ao artigo da Rev. Candace Chellew-Hodge justamente através de outro artigo, publicado no site da revista Religion Dispatches, em que Jay Michaelson, fundador do Nehirim (revista de cultura e espiritualidade judaicas LGBT) e doutorando em Pensamento Judaico na Hebrew University, e a própria Rev. Chellew-Hodge dialogam a respeito do tema.
Michaelson defende uma estratégia não de tentar "vencer" na discussão sobre os versículos mais comumente "usados contra" os gays, mas de apenas buscar o "empate"; isto é, adotando a mesma lógica de uma leitura literal do texto bíblico, mostrar que o significado das palavras no texto original não era exatamente o que costuma ser interpretado pelos "fundamentalistas" de hoje. Desse modo, ficaríamos diante de duas interpretações igualmente coerentes desses versículos - daí o empate. A vitória, argumenta ele, viria a partir do momento em que, para "desempatar", ou seja, para solucionar a ambiguidade e escolher uma das duas interpretações, seria preciso recorrer ao contexto mais amplo e à mensagem geral da Sagrada Escritura: o amor incondicional de Deus, sua infinita misericórdia e compaixão. Nesse caso, como optar pela leitura que defende que pessoas sejam penalizadas por um traço involuntário? "Assim", entende ele, "entre duas leituras igualmente válidas, aquela que mantém nossos valores fundamentais de amor, companheirismo, justiça, honestidade e dignidade humana vence."
Para ele, não há nada de errado em ser literalista. Pelo contrário: a seu ver, a partir do momento em que se admite que é possível fazer uma leitura literal distinta daquela dos fundamentalistas e tão em voga hoje em dia, "aí podemos conversar sobre o mais importante: como a graça de Deus opera nas vidas dos gays, como o amor entre gays é um caminho para a santidade, e dar nosso testemunho da verdade contida na experiência gay: a diversidade sexual existe. E podemos falar a partir da nossa própria experiência e testemunho".
A Rev. Chellew-Hodge responde que sua experiência pessoal, depois de muitos anos aproveitando toda oportunidade para engajar-se nesse tipo de discussão, é que o "empate" esperado por Michaelson é inatingível porque "quem desaprova a homossexualidade, por mais compaixão que possa sentir pelos gays (...), e aqueles que mais se apegam à certeza de sua interpretação das Escrituras não têm o menor interesse em admitir qualquer 'falta de clareza' nos versículos usados contra os gays. Não existe um ponto de partida comum a partir do qual construir tal redefinição".
"Discutir sobre as Escrituras (...)", diz ela, "só frustra os envolvidos no debate e continua a obscurecer a verdadeira questão de que a Bíblia nos convida a preferir a graça ao julgamento, a aceitação à rejeição e o amor ao ódio. Por isso deixei de discutir sobre as Escrituras" [grifo nosso].
E ela conclui:
"Isso não significa que eu não esteja aberta ao diálogo sobre a Bíblia (...). Se encontro alguém que esteja honestamente em busca do que as Escrituras podem ou não ter a dizer sobre a questão da homossexualidade, e se ambos estivermos dispostos a ser abertos e honestos quanto às nossas leituras do texto, se nos dispusermos a expor um ao outro nossas fragilidades na conversa, aí estou totalmente disposta a conversar. Contudo, recuso-me a discutir. Não vou jogar para ver quem ganha.
"Em suma, uma vez que estejam claras para você as questões da Bíblia e da homossexualidade, você nunca mais terá necessidade de discutir sobre esses versículos outra vez. Por quê? Porque você não precisa se justificar perante nenhum ser humano. Não é a aprovação de uma pessoa que você busca, mas a de Deus. Uma vez que você sinta que se entendeu com Ele, que sua orientação sexual é um dom de Deus a ser usado a serviço da Sua glória, todas as discussões perdem o sentido. Sua fé se torna inabalável, e nenhum inimigo a vencerá."
E você? O que você acha? :-) Tweet
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