sábado, 8 de fevereiro de 2014

Coisa de bicha

Quando você aprende que existem "coisas de homem" e "coisas de mulher", e passa a ter a sua liberdade de desejo e escolha tolhida e condicionada por esses padrões, você está sendo esmagado pela misoginia e pela homofobia, meu amigo, e nem sabe. Mesmo que você não seja mulher. Mesmo que você não seja gay.

Como assinalou o jornalista Leonardo Sakamoto aqui, "Já atravessamos uma revolução sexual. Podemos fazer sexo de forma mais livre e com menos culpa que antes. Mas expressar nossos sentimentos é algo longe de acontecer livremente. (...) O homem é programado, desde pequeno, para que seja agressivo. Raramente a ele é dado o direito que considere normal oferecer carinho e afeto para outro amigo em público. Manifestar seus sentimentos é coisa de mina. Ou, pior, é coisa de bicha. De quem está fora do seu papel."

Trata-se de uma mudança de mentalidade, transformação sempre lenta e penosa. Tem quem não entenda a importância de defender os direitos das minorias - sejam os LGBTs, os negros, as mulheres, os deficientes ou qualquer outra. Inclusive os pobres, minorias políticas que têm seus direitos e sua voz cassados cotidianamente. Mas a violência que atinge um atinge todos. Se falta para uns a boa lei (aquela que define limites e deveres, a fim de estabelecer e assegurar os direitos), ela falta para todos.

Meu amigo Léo Rossetti cita este exemplo aqui, e comenta:

"A homofobia mata! E mata mesmo. Mata adultos e mata crianças. A homofobia mata nas ruas, mata a pontapés, mata com lâmpadas fluorescentes, mata com espancamentos, mata com decapitações, mata com requintes de crueldade... mas mata também crianças, crianças que não suportam o peso do preconceito e se juntam aos milhares de jovens e adultos que, sem conseguir fôlego pra viver, buscam na morte um alívio para seus dramas diários. Veja o caso desse menino de 11 anos que está entubado por tentar suicídio! O motivo? Gostar de um desenho que, na escola, era considerado um desenho de menina. A matéria em inglês (aqui) tem uma foto dele no leito do hospital. Nó na garganta"...

(A propósito, leia aqui sobre o projeto "Arte por Michael", de pessoas que se mobilizaram mandando desenhos e ilustrações de apoio ao garoto, como a que ilustra este post.)

A refletir.

Com amor,

Cris

PS (1): Caso queira se aprofundar no tema, sugiro também "O preço da masculinidade", da psicanalista Diana Corso (aqui) e "A homoafetividade dos heterossexuais", aqui.

PS (2): Claro, quando a gente luta por leis que assegurem nossos direitos políticos e protejam nossa cidadania, não podemos esquecer que mudança nenhuma acontece na base da canetada. Legislar, por si só, não muda os conceitos e preconceitos vigentes na sociedade. Mas a questão é o tanto de debate implicado no processo. Para uma lei chegar a ser aprovada, houve muito diálogo e muita negociação entre forças antagônicas antes, até se chegar a algum consenso sob a forma de lei. E, uma vez aprovada, a lei fomenta uma nova etapa de debate e diálogo para sua implementação. Ou seja: a lei é uma peça do processo mais amplo de transformação. 

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