quinta-feira, 21 de julho de 2011

Espírito de coletividade

Reverse grafitti: Dutch Ink

Não sou particularmente fã da Martha Medeiros (muito pelo contrário, rs), mas achei que, em tempos de tanta amargura em relação ao poder público e tanta falta de cidadania - tanto em termos da falta de respeito ao cidadão por parte do Estado quanto em termos da pouca responsabilidade dos cidadãos perante a coisa pública - valia a pena propor a reflexão: para além de país, lei, direitos, deveres, o que cada um de nós faz pela coletividade? Pela comunidade? E, no fim das contas, não só por "mim", mas também pelo "outro"?

Com carinho,

Cris


Recebi um texto sem autoria, e só tive como comprovar sua autenticidade através do google, que ora avaliza os fatos, ora nos faz de bobos. Mas, ao ler seu conteúdo, tive forte impressão de que é verdade.

O fato: um grupo de 200 aposentados japoneses, engenheiros em sua maioria, está se oferecendo para substituir trabalhadores mais jovens no perigoso trabalho de manutenção da usina nuclear de Fukushima, que foi seriamente afetada pelo terremoto de quatro meses atrás. Os reparos envolvem altos níveis de radioatividade cancerígena, como se sabe.

Em entrevista à BBC, o voluntário Yaseturu Yamada, de 72 anos, diz que tem procurado convencer o governo sobre as vantagens de se aceitar a mão de obra da terceira idade. Conclui ele: “Em média, devo viver mais uns 15 anos. Já um câncer vindo da radiação levaria de 20 a 30 anos para se manifestar. Logo, nós que somos mais velhos temos menos risco de desenvolver a doença.”

Ou seja: cidadãos que estão na faixa entre 60 e 70 anos, muitos deles inativos, querem dar sua última contribuição à sociedade e, ao mesmo tempo, liberar os jovens de um trabalho que lhes subtrairia muitos anos produtivos de vida, enquanto que, para homens de idade mais avançada, não haveria diferença significativa.

Essa é uma notícia que deve fazer refletir a todos nós. Não se trata apenas de generosidade, mas de consciência. Os idosos japoneses não estão sendo bonzinhos, e sim exercendo o sentido de responsabilidade, que a eles é muito comum. Estão pensando na sociedade como algo que só funciona em conjunto, e não individualmente.

Acredito que quando a gente faz o bem para si mesmo, com ética e respeito à lei, sem ônus para nossos pares, está fazendo também o bem para todos, mas não basta: é preciso ir além, desconectar-se das vantagens pessoais para pensar no futuro, no que temos para doar em benefício daqueles que têm mais a perder.

Um jovem de 18 anos pode contrair câncer aos 38 se trabalhar numa usina nucelar acidentada. A sociedade japonesa perde se abrir mão da força de trabalho de cidadãos de 38 anos. A família japonesa também. É essa visão macroscópica da funcionalidade que faz evoluir um país.

Dizem que a gente fica com o coração mole à medida que o tempo passa. Não é por causa de coração mole que esses aposentados japoneses estão se candidatando a um trabalho insalubre. É porque estão acostumados a transformar intempéries em oportunidades, tanto pessoais quanto coletivas, sem distinção. Coração mole tenho eu que me emociono ao ver como seria fácil ser grande, se tivéssemos a grandeza necessária.

- Martha Medeiros
Publicado originalmente no Jornal Zero Hora em 20/07/11 e reproduzido via Conteúdo Livre

Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...