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domingo, 26 de junho de 2011

"Não é preciso ser diferente para ser gay"

Foto: LUMAS

Reproduzimos a seguir artigo publicado hoje na Folha de S. Paulo, reproduzido aqui via Conteúdo Livre. E você, o que acha?

Os homossexuais podem se tornar invisíveis. É só saberem dissimular ou mentir. Quando a primeira Parada Gay de São Paulo surgiu, um de seus objetivos era, justamente, dar visibilidade à parcela da comunidade LGBT que queria afirmar sua existência e entabular um diálogo com a sociedade.

O viés era político. O slogan da parada, "Somos muitos e estamos em todas as profissões", equivalia a uma apresentação. Os manifestantes queriam mostrar quem eram e o que faziam. Reclamavam participação no processo jurídico-social e pediam proteção contra o preconceito e a discriminação. Eram 2.000 pessoas, e o ano era 1997.

Desde sua primeira edição, no entanto, o aspecto político do evento foi cedendo espaço ao carnavalesco. A Parada Gay de São Paulo transformou-se em uma grande festa. A maior de seu gênero no mundo. Atrai número de pessoas equivalente à população do Uruguai.
Movimenta centenas de milhões de reais. A expectativa é de que traga mais de 400 mil turistas à cidade.

Explica-se o fenômeno da carnavalização da Parada com o argumento de que os gays são "divertidos". A utilização desse estereótipo, contudo, contribui para mascarar a irresponsabilidade cívica e a alienação política de parte da comunidade LGBT.
Carnavalizar é fácil e agradável, mas é contraproducente.

O estilo exagerado que alguns participantes preferem adotar é legítimo e respeitável. Mas presta um desserviço para o avanço dos direitos à igualdade. O caráter festivo e a irreverência tiveram valor simbólico em um tempo em que a rejeição social contra a homossexualidade era incontornável. Acontece que as coisas mudaram.

Os milhões de pessoas que comparecerão ao evento na avenida Paulista deveriam ter presente a responsabilidade cívica de conquistar corações e mentes para a sua causa. O aspecto político da Parada exige certa sobriedade, ao menos em respeito às vítimas cotidianas da homofobia, no Brasil e no mundo. Hoje, o peso do discurso político tem de ser maior que a vontade de dançar.

A aceitação da homossexualidade pela opinião pública está vinculada à convivência com pessoas abertamente gays. Mostrar-se é importante. Nessa batalha, é mais estratégico exibir a semelhança. É mais difícil para o mundo identificar-se com o ultrajante.

Não se trata de exibir a orientação sexual, mas de garantir o direito pleno à liberdade de exercê-la. Associar o conceito da homossexualidade à transgressão e ao excesso pode ter valor estético, mas tem efeito negativo sobre o ritmo do processo político.

Para gente que cresceu com uma escala de valores antagônica aos direitos humanos dos LGBT, o comportamento escandaloso exibido tradicionalmente nas paradas equivale à retórica raivosa de um Jair Bolsonaro. O papel da Parada é mostrar que os homossexuais são serem humanos comuns, que têm direito a proteção e respeito, como qualquer outro cidadão.

Ninguém precisa ser diferente para ser gay. Não é necessário transformar-se na caricatura de si mesmo.

- Alexandre Vidal Porto, mestre em direito pela Universidade Harvard (EUA), é diplomata de carreira e escritor.

Um comentário:

  1. Recebemos em nosso perfil do Facebook um comentário muito pertinente a respeito desse texto, cuja reprodução aqui (autorizada pelo autor) nos pareceu oportuna:

    Alexandre,
    Li e fiquei chocado com suas imposições sobre o que é "ser político", no seu texto sobre a Parada LGBT, que saiu na Folha. Acho seu texto reacionário, burguês e típico de uma esquerda mofada, que dá mais valor à uma "passeata" ( termo típico da esquerda) e não compreende que uma festa também pode ser muito, muito política. Aliás, político é tudo! A Luta Homossexual ( e sou um militante histórico, desde o Grupo Somos, em 1977/78) nunca foi apenas uma luta por Direitos legais, mas vai muito além, muito. E , para isso, sempre contou com a transgressão. Seu conceito retrógrado no uso que faz do termo "caricatural" parte do pressuposto impositivo de que isso não seria relativo. Ora, o que é "caricatural" para você pode não ser para mim, nem para outros e outras... Impor normas de conduta, vestiário e etc. é fascismo puro! Eu, por exemplo, posso achar muito mais "caricatural" um sujeito de terno e gravata, vide a letra da canção de João Bosco e Aldir Blanc ; "FANTASIA"; ainda dos anos '70 e muito mais inovadora, provocadora e revolucionária do que você, Alexandre Vidal Porto, consegue ser em 2011, 40 anos depois...
    "Desserviço" é justamente o que fizeram inúmeros diplomatas deste país , desde a ditadura militar, sempre coniventes e convenientes com o Poder e pagos em seus altíssimos salários com o dinheiro público, inclusive o meu. Seu texto parece escrito por alguém que ainda está em cima do Muro de Berlin. Não há nada mais político que a transgressão! Não luto por ser "igual", como você fala em seu impositivo e reacionário texto, mas por ser diferente e exigir o RESPEITO nessa diferença. E a Luta LGBT sempre foi transgressora, não partidarista ou conivente. Não busco assimilação! "Se esta revolução não me fizer dançar, ela não é a minha revolução" Ema Goldmann
    tristemente,
    RICARDO ROCHA AGUIEIRAS
    FANTASIA (JOÃO BOSCO / ALDIR BLANC)

    Olhando na quarta-feira as ruas vazias
    Com os garis dando um jeito em nossa moral
    Custei a compreender que fantasia
    É um troço que o cara tira no carnaval
    E usa nos outros dias por toda a vida
    Dizendo: "Olá! Como vai?" e coisas assim
    O nó da gravata apertando o pescoço
    Olhando o fundo do poço e rindo de mim
    Ria, rasguei a fantasia, ria
    Queimei a garantia, ria
    Tô solto por aí
    Doido, eu danço de Pierrot, triste
    Morrendo em meu amor, ria
    Vendo você morrer de rir

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Equipe Diversidade Católica